Alê - Parte I

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"Logo você, que teve o pior de mim... Eu sei que errar é humano, mas me aceitar depois de tudo, é amor...".

Marília Mendonça

Depois de Laila ter me expulsado da praia, eu só tinha uma certeza: tinha que ficar sozinho e beber até morrer ou até Laila me aceitar. Não podia voltar para casa, não agora. Eu tinha que ficar em um canto mofando e é por isso que volto por cima do meu próprio rastro, como um cachorrinho com o rabinho entre as pernas.

Mas não antes de parar em um supermercado qualquer todo encharcado e comprar um pouco de comida e assim que entro no corredor de bebidas lembro que sobraram alguns litros do noivado e vi debaixo do balcão. Pago e volto para o carro, agora pegando a estrada.

Dessa vez não me preocupo com o repertório. Poderia estar tocando metalera e estaria chorando do mesmo jeito, por isso opto por colocar umas músicas para desgraçar tudo de vez, assim como a maioria das pessoas. Às duas horas de viagem são vividas em um borrado de lágrimas e chuva. Juro por Deus, que não sei como cheguei sã e salvo nessa casa, porque meu estado não tá dos melhores.

Minha roupa me faz ser quase um peso morto, mas me arrasto para dentro da casa. Deixo a prancha presa no carro e só não me esqueço de trazer a comida porque minha barriga ronca. O conteúdo da sacola é alguns biscoitos, salgadinhos e torta, mas só jogo em uma cadeira de vime e começo a tirar a roupa. Não quero pegar um resfriado por isso, tomo logo um banho e visto algo quente. Lembro que mamãe tem um estoque de chá para onde que ela vai e coloco a água para ferver e enquanto isso, guardo meu estoque de alimentos e tiro o prato de comida da geladeira e esquento no micro-ondas.

Como sem muita vontade, porque apesar de minha barriga roncar, meu estômago está revirado e embrulhado, mas jogo tudo para dentro. Lavo e arrumo a cozinha, não por querer colocar meus dotes para fora, mas sim por não ter nada para fazer. Assim que parar irei começar a pensar em Laila e aí já era. Choro na certa. Não sei, mas Laila me faz quebrar todas minhas barreiras, é como se todas as comportar de um reservatório se abrissem de uma só vez.

Imagino Lucas ou Gabriel me vendo chorar como uma criança a cada cinco minutos e isso me traz um pouco de alegria. Sorrio e puxo lembranças de momento engraçados para não dar espaço para a tristeza e insegurança me afugentar. Eu tenho que ter fé que Laila vai me escolher. Começo a limpar a casa. Arrumo a sala de estar e de jantar e lavo o banheiro do térreo. Subo a escadaria e tiro o pó dos quartos e fico por lá mesmo.

Meu quarto tem o papel de parede de tábuas e parece realmente que ele é feito disso e o teto tem um que se parece palha, igual àquelas cabanas. Lembro que foram Amanda e Rodrigo que me ajudaram a escolher. A cama é box coberta por lençóis brancos, tem uma pequena cômoda de madeira escura e uma poltrona cor de café no canto do quarto próximo a janela grande. Nesse lado da parede há uma corrente de pisca-piscas que passa por cima da janela. Sempre gostei de ver como o verde mudava para o verde e depois para o vermelho e assim vai até pegar no sono enquanto ouvia as ondas quebrando quando era mais novo.

Meu notebook está aqui e vejo novamente os vídeos do noivado da gente bêbado dançando. Minha gargalhada ressoa pelo quarto e me sinto vazio quando ela se vai. Penso em Laila, na verdade ela não sai dos meus pensamentos em momento algum, mas dessa vez foco detalhadamente em seu rosto o memorizando.

Seus olhos envoltos por cílios grandes. A íris cor de chocolate derretido, pontilhado por manchinhas mais escuras, que passavam despercebidas por causa de seus óculos de armação grossa. Suas sobrancelhas arqueadas como se desafia-se e a pequena cicatriz pouco a cima dela. Sua boca cheia rosada e delineada. Seu queixo levemente cortado que só se nota quando ela sorri. Seu rosto em formato de coração, as maçãs do rosto proeminentes. Seu nariz pequeno e arrebitado. O pequeno sinal próximo a sua orelha...

O garoto da frenteOnde histórias criam vida. Descubra agora