Capítulo 73: O que precisava ser feito.

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Entrei na cabine, olhando diretamente para Sebastian sobre a cama, da mesma forma que estava quando eu saí. Parecia morto, mas eu sabia que era só o efeito do que quer que Daren tivesse feito nele. O demônio estava sentado em uma cadeira ao lado da cama, velando o yatori.

—Quanto tempo isso leva? —Indaguei, olhando na direção de Daren, antes de estender o frasco cheio de sangue pra ele. Os olhos dele fitaram a cor escarlate ali, puxando o ar com força como se ele pudesse sentir o cheiro do sangue.

—Alguns poucos minutos. —Ele pegou o frasco, ficando de pé, antes de me estender a outra mão.

Engoli em seco, pegando a pega que estava guardada no meu bolso. Encarei ela por um segundo, hesitante sobre entregar ela a Daren e deixar que ele fizesse aquilo. Era um caminho sem volta. Sem outra alternativa, depositei a pena na palma da mão dele, apertando minhas mãos com força ao lado do corpo.

—Acho melhor você sair. Não vai querer ver isso. —Afirmou, indicando a porta, enquanto eu hesitava mais uma vez, olhando pra ele com uma expressão cética. —Não vou machuca-lo, Harper. Mas a magia vai, por alguns instantes. Irá machucar você também. Vai sentir um puxar no peito, como se alguém estivesse tentando arrancar sua alma. Quando sentir isso, saberá que deu certo. Além disso, preciso ter acesso completo a minha magia. Terei que me transformar.

—Vai se transformar em um demônio enquanto está perto dele? —Questionei, segurando o braço de Daren, vendo-o me lançar um olhar de alerta.

—Não sei o que pensa sobre minha verdadeira forma de demônio. Mas eu tenho total controle sobre meu corpo e minha mente. Agora saia daqui. —Exclamou, apontando para a porta. —Não quero precisar cuidar de você também, quando começar a sentir dor.

Ele me lançou na direção da porta, fazendo um suspiro escapar pelos meus lábios. Sai para o corredor, batendo a porta com força e me escorando nela, porque não tinha pretenção de ir a qualquer outro lugar. Deslizei para o chão, sentindo um nó se formar na minha garganta, enquanto mantinha meu rosto escondido entre as mãos.

Foram alguns poucos segundos até que eu sentisse a magia pura rastejando pelas paredes do navio. Era quase como senti-la rastejando nos meus próprios ossos. Um calafrio percorreu meu corpo quando ergui a cabeça e observei as chamas das tochas oscilarem, como se algo perigoso estivesse pairando no ar. Então elas subitamente se apagaram por completo, deixando todo o corredor no mais absoluto silêncio e na mãos estranha escuridão.

Senti os pelos do meu corpo se arrepiarem, enquanto a respiração se prendia na minha garganta. Não precisava estar dentro da cabine para saber que Daren havia se transformado. O macho que eu conhecia, tinha dado lugar a uma criatura sombria que atormentava os pesadelos. A ideia de que ele estava trancado naquele quarto com Sebastian me deixava tenso, mesmo que eu soubesse que ele só queria ajudar.

Tentei não pensar naquela criatura demoníaca a uma porta de distância de mim, esperando pela dor e pelos gritos. Esperando pelas consequências do que eu tinha feito. As chamas das tochas não retornaram, me deixando mergulhado na escuridão. Apertei meus olhos com força, tendo a sensação de que estava sendo observando. Sendo observado por Daren.

Então Sebastian gritou. Um grito que fez as paredes do lábio estremecerem. Que fez meu coração parar de bater. Um grito de dor que dava a sensação de que alguém estava sendo rasgado ao meio. Prendi a respiração, enfiando o punho na boca, sentindo as malditas lágrimas borbulhando dos meus olhos sem controle, porque em meio aos gritos de Sebastian, em algum lugar daquele navio, Fedra também gritou.

Senti um embrulho no estômago. Uma vontade de colocar tudo para fora. A sensação de que não importava o que eu fizesse, nada nunca seria o suficiente. Odiei estar na minha própria pele naquele momento, sabendo que aquilo estava acontecendo com eles por minha culpa. E o grito dos dois, capaz de esmagar o meu coração, iria atormentar minha cabeça pela eternidade que eu teria no inferno.

—O que você fez, Harper? —A porta se abriu atrás de mim e eu desabei dentro da cabine, assim que os gritos cessaram, sem conseguir respirar direito. Daren me ergueu do chão, agarrando meus ombros e encarando meus olhos, como se estivesse assombrado. —Não era o seu sangue. Seu maldito idiota, o que você fez?

—O que precisava ser feito. —Sussurrei, antes de empurra-lo e correr até a cama quando escutei o arquejo de Sebastian, como se ele estivesse buscando o ar.

Mas seus olhos estavam abertos. A cor havia voltado para o seu rosto e eu quase podia ouvir seu coração batendo como nunca antes. Limpei as lágrimas das minhas bochechas, antes de me sentar na cama e o abraçar quando ele se jogou contra mim, afundando o rosto no meu peito. O abracei apertado, querendo espantar aquela lembrança horrível de quando o carreguei quase morto até aqui.

—Harper? —Olhei por cima do ombro, sentindo algo afiado afundar no meu coração quando encontrei Fedra parada ali, me encarando com um misto de mágoa e fúria.

Sebastian se soltou de mim, cambaleando para fora da cama até ela, antes de os dois se abraçarem apertado. Por um momento, tudo que eu senti foi a mais completa paz ao ver Fedra encher o rosto dele de beijo e agradecer a Daren por tê-lo salvado. Mas quando os olhos dela se voltaram para os meus, vi a mais profunda tristeza ali.

—Por favor, o que quer que você pense que está fazendo, apenas pare. —Fedra sussurrou, erguendo a mão para apertar o próprio peito, como se sua alma ainda estivesse doendo por ter sido partida ao meio. —Apenas pare, Harper. Você disse... você deu a entender que ficaria tudo bem. Você...

—Eu menti. —Abri um sorriso dolorido, sentindo meu coração sendo dilacerado aos poucos. —Você, Fedra, mais do que ninguém, já deveria saber que estou sempre trapaceando e mentindo pra conseguir o que quero.

—E o que diabos você quer com tudo isso? —Fedra gritou, enquanto Sebastian olhava pra mim, tentando entender o que estava acontecendo ali.

—No momento, eu desejo ver a morte. —Sussurrei, desviando os olhos de Fedra para Daren, sabendo que não precisava fazer nada além de dizer o nome dela. —Quero que chame Adya até aqui.

Continua...

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