Capítulo 6 - A garota

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Alissom

Meus pais viviam se beijando na minha frente quando eu era criança, o que eu achava péssimo. Ficava aquele silêncio constrangedor e não importa onde eu estivesse, eu tinha que sair correndo pra não pensar em vomitar no chão. Achava chato essas demonstrações de carinho exageradas na frente dos outros, na frente dos próprios filhos! Eu não queria ver a minha mãe ser beijada na boca, caramba, era a minha mãe!

Mas lembro do dia em que senti vontade de beijar uma garota pela primeira vez. Era verão, Agnes estava brincando na frente de casa como de costume, porque mesmo tendo um milhão de brinquedos na nossa área dos fundos, ela preferia ficar lá fora, na sombra da árvore, tomando chá com os amigos imaginários, já que ela não tinha os reais.
Nesse dia em especial ela só estava lá parada, esperando alguma coisa acontecer. E aconteceu.

Kate chegou. Tímida e escabelada por causa do vento da viagem. Eu a vi alguns minutos depois dela entrar com Agnes dentro de casa. Ela era uma visão.
Estava com um vestido jeans com uma Poly gigantesca bordada nas costas e botas brancas. No verão. E sempre vestia coisas estranhas assim.

Assim que coloquei os olhos nela, tive vontade de vomitar. Não porque ela era nojenta, mas porque eu vi corações saindo pelas minhas orelhas e uma música romântica tocando no fundo. Naquele minuto quis beijá-la.

Um estranho pensamento pra alguém de onze anos, ainda mais pra alguém que odiava meninas e só suportava a irmã porque era do mesmo sangue. Mas naquele dia, ao colocar os olhos na menina mais bonita que eu já vi, eu me apaixonei perdidamente. E não importava se eu era novo demais, eu queria casar com ela, queria ela só pra mim.

Infelizmente, a maturidade me chegou mais tarde do que eu gostaria, então minhas únicas táticas de conquista com ela foram ignorá-la ou fugir dela. Tinha medo de que ela percebesse que eu era terrivelmente apaixonado por ela.
Só que depois de tanto tempo fugindo, ignorando ou sendo rude, ela acabou se acostumando. Então, quando completei quinze e entendi que não ia conquistar ela nunca se continuasse dessa forma, eu mudei de estratégia. Tentava puxar assunto quando estavámos juntos, convidava ela pra jogar vídeo game ou ficar perto de mim no recreio. Porém, era tarde demais, ela já tinha entendido tudo errado.

Aos dezesseis me conformei, nunca iria casar com ela. E era uma tortura vê-la todos os dias na minha casa ou na escola, então decidi que ia namorar outra garota. Qualquer garota.
Não foi difícil conquistar as outras meninas, elas eram fáceis de conversar, não eram tão complexas como Kate. Levei duas ou três para apresentar pra minha mãe, todas as vezes Kate estava presente para o meu infortúnio, e todas elas terminavam comigo depois, alegando que eu era muito frio ou que não dava o devido valor. E tinham razão, eu era um péssimo namorado.

Aos dezessete, decidi que o melhor pra mim era me mudar de país, longe de qualquer resquício de Kate. E foi o que eu fiz.
Longos cinco, e torturantes, anos. Namorei mais algumas meninas, gostei de todas, e todas me diziam a mesma coisa:

— Parece que você tá procurando uma coisa que eu não posso te oferecer!

Sim. Nenhuma delas ria tão alto como Kate, nem tinham o cabelo tão bagunçado como ela. Nem usavam botas no verão ou usavam lenços no pulso. Nenhuma delas acordava de mau humor de manhã e precisavam de uma xícara de café sem açúcar e meia hora em silêncio pra voltar ao normal.
Nenhuma delas usava um pijama do Star Wars, nem ficava horas falando "This isso the way" pra qualquer escolha que tomava.
Nenhuma delas sabia escolher o picolé certo: qualquer um com casquinha de chocolate na volta.

O irmão da minha melhor amigaOnde histórias criam vida. Descubra agora