João
João olha para o céu. Se ele bem se lembra de suas lições, a posição do sol indica que já deve ser o começo da tarde.
- Vamos parar e comer algo – ele sugere.
- Tudo bem – Dom Eduardo concede. Ele se senta, apoiando-se no tronco de uma árvore. – Por que você não procura algumas frutas?
- Não – João diz. – Você precisa de energia. Eu vou pescar.
- Você é muito teimoso mesmo – diz o cavaleiro, com um pequeno sorriso. – Você não tem vara de pescar. Como é que você pretende pescar alguma coisa?
- Eu só preciso da minha espada – diz João.
Não será a primeira vez que o Príncipe pescará com a sua espada. Ele costuma pescar peixes no Rio do Ouro, que corre próximo ao Punho, apenas com sua espada, para treinar sua velocidade e reflexos. A Espada do Renascer, apesar de resistente e muito afiada, é bastante leve, o que permite movimentos muito rápidos.
João vai até o Rio Vermelho, olhando por cima de seu ombro para Dom Eduardo. Ele nota que o cavaleiro fechou os olhos. Ele só está dormindo, o Príncipe pensa. Ele só está cansado. É só isso.
A pesca prova-se produtiva. João consegue pegar cinco peixes grandes. Ele volta satisfeito ao lugar onde havia deixado Dom Eduardo e o encontra ainda de olhos fechados. João sente um frio na barriga ao imaginar o pior, mas logo percebe que o cavaleiro ainda respira, embora devagar e de forma irregular.
Ele o acorda.
- Conseguiu algo? – Dom Eduardo pergunta, sua voz fraca e baixa.
- Sim – João diz, mostrando o resultado de sua pescaria.
Os dois comem os peixes ainda crus. Fazer uma fogueira seria muito arriscado. Apesar de Dom Eduardo não comer muito, ele ao menos come algo. João decide que isso deve ser um bom sinal.
- Você quer descansar mais? – João pergunta.
- Não – Dom Eduardo diz. – Nós não temos tempo a perder. Temos que continuar.
Os dois continuam a sua caminhada pela tarde, mas Dom Eduardo anda mais devagar a cada hora. Além de sua pele pálida, ele agora tem machas escuras embaixo dos olhos, bem na região de sua cicatriz, e seus olhos parecem perdidos. Ele continua suando abundantemente, embora João note que ele tem calafrios. Seu corpo treme de forma violenta às vezes, como se sofresse espasmos, e ele para frequentemente para recuperar o fôlego.
João começa a ficar preocupado. Ele sente seus olhos lacrimejarem, mas segura o choro. Ele é o sucessor trono, e um soldado além disso; soldados não choram. Mas é difícil. O desespero que João sente é avassalador.
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Das Cinzas da Era Perdida
FantasyUma traição põe fim à Guerra dos Dois Irmãos e arrasta o Império para um novo conflito. Novas alianças se formam na luta pelo poder, enquanto outros lutam pela sobrevivência em meio ao caos.