Capítulo 31: Qual é o nome dela?

459 103 29
                                    

Eu tentei conhecer cada canto daquele navio, caminhando e conhecendo alguns seres que serviam a Hunter, enquanto tentava descobrir se havia algo do meu interesse em cada cômodo que eu passava, assim como possíveis saídas do navio. Mesmo sendo um navio, aquele lugar era maior do que aparentava ser, porque Hunter usava magia para criar salas e qualquer coisa nova que precisasse, sem trocar seu navio.

Imaginava que ele provavelmente tinha uma sala do tesouro ali, com as coisas mais valiosas pra ele. Mas se tinha, a única pessoa capaz de descobrir era Sebastian em sua forma de serpente, que poderia entrar em qualquer espaço pequeno. Queria conversar com ele, mas também não queria sobrecarregá-lo com milhares de coisas. Também tinha certeza que aquele lugar era completamente protegido. Qualquer passo fora da linha e estaríamos ferrados.

—Eu estava procurando por você. —Estremeci, fazendo uma careta quando Sadie apareceu, deslizando as mãos pelo meu braço, se aproximando demais de mim. Me afastei na mesma hora, me virando para ver o biquinho de decepção que se formou nos lábios vermelhos da vampira. —Fedra é uma fêmea de muita sorte, sabia? Eu daria absolutamente qualquer coisa por uma noite com você.

—Pra me matar bebendo meu sangue? —Questionei, arrancando uma risadinha dela, mesmo que eu estivesse totalmente sério. —O que você quer, Sadie? Pensei que estivesse livre até chegarmos ao Vale das Estrelas Perdidas.

—Você está. Pode ir se divertir com os outros machos e fêmeas daqui a vontade. —Sibilou, me fazendo comprimir os lábios quando ela tentou se aproximar e me tocar de novo, estalando a língua quando segurei seus pulsos, longe de mim. —Vim aqui fazer um convite em nome de Hunter. Ele deseja que você e Fedra se juntem a ele no jantar.

—Um convite ou uma convocação? —Ergui a sobrancelhas, vendo-a lamber os lábios com a língua, me lançando um sorriso que servia como uma resposta. Ela fez menção de se afastar, mas segurei seu braço, que a fez me lançar um olhar questionador, como se esperasse que eu tivesse mudado de ideia. —Preciso de vestidos novos para Fedra. Ela não pode sequer pegar as suas coisas quando saímos. —Eu a soltei, observando o brilho de desagrado nos olhos de Sadie. —Não me importo de pagar pelo melhor.

—A costureira de Hunter fica no terceiro andar do navio. —Sadie apontou para o chão, estalando a língua uma segunda vez, me olhando como se pudesse rasgar minha garganta dessa vez. —Ela cobra caro. Mas peça o que desejar a ela, que ela o fará.

[...]

Bati na porta, ouvindo a madeira ranger quando ela se abriu sozinha. O pequeno cômodo estava um pouco nublado com a fumaça de alguns incensos, além de ser parcialmente escuro, mas eu ainda podia ver as figuras de madeira em formato de pessoas, onde vestidos, calças e jaquetas estavam colocadas, sendo criadas aos poucos e outras já prontas. A parede do outro lado repleta de roupas penduradas, além de tecidos soltos e repicados por todos os cantos, inclusive pelo chão.

Quando ninguém apareceu, dei um passo para dentro, olhando para trás quando a porta se fechou com um baque alto demais para passar despercebido. Na mesma hora ouvi o farfalhar de um tecido e o ranger de correntes pelo chão, até uma fêmea surgir por entre as fugiras de madeira. Os olhos se fixando em mim com curiosidade, enquanto eu observava os longos cabelos brancos que contrastavam com a pele negra do rosto. Os lábios finos curvados em resignação, enquanto os olhos pareciam dois diamantes, de uma forma que nem mesmo pareciam reais. Mas o que mais me chamou atenção foram as asas atrás dela. Brancas, longas e volumosas.

