Parte II

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"Apenas quando somos instruídos pela realidade é que podemos mudá-la."

Bertolt Brecht


As aulas do terceiro ano do Ensino médio iniciam hoje, mas uma vez. Estou no segundo semestre do ano. Estudo numa escola estadual que é até boa. Alê estuda na melhor escola particular da cidade. Isso me conforta, pois não nos vemos com tanta frequência. Já pensou? Além de morar na frente da casa dele, estudar com ele?! Seria um inferno.

Claro que gostaria de estar perto dele o máximo de vezes possíveis, além de querer estudar numa escola boa de verdade, mas meu masoquismo só vai até certo nível e o dinheiro dos meus pais também.
Quando estou com ele o mundo parece melhor, até por que minha casa é um porre em muitas vezes. Ele me faz o amar e o odiar ao mesmo tempo. Se isso é possível?! Não sei, mas ele o faz. E isso que me puxa mais ainda para ele, independente do quão idiota ele seja ou quão cego é. 

Meu pai é um homem bom, honesto, trabalhador e ama muito suas duas filhas (eu e minha irmã, Alice). Ele trabalha em obras e é muito requisitado. É engraçado e tem um humor-negro que é um "Deus nos acuda", mas ele tem defeitos miseráveis. Bebe demais. Xinga demais. Não me entenda mal, eu o amo, afinal ele é meu pai, mas não tapo os olhos para as burradas dele não, sei que esse é um defeito dos homens em geral. Gastar dinheiro com besteiras, mulheres que não se dão ao respeito e tentar bater em sua esposa em seus acessos de raiva alcoolizado, não são coisa lá admissíveis. 

Minha amada mãe é uma guerreira. É mais nova que meu pai uns doze anos, eles são casados há vinte. Ela se desdobra para deixar tudo impecável, e isso me irrita e muito, é amorosa, carinhosa, protetora e super- amiga (diferente de muitas mães, a minha conversa sobre tudo comigo e minha irmã). Há um tempo entrou numa forte depressão e quase se suicidou na minha frente. Por isso tento ser forte em quesito família, eu que sustento. Ela suporta muitas das besteiras do meu pai, como bebedeira (sempre a base da briga verbal) e traição (tapando os olhos), não aceito e sempre estou do seu lado. Ela cuidou de mim e agora eu cuido dela. 

Meus pais não são um casal há muito tempo... Mas continuam juntos. Muitas vezes isso me aborrece, outras me aliviam. Mas só digo uma coisa que é real em mim. Eu não choro mais por isso. Tenho que ser o porto segura para minha irmã, ela é muito família, mas eu também era.
Minha irmã, Alice, é um doce e uma pobre alminha por cair numa casa tão conturbada, apesar de ela ter seus acessos de perturbações também como qualquer irmão mais novo. A amo com minha própria vida e é por ela e em parte por minha mãe que mantenho a barra na casa. Que a vida dela seja o mar de rosas que ela sempre sonhou e que eu sempre a desejei...

O garoto da frenteOnde histórias criam vida. Descubra agora