Capítulo 59: Dimensão fantasma.

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Recusei a comida quando um dos criados de Daren entrou na cabine, se retirando logo em seguida. Estava ocupado demais pensando no rumo que as coisas estavam tomando. Eu estava entrando em uma encruzilhada e só havia um caminho que me levaria a vitória, mas eu precisava ser esperto o suficiente para escolher o certo.

—O que seria necessário para dar a Hunter o que ele quer? —Indaguei, me reclinando sobre a cadeira, sentindo as mãos de Fedra apertarem meus ombros com força quando ela ouviu minha pergunta. —Quais as regras que regem os governantes dos territórios.

—Nossos governantes estão nesse posto a muitos séculos. Não é fácil tirar um do lugar, já que você está servindo diretamente a morte. —Daren umedeceu os lábios com a língua, batucando os dedos na mesa. —E quando isso acontece, existem muitas pessoas lá dentro que morreriam para te proteger. É difícil chegar perto de um dos governantes. As últimas vezes que uma mudança como essa aconteceu, foi quando um território se voltou contra o outro. Em meio à disputa, um dos governantes foi assassinado por um guerreiro enviado pelo outro governante.

—Um governante não pode matar o outro diretamente. —Fedra afirmou, como se já tivesse ouvido sobre aquilo. Daren assentiu com a cabeça, deixando claro que ela não estava errada.

—Eles não podem, realmente. A morte não permite. Tenho a sensação que minha mãe acha que isso deixa tudo mais interessante. Mas podem mandar alguém matar em nome deles. —Daren olhou pra mim, como se pudesse ver todas as coisas que eu estava pensando. —Agora, por que Hunter ainda não fez isso? Ele pode ter muito ouro e poder, mas não está sobre as leis dos governantes.

—Hunter é do tipo que manda alguém fazer isso em nome dele. Ele não suja as mãos de sangue. Talvez ele já tenha tentado e não tenha conseguido. —Dei de ombros, porque duvidava muito que ele tivesse se contentado em esperar. Os desafios da morte tinham sido uma oportunidade a ele, mas seu desejo já estava lá. —Mas se por acaso, alguém consiga matar... Jonas, por exemplo. Como é escolhido o novo governante?

—Quem chegar primeiro vence. —Daren soltou uma risadinha ao dizer aquilo, enquanto os olhos faiscavam na minha direção. —Nesse caso, até você conseguiria. Se a morte te desse a benção dela, ninguém poderia fazer nada. Teriam que o obedecer.

—Então Hunter só precisa estar lá quando acontecer. —Afirmei, observando o sorriso sombrio que surgiu nos lábios de Daren, fazendo algo desagradável queimar na boca do meu estômago. —Quanto tempo até o alcançarmos?

—O que está pretendendo? —Fedra questionou, saindo de trás de mim para ficar ao meu lado e encarar. —Espero que não pense que pode invadir um território e matar seu governante. Não pode sequer pensar em prometer isso a Hunter.

—Estou pensando em várias opções. —Afirmei, erguendo os olhos para encarar a reprovação exposta no rosto de Fedra. Não acho que ela duvidasse do que eu era capaz. Acho que ela só tinha medo das consequências. Mas eu já estava no inferno. Não tinha medo das consequências, quando a pior de todas elas era viver a vida nesse lugar. —Ele não vai libertar Sebastian apenas se pedirmos com educação.

—Ele não vai libertar Sebastian se não tiver sua cabeça no lugar. —Fedra sibilou, fazendo um arrepio desagradável atravessar meu corpo. Mesmo que eu soubesse disso, não achava que Fedra teria coragem de dizer isso em voz alta.

—E o que você sugere? —Sussurrei, erguendo as sobrancelhas de leve, vendo os lábios de Fedra tremerem quando ficou sem palavras. Isso não me deixou feliz, muito pelo contrário. Se alguém tivesse uma ideia melhor, eu estaria muito disposto a ouvir. —Preciso descobrir o que o segundo desafio quer dizer. Quanto tempo até alcançarmos o navio de Hunter?

—Estaremos sobre ele em algumas horas. —Daren ficou de pé, ajeitando o sobretudo negro que usava, enquanto se dirigia até a porta. —Descansem. Eu aviso quando estivermos nos aproximando. Não espero que Hunter nos receba com bebidas e diamantes.

