110 dias. Supresa

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Abro os olhos e a primeira pessoa que vejo é o Charlie. Eu sei, eu sei. Isso é muito estranho. Quer dizer, o que ele está fazendo aqui, me observando como se eu fosse sua parente nos últimos momentos de viva?

Eu não sei onde estou, então me ajeito na cama e coço os olhos. Estou num quarto cinzento de hospital. De volta à minha segunda casa.

- O que você está fazendo aqui? - pergunto à ele, que ri.

- Muito bom ver você também.

- Mas eu não disse que é bom te ver. Perguntei o que você está fazendo aqui.

- Certo. No sábado você desmaiou do nada, então te levei para dentro do Colégio e eu fiquei com você até seu pai chegar. Aí ele te trouxe pra cá e eu vim te visitar ontem e nós conversamos bastante.

- Nós? Eu e você? Mas eu não lembro disso.

Ele dá de ombros.

- Eu não estou mentindo. Pode perguntar aos seus pais.

- Eles deixaram você ficar aqui? - ele balança a cabeça. - Ah - digo, um tanto desconfiada.

- Mas se você não quiser que eu...

- Não. Não precisa ir embora, fica tranquilo.

- Certo... - ele se ajeita na cadeira para me olhar melhor. - e como você explica o fato de não se lembrar de nada que aconteceu ontem?

- Hum... - Eu não quero responder, mas ele me observa com tanta curiosidade que eu digo: - tem haver com o câncer.

- Você tem câncer?? - ele pergunta sem nenhuma sutileza.

- É, eu tenho. Você já pode ir embora se quiser.

- Por que eu iria?

- É o que as pessoas fazem quando descobrem que eu tenho câncer... E eu não estou me fazendo de vítima. Só estou dizendo o que acontece.

Pela primeira vez, logo após contar à alguém que eu tenho câncer, não sou olhada com pena. Charlie me encara com de um jeito diferente.

- Isso não vai acontecer - ele diz. - acho que seremos bons amigos.

- Mas... - tento argumentar, mas ele me interrompe colocando o dedo indicador na frente dos meus lábios.

- E nem venha com o papo de que não quer se aproximar de ninguém por causa do câncer. Eu sei o que eu faço.

- Tira seu dedo sujo daqui - Sorrio e ele faz o mesmo, recuando. - e aquela... sua amiga? - pergunto, me lembrando do sábado.

- Ah, a Mary. Ela é minha ex-namorada - ele diz com certa tranquilidade.

- Hum... Por que vocês terminaram? - indago. Ele movimenta as sobrancelhas para cima e para baixo e se levanta, vai até a janela e depois me olha.

- Eu traí ela. É, eu sei. Você deve estar pensando que eu não presto e que provavelmente sou um cafajeste miserável.

- Eu não pensei nada disso - digo. Ele estende o braço, como se quisesse que eu me calasse.

- Mas eu mudei, se você quer saber.

[CONCLUÍDA] A Contagem Regressiva de Charlie e TessOnde histórias criam vida. Descubra agora