54. O Velho

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DOMINIQUE

Ernesto Gomes foi o meu mentor durante três anos, ainda na juventude. Eu o conheci quando tinha 13 anos, na escola de Karatê para crianças. Ele era um bom professor, por mais que ninguém desse tanta bola assim por ele ser velho e, na época, novo na cidade. Cheguei à sua escola como um garoto idiota que queria conquistar o mundo. Naquela época eu já sabia que caminho seguir, e sabia que devia me preparar, fazia quase dois anos que minha mãe havia saído de casa e tudo que eu sentia era raiva.

Por dois anos, eu treinei e aprendi essa arte marcial com ele; mas eu era diferente dos outros alunos. Todos ali queriam aprender a luta por motivos banais, mas eu não, eu tinha um foco, e por isso eu treinava mais do que os outros, e por isso, dois anos depois, eu já era o ajudante do professor na escola.

Ernesto era um bom homem, mas irritável, perdi a conta de quantas esbofeteadas levei na nuca. "Faça as coisas direito, garoto". O velho sempre dizia, "Garoto estúpido, você não está ouvindo o velho falar?". Ainda assim, eu o respeitava, pois mesmo sentado naquela cadeira, preguiçoso, tomando aqueles chás estranhos que só ele gostava, Ernesto era a pessoa mais sábia que eu já conheci. E, é claro, eu não descobri isso nos tempos de escola.

Nos tempos da escola, o velho era preguiçoso, não parecia se importar muito com o trabalho, eu era seu escravo lá dentro, os outros também. Aprendia quem realmente queria, quem se dedicava, porque, fora isso, estavam perdendo o tempo. Ele não queria ensinar ninguém.

Foi por isso que eu me surpreendi quando um dia antes do fim da sua estadia ali, quando eu estava o ajudando a fechar a escola, ele virou para mim e perguntou:

— Você fuma, garoto?

— Não, senhor.

— Bebe?

Balancei a cabeça.

— E o que faz com o tempo livre?

— Eu estudo e treino, senhor.

— Para que?

O silêncio tomou conta do ambiente.

— Quero que venha morar comigo. — ele soltou.

— O que, senhor?

— Quero que venha morar comigo. — ele repetiu simples.

— Eu tenho pai, senhor.

Levei uma esbofeteada.

Naquele instante eu nunca imaginei que viria a aceitar aquele pedido. A verdade é que depois daquilo ele explicou que conhecia o meu propósito e que precisava me ensinar, precisava me treinar, e de alguma forma louca, ele convenceu meu pai disso.

Não gostei da ideia no começo, até que ele disse: em três anos você saberá o karatê por completo, bem como outras 5 artes. Quando perguntei por que ele queria fazer aquilo, recebi uma esbofeteada na nuca. Ele realmente gostava de me bater.

— Estou te oferecendo algo bom e de graça, garoto idiota. Aceite.

E eu fui, simplesmente fui. Era o tempo ideal de preparação. Eu voltaria aos 18, quando já teria idade para ingressar no curso de formação e treino para guarda real. Eu me mudei para Dorotéia, cidade que ficava a alguns quilômetros de Santa Rosa, e lá morei em uma espécie se sítio com Ernesto Gomes por três anos, recebendo sua mentoria.

Eu poderia chamar o que aconteceu de imersão, eu fui até lá como um garoto fraco e idiota e voltei como um homem formado. As tantas artes que ele falava não se tratavam só de luta, aprendi ciências, música, literatura, tecnologia, lógica, entre muitas outras coisas. Quando eu perguntava porque estava aprendendo algo desnecessário, ele apenas dizia.

Flor De Um Reinado: Convertei-vosOnde histórias criam vida. Descubra agora