[...]

Me escorei no parapeito do navio, observando a imensidão da escuridão ao nosso redor, enquanto o navio parecia flutuar em sombras. A calmaria ao nosso redor era quase estranha, porque estava acostumado a estar sempre me preocupando com alguém tentando me matar. Os seres que trabalhavam para Daren perambulavam pelo navio parecendo mortos vivos, fazendo tudo no automático.

Soltei um suspiro e fechei os olhos, tentando sentir qualquer coisa que fosse, mas não havia nada dentro de mim. Parecia que eu havia me tornado uma casca oca. Meu coração batendo era apenas um lembrete de que eu ainda estava vivo, sem ele, eu provavelmente já teria desistido a muito tempo.

—Vai cuidar dela, não vai? —Questionei, engolindo muito lentamente, enquanto abria os olhos e encarava a escuridão.

—Não deixarei ninguém tocar nela. —Prometeu, e eu sabia que poderia confiar naquilo. Daren podia ser muitas coisas, mas não era um mentiroso. —Tem certeza do que pretende fazer? —Quando confirmei com a cabeça, vi o leve balançar de cabeça de Daren, como se ele reprovasse. —Você é imprudente, mas a sua imprudência o manteve vivo esse tempo todo. Só não esqueça que não está mais sozinho.

—E você acabou de me prometer que vai cuidar dela. —Me virei para encarar Daren, observando a expressão resignada no rosto dele. —E se tudo der certo, dele também.

—Vai contar a ela? —Daren indagou, e não hesitei em balançar a cabeça negativamente, porque sabia que Fedra tentaria me impedir se soubesse o que eu pretendia fazer. Era melhor que ela não soubesse. Não podia ter mais uma distração. —Muito bem então, acho que vai gostar de saber que encontrei o que você estava procurando.

—O que? —Soltei, juntando as sobrancelhas, observando a escuridão que serpenteava pelos olhos de Daren, quando finalmente me dei conta do que ele estava falando. —Yaz?

—Você tem muita sorte, Harper. Ou alguém lá em cima gosta muito de você. —Daren assobiou, enquanto eu comprimia os lábios, me recostando no parapeito do navio de novo, enquanto ele fazia o mesmo ao meu lado, para que apenas eu ouvisse. —Ele está em um lugar chamando dimensão fantasma. Não tenho certeza se já ouviu falar desse mundo aqui no inferno, mas ele é importante de uma forma interessante.

—Eu sei. Pra morte conseguir suas almas e conseguir ter contato com a superfície, o inferno precisa estar ligado a um mundo. Esse mundo é a dimensão fantasma. —Falei, observando Daren confirmar com a cabeça. —É uma ligação mágica, não é? Faz com que algumas almas daquele lugar consigam ficar se desejarem, mesmo como fantasmas.

—Abre uma brecha para os mortos. Mas nem todos. —Daren concordou, enquanto eu tentava puxar da memória tudo que sabia sobre aquele lugar. —Yaz está escondido nessa dimensão, o que pode facilitar qualquer contato que você pretenda ter com ele. Ele pediu proteção em troca de serviços a uma rainha mortal.
E pelo que eu consegui descobrir, ele está procurando pelo irmão mais novo. Mas não tem qualquer sinal dele há alguns anos.

Soltei o ar com força, esfregando minha testa quando pensei naquela informação. No que Sebastian sentiria se soubesse que o irmão dele está vivo e procurando por ele esse tempo todo. Mas eu não podia contar isso a ele, porque por um erro meu ele tinha sido levado para Hunter. Não tinha tanta certeza do seu estado, mas sabia que ele estava vivo. Hunter não o feriria, quando sabe que Sebastian é seu caminho até mim.

—Eu consigo falar com ele de alguma forma? —Indaguei, me virando para Daren, observando ele erguer as sobrancelhas e um leve sorriso surgir no canto dos seus lábios, como se ele soubesse que eu ia falar isso.

—Existe uma forma de alguém que está no inferno falar com alguém que está na superfície. —Daren estalou a língua e balançou a cabeça negativamente. —Mas posso te dar certeza que não é agradável.



Continua...

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