Capítulo 72: Sangue das duas almas.

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Olhei para o corpo de Sebastian sobre a cama, escutando Fedra tentar conter as lágrimas, sempre que um soluço escapava pelos seus lábios. Daren se aproximou da cama, encarando o garoto meio humano e meio serpente com cuidado. Os suspiros cada vez mais rasos, dando indícios de que o coração estava prestes a parar de bater.

—O que está fazendo? —Questionei, sentindo o braço de Fedra segurar o meu quando Daren estendeu a mão sobre Sebastian e uma sombras negra deslizou da palma da mão dele até o peito de Sebastian. Na mesma hora ele parou de respiração, ficando tão imóvel que parecia estar morto.

—Estou apenas dando mais alguns minutos pra ele. Mais minutos pra você. —Daren olhou pra mim, com o semblante carregado. —Isso vai retardar a morte. Mas ela ainda está vindo. Posso sentir ela pairando sobre o quarto, esperando pelo momento que o coração dele vá parar de bater. Não posso salvar a vida dele, Harper. Mas você pode. Está carregando a pena de um corvo com você desde que a encontrou, não querendo se desfazer dela por nada.

—Se eu fizer isso, a vida dele vai estar atrelado a minha pra sempre. —Afirmei, sentindo algo gelado atravessar meu corpo quando pensei nisso.

—Sim, ela vai. O que significa que ele irá sobreviver a isso. E enquanto um de vocês viver, o outro também viverá. Se um de vocês morrer, o outro também morrera. Porque a sua alma também vai estar atrelada a dele pra sempre. —Daren deu alguns passos pelo quarto para perto de mim, me encarando como se pudesse entender todas as questões que se desdobravam dentro de mim naquele momento. —Se conseguir reverter o último desafio da morte e sair do inferno, Sebastian conseguirá sair com você, já que vocês dois estariam dividindo a mesma alma. Seriam um só. E se isso acontecesse, a imortalidade dele passaria pra você.

Dei alguns passos para trás, sentindo o ar se prender na minha garganta quando absorvi aquele fato. Minha garganta se apertou, enquanto algo afiado parecia estar sendo enfiado no fundo do meu coração. Quando me virei para Fedra, o rosto dela era uma mistura de desolação e esperança.

—Faça isso. —Suplicou, erguendo as mãos para envolver meu rosto, enquanto os olhos eram um mar de insegurança. —Por favor, Harper, faça isso. Salve a vida dele. Você ainda pode tentar sair daqui. Jonas está morto, o que significa que você está na frente dos...

—Mas e você? —Questionei, observando ela fechar os olhos com força e as lágrimas escorreram pelas suas bochechas.

—Nos dois sempre soubemos que não teríamos um futuro juntos. Foi realmente bom cada momento de paz que consegui passar ao seu lado. Mas uma hora isso ia acabar. —Fedra sussurrou, com a voz tremendo como se dizer aquelas palavras doessem profundamente nela. —Nosso acordo era você me tirar de Jonas e me devolver a minha casa. Me devolver para minha mãe e irmão. Pode fazer isso agora, Harper. Pode fazer isso e salvar a vida do Sebastian. Vou ser infinitamente feliz sabendo que vocês dois conseguiram deixar esse lugar.

—Isso nunca foi o que você desejou. —Rebati, puxando-a para perto de mim, enquanto Fedra escorava a testa no meu ombro, me impedindo de ver seu rosto.

—Desejos e sonhos são uma maldição no inferno, Harper. —Fedra se afastou de mim, limpando as lágrimas das bochechas. Comprimi meus lábios ao ver o sangue que manchava sua mão, onde ela havia mordido quando percebeu o que aconteceu com Sebastian. —Estou vivendo com a minha maldição a séculos. Mas você pode finalmente vencer a sua. Do que ele precisa, Daren?

—A pena e o sangue das duas almas que serão entrelaçadas. —Daren caminhou até seu escritório, voltando de lá com um frasco pequeno. Fiquei rígido quando ele estendeu aquilo na minha direção, deixando claro que eu não tinha muito tempo. —Não se esqueça, Harper, que o irmão dele está o esperando.

