30 dias. 8 de dezembro de 1986.

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Hoje completa doze dias que estou aqui em Londres, e todos acordamos com batidas esquizofrênicas na porta.

Eu e o Charlie pulamos da cama (faltou luz noite passada por causa da forte nevasca e o Charlie aproveitou para ir na surdina ao quarto onde eu e a Kim estamos dormindo.) e, ao chegarmos na sala, encontramos a Kim, a Susan e a Meredith encarando a porta.

- Abram já essa droga de porta! - abraço o braço do Charlie, que me olha e diz num sussurro:

- É a voz do meu pai.

- Meredith, abre logo essa porta!

Meredith respira muito fundo, ajeita seu robe e vai até a porta. A abre. O pai do Charlie que por alguma razão eu ainda não sei o nome entra no apartamento com uma cara excessivamente vermelha.

- QUE DIABOS DE IDEIA MALUCA FOI ESSA? Vamos já pra casa - ele vai até ela e a pega pelo braço.

- Não! Me deixa, Joel - Ah, ele se chama Joel. - vai embora!

- Papai, por favor me leva daqui! - grita Kim, se jogando em cima do pai.

- Eu vou, querida, eu vou... Mas primeiro sua mãe e eu precisamos ter uma conversa séria.

- Não temos nada para falar.

- Sim, nós temos - Joel largou a Kim num canto e segurou com uma força desnecessária o braço da Meredith. - vamos.

Eles sumiram pelo corredor e eu escuto a porta de um dos quartos de fechar. Segundos depois, uma discussão acalorada de inicia, com direito a palavrões e sons de coisas se quebrando.

- Charlie, não se mete! - sussurra Susan, quando o Charlie se afasta de mim em direção ao corredor que leva para o quarto. - deixa eles dois.

- Mas ele tá agredindo ela! E por mais que eu já tenha me ferrado muitas vezes por causa disso, não posso deixar que a minha mãe apanhe daquele babaca.

Susan abre a boca para dizer mais alguma coisa, mas o Charlie da as costas e some no corredor. Ao mesmo tempo, ouvimos a porta de abrir e tudo fica em silêncio.

- Qual o seu problema, ein? - ouço a voz exaltada do Charlie. Corro até ele e o vejo respirar pesadamente, os punhos cerrados. - por que você tem que ser assim? Por que tem que deixá-la assim?

- Não se entrometa nisso, Charlie - ele disse, passando por nós.

Meredith vem logo atrás, seus olhos vermelhos de tanto chorar.

- Eu vou matar ele... - Charlie murmura para mim.

- Calma, ok? Você matar ele não vai melhorar em nada, relaxa.

- Charlie, você pode vir aqui, por favor? - Charlie respirou muito fundo e passou por mim. Eu vou logo atrás. Na sala, todos estão reunidos para ouvir o que Joel tem a dizer. Meredith chora silenciosamente. - arrumem suas coisas. Vamos voltar pra casa.

- Eu não vou voltar praquele casa coisa nenhuma.

- Eu... Eu não sei mais se quero ir - gagueja Kim, finalmente percebendo quem o pai dela é de verdade.

- Mas vocês virão. Eu e a sua mãe conversamos e...

- Não! Vocês não conversaram... Você impôs à ela uma ordem e... Isso é errado, cara. Muito errado. Por que você não deixa ela em paz? Volta lá pra sua amante de quinta categoria.

Claramente, o Joel não sabia que o Charlie sabia sobre a amante, e descobrir isso o deixa bastante irritado, porque ele lança um olhar severo para a Meredith, e diz para todos:

- Isso foi um grande mal entendido, e que logo logo será resolvido. Agora vão já arrumar as malas.. Kim, você tem muito o que estudar, eu conversei com o diretor e você poderá fazer na semana que vem as provas perdidas.

- Eu... - Kim olha para o Charlie, como que suplica por ajuda, e sai da sala.

- Eu acho que vou deixar você conversar melhor com a sua família - digo.

- Eu não tenho nada pra falar, vamos - Charlie segura minha mão e vamos para o quarto, onde ele fecha a porta e diz: - Como... como ela pode ser tão estúpida? Por que ela tem que fazer isso com ela mesma?

- Talvez ela tenha medo dele...

- EXATAMENTE! - exclama. - se ela tem medo, deveria querer manter distância dele, não acha?

- É...

- Eu definitivamente não quero voltar pra lá. Eu...

- Não tem problema. Voltamos juntos para Manchester, e você fica lá em casa. Isso não é um pedido... - concluo, vendo que ele está prestes a argumentar.

- Obrigada - ele me lança um sorriso.

Logo estamos arrumando nossas malas. Minutos depois, as enfiamos no fundo do carro do Joel e sentamos no banco traseiro.

A viagem, por ainda estar nevando e ser bastante perigosa, é bastante lenta. Joel tenta puxar conversa algumas vezes com a filha o com a esposa, mas ninguém lhe dá atenção.

Para tentar quebrar o gelo inquebrável, Joel liga o toca fitas e começa a tocar The Police; Charlie balança a perna nervosamente e eu repouso minha mão em cima dela; Kim está de olhos fechados, mas eu sei que não está dormindo por causa do movimento sutil que ela faz com os pés; lá na frente, a Meredith encara distraidamente o lado de fora. O branco e distorcido lado da fora, talvez dando uma boa última olhada na maravilhosa Londres; eu, por outro lado, estou totalmente concentrada aqui dentro. Minha mão repousada na perna do Charlie faz com que eu me sinta ainda mais próxima dele, mesmo que estejamos lado a lado.

Aos poucos, a neve e o céu branco vão dando lugar à paisagem meio seca,  por causa do inverno que se aproxima, e vultos de prédio começam a surgir aos poucos.

- Já que ir lá pra casa? - pergunto ao ouvido do Charlie, que balança a cabeça negativamente.

- Vou para lá primeiro.

- Tem certeza? - ele assente. - certo, mas eu vou pra casa, tudo bem?

- Você precisa ver seus pais, tudo bem sim.

...

Minha mãe se joga em cima de mim e eu sinto minhas pernas fraquejarem com o peso.

- Eu estava com taaanta saudades!!! Não sabia que você voltaria hoje. Por que voltaram? Esta com fome?

- Mãe, calma. Eu estou com fome sim.

Coloco a mala no pé da escada e vamos para a cozinha, onde ela me faz um sanduíche de presunto e, enquanto eu como, conto-lhe o que aconteceu para termos voltado tão de repente.

- Mas ela não pode deixar que ele a trate assim! - ela diz assim que eu termino de falar.

- É, eu também acho e o Charlie também acha...  Na verdade, todo mundo acha que ele não pode trata-lá assim, mas eu não sei o que se passa na cabeça dela. Não sei porque continua com ele.

- Isso é algo que nunca conseguiremos entender.

- É, só espero que isso não termine da pior forma.

[CONCLUÍDA] A Contagem Regressiva de Charlie e TessOnde histórias criam vida. Descubra agora