—Posso ajudá-lo, senhor? —A fêmea indagou, se movendo pelo meio daquelas roupas até a mesinha cheia de tecidos, entre os incensos acesos, antes dos olhos se demorarem nas roupas simples que eu usava. Só que eu estavam encarando os pés descalços dela, que apareciam de relance por baixo do vestido. Um dos tornozelos envolvidos por uma corrente.—Deseja algo mais social ou roupas de combate?

—Ah, na verdade não é pra mim. —Falei, balançando a cabeça negativamente, para me concentrar no que tinha ido fazer ali. Queria roupas novas, porque por muito tempo só usei trapos velhos imundos. Mas eu não era a prioridade naquele momento. —Preciso de alguns vestidos, para uma fêmea que está comigo.

—Qual é o nome dela? —Indagou, me fazendo umedecer os lábios com a língua, sentindo o suor se concentrar nas minhas mãos de nervosismo, porque não estava esperando encontrar alguém da espécie dela ali.

—Fedra Ridley. —Afirmei, esfregando minhas mãos na calça, querendo espantar o nervosismo. —Preciso de um bom número de vestidos e tudo que ela possa precisar. Não importa o preço.

—Ela deve ser valiosa, para o senhor estar investindo tanto assim. —Murmurou, desaparecendo entre os tecidos. Tentei a encontrar no meio do caos que era aquela sala, mas era difícil ver qualquer coisa ali, com toda aquela fumaça e pouca claridade. —Precisa de mais alguma coisa?

—Você serve Hunter a muito tempo? —Indaguei, escutando o rangido da corrente no chão, tão forte que causou um calafrio na minha espinha e me fez escolher o corpo quando a fêmea apareceu de novo.

—Você quer saber se eu sou escrava dele a muito tempo? —Ela me lançou um olhar frio, praticamente afiado, com aqueles olhos brilhantes. —Quase dois séculos. Mas havia uma estrela antes de mim e vai haver uma estrela depois de mim.

Mordi a língua, pensando em tudo que sabia sobre as estrelas. Elas vinham de um mundo distante, governado principalmente por humanos. Sabia que eram mortais, como eles, mas que podiam usar a magia pura que corria em suas veias para realizar os desejos mais profundos do coração de qualquer um que tivesse em mãos uma lágrima de sangue. Além de usarem sua magia para criar outras coisas, como roupas e comida. Eram consideradas seres de magia pura, o que me surpreendia ver uma delas presa no inferno, em um navio como esse. Só que pela expressão no rosto dela ao ouvir minha pergunta, sabia que não estava ali de boa vontade.

—Precisa de mais alguma coisa? —Repetiu a pergunta, como se estivesse começando a ficar impaciente com a minha demora.

—Preciso de roupas para um garoto de 14 anos também. Ele é pequeno e magro. —Afirmei, jogando com a sorte naquele momento, para que a estrela na minha frente realmente não gostasse de Hunter e não contasse a ele o tipo de pedido que eu havia feito a ela.

—E pra você, não vai querer nada? —Ela indicou as roupas que eu usava, como se fosse uma ofensa eu estar ali com aquele tipo de rouba, com um tecido tão vagabundo.

Esfreguei as mãos na minha calça, pensando no quanto de moedas de ouro eu tinha e o quanto a estrela provavelmente ia me cobrar por aquelas roupas. Eram um montinho o suficiente, mas eu não sabia que tipo de coisas iriamos precisar quando deixássemos esse navio, então não podia gastá-las assim. Talvez eu conseguisse roubar de Hunter quando saísse daqui, ou talvez não. Não podia me dar ao luxo de supor nada naquele momento. Então balancei a cabeça negativamente.

—Não, apenas para os dois. —Afirmei, vendo-a comprimir os lábios em resignação e reprovação, antes de gesticular com a mão para que eu fosse. —Quando eu posso voltar para pegar tudo?

—Eu te aviso. —Foi a resposta dela, antes de desaparecer entre as roupas de novo.



Continua...

Bosque dos Sonhos Mortos Onde histórias criam vida. Descubra agora