Mostrei os dentes pra ele, com raiva, antes de agarrar aquele frasco. Peguei na mão de Fedra e a puxei para fora da cabine de Daren, procurando outro quarto para que nós dois pudéssemos ter alguma privacidade. Não precisei ir muito longe, porque uma porta se abriu sozinha e revelou um quarto vazio, como se o navio fosse tão mágico que soubesse até mesmo o que seus homens poderiam querer.

—Você vai fazer, não é? —Fedra indagou, enquanto se sentava na cama, me observando deixar o frasco em uma mesinha ao lado da porta.

Caminhei até o cômodo adjacente onde ficava a banheira, mexendo em tudo até encontrar uma vasilha onde pude encher de água e alguns panos limpos. Quando voltei para perto da cama, Fedra me observou ficar de joelhos na sua frente, limpando todos os ferimentos do seu corpo.

—Você vai fazer, não vai? —Repetiu a pergunta, tocando meu queixo para me fazer olhá-la nos olhos. —Não sei porque você está hesitando tanto. Por que salvar a vida de Sebastian é tão difícil.

—Não estou hesitando. Sebastian não vai morrer, Fedra. Eu jamais iria permitir isso, se tivesse como. —Afirmei, observando ela soltar um suspiro de alívio, como a confirmação que precisava para saber que seria feito. A pena iria cumprir o que estava destinada a fazer. —Só preciso de um momento. Por que as coisas mudaram e...

E aquilo que eu mais desejo também mudou, pensei, sem conseguir dizer as palavras em voz alta. Mas olhei para Fedra, querendo que ela visse a verdade nos meus olhos. A expressão dela se suavizou, como se ela soubesse. Como se ela também desejasse o mesmo. Meu coração disparou, enquanto algo quente e avassalador se espalhava pelo meu corpo quando ela se inclinou e me beijou com carinho. Mais carinho do que eu jamais havia recebido em toda minha existência.

—Conhecer você e poder conviver com você, foi um privilégio pra mim, Harper. E eu amei cada segundo que passei ao seu lado, bom ou ruim. Você vai estar pra sempre no meu coração. —Sussurrou contra os meus lábios, antes de eu soltar o ar com força ao ouvi-la dizer aquilo, erguendo a mão até segurar a nuca dela e a beijar com força, sabendo que se pudesse, jamais a soltaria.

Me afastei dela apenas para terminar de limpar seus machucados. Limpei todos os cortes, antes de fazê-la virar de costas para que eu tirasse o vestido. Não precisei perguntar pra saber. Eu simplesmente já sabia. As costas que antes continham apenas cicatrizes antigas e grossas, agora estavam marcadas com cortes longos e grossos, que deixavam a carne a mostra. Chicotadas tão recentes que eu quase pude sentir a dor dela.

Sai para buscar uma poção de cura com Daren, me demorando em cuidar de cada machucado dela. E a cada parte que eu cuidava, eu deixava um beijo na sua pele, para que Fedra se lembrasse de todos os lugares que eu a toquei. E de como eu cuidaria mais dela se tivesse mais tempo. Talvez um dia conseguíssemos mais tempo. Talvez em outro século.

Quando terminei, ajudei ela a colocar outro vestido, vendo sua expressão tensa quando fechei os botões atrás. Enrolei uma faixa na sua mão, cobrindo aquela mordida, enquanto lembrava de uma certa vampira que eu desejava matar, assim como matei Jonas. Assim como tinha vontade de matar Hunter. Se ele teve sorte, nesse momento estaria sentado no trono de Jonas. Mas eles não eram mais minhas maiores preocupações.

—Fique aqui e descance. —Me levantei e deixei um beijo leve nos lábios de Fedra. —Vou cuidar de Sebastian agora.

—Quando ele acordar...

—Eu te avisarei. —Prometi, pegando os panos sujos de sangue e a vasilha, para tirá-los dali. Me aproximei da porta, pegando aquele frasco vazio, antes de sair dali para enche-lo de sangue.

Continua...

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