Capítulo 4

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Elisa

Meses antes...

Acordava e ainda faltava a claridade do dia. Corria descalça, depressa, para frente da casa; para lá do pequeno jardim; com os olhos relançando acima da relva, além do horizonte, observando o sol majestoso despontar.

— Muito bonito.

Sempre dizia, todos os dias.

Não era preciso de muito para se ter um belo sorriso.

O condado de Lester fica na margem sulina de Redar; tem agora duzentos habitantes. Antes disso, ouvi dizer, havia lá o vale do ouro, no tempo das carruagens e dos andarilhos. Naquela época, levaram tudo, deixando para trás o salário minguado de quem fez o condado de lar.

Foi em Lester que eu nasci, em uma casinha de cinco cômodos construída por papai; a madeira, muito simples, de pinho trabalhado. A casa? Uma graça. Havia nela, lhe rodeando, uma varanda de cerca branca; esta contrastava com o amarelo canário das paredes externas; suas janelas, azuis, com venezianas, suportavam as floreiras, cujas dálias eram exuberantes, de um colorido único.

********

Era uma destas tardes da qual eu adorava: a brisa do norte me aquecia a pele. Eu estava sentada quietinha no banquinho do jardim, absorta na leitura de um livro; entretanto, um ruído no portãozinho enjambrado chamou minha atenção, e um sorriso satisfeito, deveras, surpreso, logo se formou ao ver eu de quem se tratava a visita.

Ali em pé, a mulher conservava liso o seu rosto, exceto, por duas profundas rugas que convergiam na testa. Nos seus cabelos existiam poucos fios cinzentos, e nos seus olhos, muita doçura.

O livro voou — tamanha a minha afobação — e corri na direção daquela que tinha de mim profundo respeito e íntima admiração. Abri o portãozinho e lhe dei a passagem, fechando-o logo em seguida.

— Senhora Mariley!

Ela abraçou-me com tanta ternura que me fez sorrir.

— Minha querida! Vim aqui para vê-la.

— Estou muito lisonjeada. Venha, está chegando a hora do chá; mamãe está assando os biscoitos de amêndoa.

— Não quero incomodar.

— Não está incomodando.

Fomos assim, andando, atravessando o pedacinho de jardim; e quando entramos na casa, o aroma dos biscoitos já se esparramava por todo ambiente.

— Thereza tem as mãos de anjo! Que bom perfume!

Disse ela, depois de respirar profundamente. De repente, os olhos que estavam no chão fixaram-se em mim.

— Bem... como já deves saber, regressei ontem da capital; estava visitando minha irmã.

— Sim, sim, eu ouvi os rumores.

Suas mãos, rechonchudas, seguraram as minhas.

— Elisa, um feliz acaso aconteceu; trago comigo boas notícias da cidade: veja você que a Metherral University — aquela mesma cheia de pompas — abrirá, no próximo mês, algumas bolsas permanentes para os melhores gabaritos. Haverá duas, pelo que li no jornal, para licenciatura. Seria uma lástima se você não se tornasse uma acadêmica.

Sorri, varrendo para longe o meu espanto.

— Acadêmica... eu?!

Perguntei-lhe, tremendo. A mera possibilidade deixou-me com o espírito inquieto. Sempre sonhei em ser uma professora... tão competente quanto esta que estava à minha frente; embora, a realidade deste feito fosse remota. Nada nos faltava, é verdade, papai era sempre muito esforçado; entretanto, eu sabia perfeitamente que não tínhamos o dinheiro necessário para sustentar uma Universidade. Então, diante de tal oportunidade, a idéia apoderou-se depressa do meu coração.

— Naturalmente, menina! Você sempre foi minha melhor aluna.

Encorajou-me. E a minha alegria ficou maior.

Ofereci-lhe uma cadeira e, com uma infinita euforia pela boas novas, voltei os pés apressada para cozinha.

— Chamarei mamãe!

Quase gritei. Estava tão exultante que, por pouco, não caí ao chegar no próximo cômodo.

Impossível Para MimOnde histórias criam vida. Descubra agora