Fedra ficou em silêncio do meu lado, mesmo depois das revelações do macho sentado sobre o trono. A fêmea ao lado dele olhava diretamente para Fedra, com os olhos parecendo marejados, se é que isso fosse possível em baixo da água. Mas havia alguma coisa ali, na forma que ela encarava a sereia do meu lado.
—Se eu estivesse no seu lugar, teria a arrancado do meu corpo e a levado mesmo sem ser o seu desejo. —Afirmei, muito baixo, vendo Fedra girar o rosto para me encarar, como se não acreditasse que eu estava falando aquilo. —Se estava preocupado com a segurança dela, era isso que deveria ter feito.
—Tem razão, eu deveria. —Lancey concordou, enquanto Fedra apertava as mãos com força ao redor do meu braço. —Mas eu não fiz e agora você está aqui.
—Por pouco tempo, eu posso prometer. —Afirmei, ignorando a pressão das mãos de Fedra em mim, como se ela quisesse as fundir a minha pele. O nervosismo e a ansiedade gritando de dentro dela. —Se quiser me ver longe daqui o mais rápido possível, entre em contado com o demônio Daren e peça para que venha me buscar.
—Um demônio? —Lancey ergueu as sobrancelhas em um misto de incredulidade e resignação, como se isso piorasse ainda mais a visão que ele tinha de mim. Mas não me importava de fato com isso. Eu só queria sair daquele lugar.
—Quer me ver longe daqui ou não? —Sibilei, apertando minhas mãos em punho, fazendo de tudo para não olhar para Fedra e para a expressão presente no rosto dela.
—E quanto a ela? —Lancey questionou, me fazendo comprimir os lábios ao vê-lo indicar Fedra com a cabeça.
—Eu já estou livre. —Fedra quem respondeu, usando um tom de voz afiado e irritado, como se odiasse ver os outros decidindo sobre ela. —Posso fazer o que quiser e ir pra onde quiser.
Lancey fingiu não ouvir o que ela disse, porque manteve os olhos em mim, esperando por uma resposta minha. Puxei o ar com força, ainda estranhando a sensação de estar respirando embaixo da água. Fedra me encarou, como se também quisesse saber o que eu tinha pra dizer sobre aquilo.
—Minha promessa era liberta-la e trazê-la até em casa. —Afirmei, com as palavras queimando dentro da minha boca, como brasa quente. —Só quero ir embora e seguir o meu caminho.
Fedra afastou as mãos de mim ao ouvir minha palavras, com os olhos grudados na minha expressão determinada. Não olhei pra ela, porque não saberia o que fazer se acabasse a encarando. Depois de um longo segundo, quando ela percebeu que eu havia terminado, suas mãos se fecharam em punho e ela nadou para longe dali, deixando aquele lugar.
Meu coração se contraiu dentro do peito, como se eu estivesse levando uma lâmina o mais fundo que conseguia nele. Lancey se inclinou sobre o trono, abrindo um sorrisinho, como se soubesse que eu iria machucá-la. Como se esperasse por aquilo. Mesmo com uma pitada de raiva dentro de mim, não me importei com ele e com o que ele pensava, porque ainda estava pensando em Fedra e no que havia dito.
—Vou chamar Daren pra você, Harper. Volte pra sua caverna e espere até alguém ir avisa-lo sobre a chegada dele. —Lancey afirmou, enquanto a fêmea ao lado dele negava com a cabeça, como se não estivesse contente com suas decisões. Sem dizer uma palavra, ela nadou para longe também, deixando apenas eu e Lancey ali. —Quer saber qual é o segundo desafio, Fox Harper?
—Qual?
—Recupere aquilo que foi roubado. —Lancey proclamou, antes de gesticular com a mão para que eu saísse dali.
[...]
Fui levado de volta para aquela caverna por uma outra sereia, que evitou olhar pra mim ou falar comigo. Não que eu tivesse tentado me aproximar demais. A única coisa que fiz foi perguntar sobre Fedra, mas ela se limitou a negar com a cabeça, como se eu fosse obrigado a entender o que isso significava.
Sozinho, me troquei e coloquei roupas secas, enquanto pensava no novo desafio que a morte havia soltado, ao mesmo tempo que pensava no que fazer. Tinha que ir atrás de Sebastian. Tinha que resolver os problemas em que havia enfiado todos nós. Em meio a todos esses pensamento, cai no sono sobre a cama. Quando acordei, não havia qualquer sinal de que Fedra tivesse passado por ali para dormir comigo. Não havia qualquer sinal de que ela havia se quer aparecido para me ver.
