Capítulo 54

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Mirei-o, um pouco espantado, sem acreditar, de imediato, no que ouvia; era a primeira vez que escutava Dominic avocar a paternidade da criança.

Por um momento ele ficou parado, voltando a olhar para o mar; em seguida, saiu de onde estava. Notei que o amigo tinha alguma coisa a mais em sua mente que não queria revelar. Com o rosto fechado e meditativo começou a andar a passos firmes e lentos de um lado para o outro, até que se sentou novamente na poltrona ao meu lado.

— Eu não queria lhe contar isso, mas...

Disse-me ele sem olhar para mim, e ainda reflexivo.

— É nela que eu penso sempre... a todo momento...

Dominic suspirou. Depois, abaixou os olhos para o chão e continuou:

— Demorei um tempo para entender e, muito mais, para aceitar: estou muito apaixonado por Elisa...

Interrompeu-se e, depois de um instante, prosseguiu, falando com uma infinita dificuldade.

— Um sentimento que domina a minha vida; uma paixão que sufoquei com a esperança de que, com o tempo, ela morresse; mas, para minha desgraça, ela cresceu e apoderou-se de mim. Estou quase louco de amor, esta é a verdade. Não sei o que fazer.

Ele confessou, nada feliz.

Eu sabia tão bem quanto o amigo que o destino lhe dava um golpe terrivelmente cruel; esta paixão proibida e sem futuro o lançava no abismo. Dominic, tanto pela origem inferior da moça (cujo o espetáculo da pobreza o repugnava), como, também, pelas tradições dos Metherral, nunca poderia ser visto na companhia de Elisa; menos ainda, ter chegado ao ponto de ter um filho com ela; e, dessa forma, entendia perfeitamente o motivo do seu conflito: o amor e a aversão que Dominic sentia por Elisa estavam unidos com a mesma intensidade.

— E mais...

Emendou ele, erguendo os olhos e fitando-me.

— Ainda tive a sorte comigo... estando eu a ir muito mais vezes do que desejava naquele terrível lugar onde Elisa mora, ninguém me viu, ou, se me viu, não me reconheceu. Penso que as ruas de casas espaçadas e os horários tardios em que lá estive, contribuíram ao meu favor. No entanto, não posso contar sempre com isso; é um risco que não quero correr.

Pior é que eu não soube o que lhe dizer de pronto; porém, um pensamento foi me chegando pouco a pouco, e foi por aí, nesse estado de espírito, que a idéia surgiu:

— Tenha os três: a mulher, o seu filho e o império.

Disse-lhe eu, vendo o seu rosto inexpressivo tomar forma de raiva.

— Estás louco, Sam?! Não me compreendes?! Como poderia eu ficar com eles?! Troças de mim, só podes...

Irritado, Dominic pôs as mãos no rosto.

— Bem, até onde sei, louco estás tu. Não foi o que disseste a pouco, que estás louco de amor?

Retruquei.

Ele me olhou de novo, e achei graça dos seus dentes que lhe mordiam o lábio; e a sua expressão facial mostrava-me bem que fervia de ódio.

Mais uma vez, um gole da bebida deslizava por minha garganta.

— Descansa, deixe-me dizer-te o que penso.

Bocejei. (não fiz por vontade natural, mas para lhe mostrar que sua raiva me cansava)

— Minta para Elisa; tenha-a em suas mãos: registre a criança, ou melhor, deixe-a pensar que registraste o bebê com o seu sobrenome, e depois...

— Chantageá-la-ei com a guarda do menino.

Completou ele.

— Não concluíste mal, é isto mesmo.

Dominic encarou-me com o ar interrogativo:

— Achas que ela acreditaria? Não seria possível enganar-lhe tanto...

Observou, desanimado e sem nenhuma certeza na voz.

— Ora, o que uma caipira ingênua sabe sobre as práticas do mundo?! O que tu disseres a ela estará dito, e ela acreditará.

— A idéia não é má, visto que não há outra, mas, de qualquer maneira, isso só permitiria que Elisa me deixasse ver o meu filho sem por obstáculos, o que me custaria muito e, no entanto, não resolveria nada.

Dizia ele, desapontado. Entretanto, uma idéia trouxe a outra.

— Leve Elisa para um lugar longe.

Dominic olhou-me de lado; estava muito pensativo.

— Um local fora da cidade.

Deu o parecer.

— Sim, de difícil acesso. Viva com ela e com seu filho sem que ninguém saiba, e, claro, faça o possível para conquistá-la.

O amigo baixou os olhos e me olhou de volta, concordando logo em seguida.

"E foi assim que tal plano surgiu; e os preparativos para farsa começaram logo no outro dia.

Impossível Para MimOnde histórias criam vida. Descubra agora