Capítulo 68: O quanto eu desejo viver.

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Me sentei na proa do navio, observando a imensidão da escuridão ao meu redor, e a floresta que estava escondida nas sombras embaixo de nós. O ar fedia a sangue, como se aquele cheiro tivesse ficado grudado no meu nariz. Era enjoativo, de uma forma que eu já estava acostumado.

Engoli lentamente ao escutar o som de algo arrastando no chão, até sentir a serpente se enrolar na minha cintura e então passar para o meu braço, até estar no meu colo. Não abaixei os olhos, mesmo que soubesse que Sebastian estava me observando da sua forma animal de yatori.

—O que pretende fazer em relação ao terceiro desafio? —Sebastian indagou, quebrando o silêncio que eu tinha considerado muito bem-vindo naquele momento. Precisava de um momento para absorver os últimos acontecimentos. Precisava colocar minha cabeça no lugar, antes de agir e acabar piorando as coisas.

—Eu ainda não sei, Sebastian. Eu ainda não sei. —Afirmei, soltando o ar com força, sentindo meu corpo inteiro dolorido por conta da tensão que emanava de dentro de mim. —Preciso pensar em libertar Fedra agora. Depois eu penso nesse desafio.

—Mas todo mundo vai tentar te matar. —Sebastian insistiu, como se eu não estivesse entendendo a gravidade da situação. —Principalmente se você pisar no território de Jonas!

—E o que quer que eu faça? Deixe Fedra para trás?

—Não! —Ele praticamente gritou, apertando o corpo longo ao redor do meu braço, até eu sentir meus músculos enrijecerem. —É claro que não. Vou até lá com você e vou ajudá-lo a trazê-la de volta. Não vamos deixá-la. Mas precisamos de um plano, porque você não pode pisar lá ignorando que a morte em pessoa colocou sua cabeça a prêmio.

—O que eu estaria disposto a fazer para vencer. O quanto eu desejo viver. —Sussurrei, ignorando Sebastian, pensando na forma como Daren falou comigo. A morte estava me testando. Querendo saber até onde eu estava disposto a ir para sair do inferno. Mas eu estava disposto a morrer por isso?

—O que está pensando? Você está com aquela cara que sempre faz quando está criando algum plano ou tendo alguma ideia. —Sebastian afirmou, me arrancando uma risada amarga, porque todas as ideias que tive desde que ouvi o terceiro desafio, não terminavam bem. Pelo menos não pra mim.

—Ainda não tenho um plano, Sebastian. Bom, tenho uma parte dele, mas não completo. —Falei, engolindo em seco, finalmente abaixando os olhos para encarar a serpente no meu colo, que me encarava com os olhos incrivelmente grandes. Podia quase ter um vislumbre do rosto de Sebastian naqueles olhos. —Mas não precisa se preocupar com isso. Tudo vai terminar bem no final.

—Não sei como isso pode ser possível. —Sebastian retrucou, com a cabeça se movendo para os lados como se estivesse negando.

Comprimi os lábios, ignorando os pensamentos de morte que envolviam cada plano que eu tinha. Sempre soube que jamais conseguiria levar nós três pra fora do inferno. Era impossível, além de todos pelo caminho ficarem me lembrando disso. Mas Yaz estava esperando pelo irmão, agora que sabia onde ele estava e que estava vivo. Ele provavelmente estava buscando uma maneira de tirar Sebastian daqui, mesmo que eu soubesse que jamais encontraria.

Quando ele se desse conta disso, entraria no inferno para se juntar ao irmão. Ele faria isso, mesmo que eu tivesse dito para não o fazer. Mas eu vi nos olhos de Yaz aquele dia, que ele preferia entrar no inferno e ficar preso ao lado do irmão, do que viver sabendo que não conseguiria o tirar daqui. Mas esse era um lembrete e a chama que mantinha minha cabeça no lugar, para que eu não errasse.

—Harper, o que você... —Sebastian ficou em silêncio quando Daren surgiu atrás de nós, como uma sombra se movendo na escuridão. O demônio não expressou qualquer emoção quando o olhei por cima do ombro, como se pudesse ver a morte pairando sobre minha cabeça, pronta para me levar.

—Se quer aprender a lutar, então precisamos começar desde agora. —Daren afirmou, me fazendo ficar de pé e cambalear até o convéns, pulando no chão na frente dele, com Sebastian enrolado no meu estômago. —Luta corpo a corpo primeiro. Espada depois.

Eu o obedeci, seguindo-o até onde alguns dos seus homens nos aguardavam, no centro do convéns, com expressões ansiosas, como se estivessem loucos para lutar comigo desde que o demônio os mandou ficarem longe. Agora eles teriam a chance e eu também, porque usaria cada gota daquilo para me tornar melhor.

Então eu treinei, lutando contra todos aqueles seres imortais que viviam com Daren, até meu corpo não saber mais o que era descansar ou relaxar. Até meus músculos latejarem segundo após segundo. Noite após noite. Sebastian era um expectador ansioso, enquanto a estrela observava tudo de longe, porque se recusava a se aproximar demais de Daren, como se luz e trevas não pudessem se encontrar.

Quando finalmente peguei em uma espada, meus braços já pareciam mais fortes e prontos para uma guerra, mesmo que eu soubesse que isso não era o suficiente para vencer Jonas. Sadie era uma sombra constante atrás de mim, sorrindo sempre que meu sangue era derramado no convéns, ou quando eu terminava meu treino com o corpo todo machucado e dolorido. Nada daquilo era pior do que ser chicoteado, porque pelo menos aqueles machucados de treinamento tinham um proposito, me deixar mais forte.

Depois de alguns dias, eu já sabia manejar uma espada muito bem, além de me defender sempre que alguém me atacava de surpresa. Daren tinha feito muito isso. Mandado homens me interceptarem em momentos que eu estava livre, me obrigando a ficar em alerta o tempo todo. Era bom, porque agora eu estava sempre olhando para todos os lados, lembrando constantemente que minha cabeça estava a prémio e a qualquer momento alguém poderia tentar me matar.

—Harper! —Abaixei a espada ao ouvir o grito de Sebastian, olhando por cima do ombro, até vê-lo olhar pra mim com uma expressão ansiosa, antes de apontar para o horizonte. —Estamos chegando.

Olhei na direção que ele apontava, vendo o castelo de Jonas surgir entre as sombras, revelando as tochas que marcavam seu formato grandioso e assustador. Apertei o cabo da espada com força, antes de me aproximar da beirada do navio, sentindo o fogo da determinação queimando nas minhas veias. Fedra estava lá dentro e eu estava disposto a fazer aquele castelo ruir para tê-la de volta.


Continua...

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