Coletivas de imprensa

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O Aurora foi, sem dúvidas, o nosso melhor álbum até então. Eu sabia disso no instante em que começamos a gravar, mas, porra, o sucesso que ele teve foi além das expectativas. Cada música que tocava nas rádios era um lembrete de que havíamos criado algo realmente incrível. As guitarras, os vocais, a composição... Tudo estava perfeito. Cada acorde de Glass Shadows, cada sussurro de Whispers in The Dark, aquilo tudo estava sendo transmitido ao mundo inteiro. Era surreal. E todo esse sucesso nos jogava direto nas coletivas de imprensa, onde a merda realmente acontecia.

Começamos a fazer várias coletivas para divulgar o álbum e a turnê, que estava prevista para começar em fevereiro. O que significava, claro, mais perguntas sobre mim e Felix. Eles não queriam saber das composições, dos arranjos, ou da performance dos outros membros. Não, o interesse era só em nós dois. E, por mais que nossa química vendesse discos, era frustrante. Os jornalistas ficavam loucos para saber se éramos mesmo um casal ou se tudo não passava de uma estratégia de marketing.

Eu me lembro de uma dessas coletivas. Estávamos todos alinhados em uma mesa, tentando parecer unidos, quando uma jornalista levantou a mão e começou a fazer perguntas:

— Hyunjin, Felix, a química de vocês dois nas músicas é inegável. Vocês conseguem nos contar um pouco mais sobre como é trabalhar tão próximos? — Ela perguntava com aquele sorriso sarcástico, já sabendo aonde queria chegar.

Eu troquei um olhar rápido com Felix. Nós sabíamos o que viria a seguir. Ele manteve um sorriso discreto, sempre calmo, mas eu senti a tensão no ar. Minha resposta tinha que ser cuidadosa. O ano era 1978, e, porra, dois homens juntos nunca seriam bem vistos. Um escândalo poderia nos destruir.

— Nós sempre nos damos bem em estúdio, — respondi, a voz controlada. — A música flui naturalmente quando estamos juntos. Acho que isso é o mais importante para o Aurora.

Felix riu suavemente ao meu lado e completou:

— Sim, a química é só o reflexo do quanto estamos conectados musicalmente.

Mais perguntas começaram a surgir, sempre com aquela insistência, tentando arrancar uma confirmação. Um outro jornalista, mais ousado, foi direto ao ponto:

— E quanto aos rumores de que vocês estão namorando? Isso é algo que podemos esperar ver nos próximos meses, assumindo um relacionamento? Ou é apenas uma parte da estratégia de marketing?

Porra, aquela pergunta. Não era a primeira vez, e com certeza não seria a última. Eu senti o peso das câmeras, dos flashes, de todos esperando por uma resposta. A regra era clara: nunca confirmar, nunca negar explicitamente. A dúvida mantinha o interesse e vendia discos, mas, ao mesmo tempo, nunca podíamos confirmar que era tudo real. Se soubessem que éramos um casal, dois homens, em 1978... aquilo poderia acabar com tudo. Nossas carreiras, nossa banda.

Antes que eu pudesse responder, Park, nosso empresário, tomou a frente com um sorriso simpático:

— Ah, os rumores. Sempre uma parte divertida, não é? — ele disse, rindo como se aquilo fosse apenas uma piada inofensiva. — O importante é que eles estão focados na música, e isso é o que faz a diferença. O resto são apenas especulações, não é?

A coletiva continuou, mas a tensão entre os membros da banda estava presente em cada segundo. Nós fingíamos que estava tudo bem. Fingíamos para o público, para a mídia, para as fãs. Mas a verdade é que, por trás das câmeras e dos sorrisos, as coisas estavam desmoronando.

Quando a coletiva terminou, Chan suspirou, parecendo exausto enquanto deixávamos o salão.

— Não dá para continuar assim, — ele murmurou para mim e Felix. — Essa pressão está destruindo a banda. Precisamos resolver isso antes que seja tarde.

Eu não sabia como responder. Chan estava certo, é claro, mas o problema era maior do que apenas conversas sobre união. As dinâmicas estavam mudadas. O foco constante em mim e Felix estava corroendo tudo por dentro, e por mais que tentássemos manter a banda junta, a cada nova coletiva, a cada nova pergunta, eu sentia que estávamos nos afastando mais.

Quando chegamos ao dormitório, eu puxei Felix para o lado.

— Isso não vai parar, — eu disse, a voz baixa. — Eles vão continuar perguntando. Não importa o quanto a gente desvie.

Felix me olhou, a expressão pensativa.

— Eu sei. — Ele fez uma pausa, respirando fundo. — Mas a gente tem que segurar as pontas, Hyunjin. Por nós. Pela banda.

Eu assenti, sabendo que ele estava certo. Mas, porra, aquilo estava ficando insuportável.

E enquanto o sucesso do Aurora continuava a crescer, enquanto nossas músicas tomavam o mundo, a verdade era que, por trás das cortinas, o que tínhamos como banda estava se desfazendo lentamente.

You're my morning sun Onde histórias criam vida. Descubra agora