O último show

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Em 4 de março de 1979, Stray Kids se apresentou para uma plateia lotada no Soldier Field em Chicago, Illinois.

Esta seria a última apresentação deles.

12 horas antes

O relógio marcava 8 da manhã, mas eu já estava acordado havia horas. Na verdade, não dormi nada. O hotel era luxuoso, com seus lustres de cristal e janelas enormes que davam uma vista perfeita da cidade, mas para mim, aquela manhã parecia fria e sufocante.

Hyunjin estava no quarto ao lado. Eu podia sentir sua presença, mesmo sem vê-lo. Tínhamos passado por tanta coisa juntos, mas nos últimos meses, tudo estava diferente. A gente não se falava, mas o que mais doía era o silêncio. O silêncio entre nós era ensurdecedor. O som do nada.

Levantei da cama e encarei o espelho do banheiro. Meus olhos estavam fundos, avermelhados, com olheiras que me faziam parecer mais velho. Eu passei uma mão pelo cabelo, tentando ajeitar os fios bagunçados, mas quem eu estava enganando? Por dentro, eu estava despedaçado. Me vesti rapidamente, pegando o casaco de lã e os óculos escuros, e saí do quarto. Precisava de ar.

No saguão do hotel, Chan já estava sentado, tomando café. Ele me viu e fez um gesto para que eu me juntasse a ele. Caminhei até lá, sentindo o peso do que estava por vir. Eu sabia que Chan era o mais cansado de todos nós, afinal, ele era o nosso líder. A dor de carregar aquilo todo esse tempo transparecia em seu rosto.

— Está preparado? — Chan perguntou, mexendo no café.

Eu apenas balancei a cabeça, sem saber o que responder. O que é que se diz num momento desses? "Sim, estou pronto para ver mais um pouco de nós desmoronar"? A realidade era que eu não estava. Nenhum de nós estava.

— Vai ser um grande show — ele tentou amenizar, um sorriso triste no rosto. Mas nem ele acreditava nisso.

— É... Um grande show — murmurei, mais para mim mesmo do que para ele.

Chan suspirou, deixando o silêncio preencher o espaço entre nós. Não havia muito mais a dizer. Ele sabia tanto quanto eu que essa turnê tinha nos levado ao limite.

Depois de um tempo, os outros começaram a aparecer. Changbin entrou no saguão com Minho e Seungmin. Jeongin estava logo atrás, e Jisung, como sempre, chegou com cara de quem não havia dormido nada, os olhos vermelhos e a fumaça de cigarro impregnada na roupa.

Park, nosso empresário, apareceu logo em seguida, fazendo sinal para que nos reuníssemos na sala de conferências do hotel. Eu me sentia pesado ao caminhar até lá, e a sensação só piorou quando vi Hyunjin parado na porta da sala, braços cruzados, encostado na parede. Ele olhou para mim, mas desviou o olhar rapidamente. O espaço entre nós parecia maior do que nunca.

Entramos na sala e nos sentamos ao redor da mesa. O clima estava tenso, mas Park parecia determinado a manter as aparências, como sempre fazia. Ele estava com algumas anotações na mão e começou a passar pelos detalhes técnicos do show da noite. O que vestiríamos, o que deveríamos falar, como lidar com a imprensa. As mesmas conversas de sempre, mas desta vez com um tom amargo.

— Chicago está com as expectativas altíssimas, então, não podemos decepcionar, — ele começou, apontando para alguns papéis à sua frente. — Esse show é crucial.

Eu me perguntei se ele sabia ou se ainda estava tentando fingindo que a banda não estava desmoronando diante dos seus olhos.

— Ah, e um lembrete... — ele fez uma pausa, olhando para todos nós, mas especialmente para mim e Hyunjin. — Eu sei que a imprensa anda em cima de vocês dois, Felix e Hyunjin. Não deem motivo para mais fofocas, estamos entendidos?

Eu queria rir, mas não consegui. Ele falava como se não estivéssemos à beira do colapso. Como se nossas vidas não tivessem sido viradas de cabeça para baixo pelos rumores, pela dor, pela separação forçada. Como se fosse só uma questão de "manter as aparências" para que tudo se resolvesse.

— Claro — respondi, sem emoção. Hyunjin apenas assentiu, mas nem olhou na direção de Park.

O clima naquela sala era sufocante. Cada palavra dita parecia atravessar o ar como uma faca, cortando a pouca conexão que ainda tínhamos. Quando a reunião finalmente terminou, saímos um a um, em silêncio. Eu queria falar com Hyunjin, queria dizer que estava sentindo falta dele, que ainda o amava, mas não consegui. Eu estava preso, sufocado pela situação.

Enquanto o dia passava, a tensão só aumentava. Os preparativos para o show eram uma distração, mas não por muito tempo. A cada passo que dávamos em direção ao palco, mais claro ficava que todos nós estávamos no limite. Quando chegamos ao estádio, a multidão já estava lá fora, esperando ansiosa. Eu olhei para o relógio. Faltavam poucas horas.

Na passagem de som, trocávamos o mínimo de palavras possíveis. Todos faziam seu trabalho de forma mecânica, quase automática. O único momento em que tudo parecia normal era quando a música começava. O som da guitarra de Hyunjin cortava o ar, preenchendo o vazio, e por um breve momento, eu me lembrava de porquê fazíamos isso. Porquê continuávamos. Mas o silêncio que seguia cada nota era um lembrete doloroso de que aquilo estava acabando.

Quando a tarde virou noite, eu me troquei e encarei meu reflexo mais uma vez. As luzes do estádio já iluminavam o céu escuro, e eu sabia que, dentro de algumas horas, aquilo tudo acabaria. Soltei o cabelo, retoquei a maquiagem, ajeitei minha roupa e respirei fundo. Eu precisava de força para subir naquele palco, para encarar Hyunjin mais uma vez e cantar aquelas músicas que significavam tanto para nós.

O tempo parecia passar rápido demais, e antes que eu pudesse perceber, estávamos todos reunidos nos bastidores, prontos para entrar. Olhei para Hyunjin uma última vez antes das luzes se acenderem e, por um breve segundo, ele me olhou de volta. Não dissemos nada, mas o que precisávamos dizer estava ali, nos nossos olhos.

Quando as luzes se apagassem, nada mais seria o mesmo.

You're my morning sun Onde histórias criam vida. Descubra agora