Soltei um suspiro, me sentando na cama e esfregando meu rosto. Tinha que descobrir o que a morte queria com esse segundo desafio, mas precisava primeiro recuperar Sebastian de Hunter. Tinha certeza que o mago não faria nada para facilitar pra mim. Ele me mataria assim que colocasse as mãos em mim. A não ser que eu tivesse algo de muito interessante pra ele.
Me assustei ao ouvir o som da água, me virando para encontrar uma sereia ali. Meus ombros se encolheram involuntariamente quando vi que era a fêmea que estava ao lado de Lancey no trono, não Fedra. Fiquei de pé, imaginando que ela estava ali para me avisar sobre Daren. Mas ela acenou com a mão para que eu me aproximasse.
—Lancey mandou você aqui? —Indaguei, vendo-a negar com a cabeça enquanto eu me aproximava. Havia algo de familiar nela. O tom verde dos olhos era quase reconfortante. —Fedra mandou você aqui?
—Ela não sabe que eu estou aqui. Ninguém sabe. —A sereia sussurrou, estendendo a mão pra mim quando me ajoelhei na beirada da água. Quando tocou minha mão, um calafrio atravessou minha coluna por senti-la tão fria. —Mas eu precisava falar com você, antes que o demônio chegasse.
—O que você quer? —Questionei, comprimindo os lábios quando ela apertou minha mão com as suas. A pele fria me deixando arrepiado. Aqueles olhos verdes parecendo mais intensos quando ela se inclinou para mais perto de mim, os cabelos negros caindo como uma cachoeira por seus ombros.
—Quero pedir que a leve com você. Quero implorar pra que não deixe Fedra aqui, onde a morte pode aparecer a qualquer momento e a levar. O que quer que você vá fazer, por favor, leve-a com você. —Os olhos dela se encheram de lágrimas, enquanto ela apertava minhas mãos com força. As palavras soando como um soco no meu estômago. —Não deixe que a morte a leve de volta para aquele macho. Para aquela vida infeliz servindo aos desejos dele. Por favor, leve-a com você e a proteja.
—Você é a mãe dela. —Constatei, sentindo um nó se formar na minha garganta quando a fêmea na minha frente fechou os olhos como se estivesse com dor, inclinando a cabeça até encostas a testa nas nossas mãos. —Ela veio até aqui por você.
—Ela queria que eu soubesse que ela está bem. Mas eu sei que não está. Eu sei que ela nunca estará bem enquanto viver nesse lugar. —Ela ergueu a cabeça de novo e me encarou, com os olhos repletos de súplicas. —Leve-a com você, Harper. Eu sei que existe algo entre os dois. Eu vi com meus próprios olhos. Se você... se você se importa de verdade com a minha filha, por favor, eu te imploro que a leve com você.
—Só um de nós pode deixar o inferno. —Falei, mesmo que tivesse certeza que ela sabia sobre isso. A sereia negou com a cabeça, as lágrimas escorrendo em abundância pelas bochechas.
—Tenho fé que você pode dar um jeito nisso. Fedra é a coisa mais preciosa da minha vida. —A mão dela se ergueu e tocou meu rosto, enquanto eu via todas as semelhanças da mãe com a filha. —Eu dou qualquer coisa a você. Mas por favor...
—Não precisa me dar absolutamente nada. Não existe nada que você possa me dar. —Afirmei, segurando a mão dela e a afastando do meu rosto, observando a desolação que tomou conta do seu rosto, como se ela acreditasse que eu já havia me decidido. —Diga-a para vir até mim. Avise-a de que eu estou esperando-a.
A sereia soltou um suspiro pesado, com a esperança brilhando nos olhos quando se afastou de mim e afundou um pouco na água, ficando apenas com o rosto para fora. Um sorriso se abrindo nos lábios quando me encarou por um longo momento. Parecia que ela via algo em mim. Algo que nem mesmo eu poderia ver.
—Que a grande deusa da vida o presenteie com uma eternidade cheia de luz e felicidade. —A voz da sereia era como uma prece. Um fio de luz no meio da escuridão. —Minha filha teve muita sorte em encontrá-lo nesse mundo de morte. Proteja-a por tudo que é mais sagrado.
Não ousei falar em voz alta, mas prometi isso a mim mesmo.
Continua...
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Bosque dos Sonhos Mortos
FantasíaMergulhe no Mundo das Almas Fox Harper é apenas um dos tantos escravos humanos que vivem nos territórios de Adya, a deusa da morte. Tendo o corpo coberto de cicatrizes, vivendo entre raças poderosas e mortais, ele sabe muito bem que o inferno não é...