Capítulo XXIV: O dia que eu tentei matar o Gê.

55 6 0
                                    

Estávamos prontos para partir. Monge Kim fez questão de que tomássemos um reforçado café-da-manhã e aceitamos de bom grado e barrigas roncando. Enquanto comíamos, reparei que Lindsey não estava presente, porém recusei perguntar-me sobre ela ao monge. Sabia que se quisesse partir conosco, teria nos comunicado.

Infelizmente, para mim, aquilo era um fracasso. Pesava em minha consciência. Era para sermos doze. Doze signos como os doze planetas; doze horas; doze deuses. Contudo, seríamos onze. Estaríamos incompletos. Eu não sabia se aquilo poderia acarretar em alguma problema para nós ou para Lindsey e um medo me subia pela coluna só de pensar que a resposta poderia ser um "sim".

Enquanto andávamos pelo templo, fiquei para trás, pensando e empurrando Leon e com Arys segurando firme em meu ombro.

- Ela não vai vir mesmo? - perguntou Arys, baixinho.
- Acho que não. Mas tudo bem. Precisamos seguir em frente. Ainda falta mais um. Pelo menos sabemos que ela está em segurança. - comentei, tentando não demonstrar decepção.
- Sim. Contudo, acho que o mais correto seria nós doze juntos. - confessou Leon, entrando na conversa.
- Nisso, não discordo. Todavia, vocês lembram do dia que os buscamos? Lembra das duas opções que demos? - interroguei-os.
- Sim. Seguir com vocês... - começou Arys.
-...ou continuarmos onde estávamos, do mesmo jeito. - completou Leon.
- E vocês escolheram. Fiz o mesmo com ela. Não obriguei ninguém a seguir nessa jornada, justamente para não ter decepções...- falei, ficando séria.

Continuamos a caminhar em silêncio e em poucos minutos estávamos na entrada do templo. Segurei firme no apoio para mãos da cadeira de rodas de Leon e respirei fundo. No mesmo momento, Sam veio saltitando na minha direção.

- Vamos para Venezuela! Nunca estive lá. Como será? Aposto que vai estar calor. É perto do Brasil! Podemos descer para ver o país? Quero ver tanto a Venezuela quanto o Brasil. Devem ser muito bonitos. Que tal irmos para a Venezuela, descermos pelo Brasil até na Argentina? Vai ser uma viagem muito legal. - comentou o garoto, falando rápido.
- Cansei só de ouvir. - anunciou Leon, rindo.
- Calma, Tagarela italiano com alma brasileira. Primeiro as prioridades. - confirmei. - Quem sabe, se tudo ocorrer bem, podemos curtir essa última busca e fazer dela, férias. Acho que merecemos algo do tipo.
- Oba! - comemorou a criança, dando pulos.
- Acho que não estou levando roupas para um clima tropical. - exclamou alguém atrás de mim.

Virei-me rapidamente e me deparei com Lindsey segurando firmemente sua mochila nas costas. Ao me ver, ela sorriu.

- Já se decidiu? - perguntei, limitando-me a sorrir.
- Kim me orientou que essa é a escolha certa e foi você mesma que me disse para seguir meu coração. É o que estou fazendo. - confirmou ela.
- Então, bem vinda a bordo. - disse, rindo.
- Namastê, gente. - cumprimentou o restante do grupo.
- Olá, Lindsey. Que bom que veio se ajuntar conosco. - comunicou Esther.
- Isso aí. Bom dia. - falou Courtney.
- Que fofa. - e Violet apertou suas bochechas.
- Namastê, Lindsey. - falei, curvando-me rapidamente.

Todos me olharam, estranhando minha atitude. Relaxei os ombros.
- Também tive convivência com monges, porém nunca consegui alcançar o estado de Nirvana. Lembra daquela época que quase te matei, Gê? - perguntei, olhando para ele.

Gê fez uma careta.
- Como me lembro. Meu pescoço ficou roxo por uma semana.- confessou.
-Essa é uma boa história. Vamos contá-la no caminho. - confirmei.

Eles concordaram e continuamos a andar. Lindsey nos comunicou que estava no horário de meditação do monge Kim e que por isso ele não veio de despedir. Perguntei se ela tinha se despedido dele e dos demais, pois não os veria tão cedo e ela confirmou, anunciando que todos nos desejou boa viagem.

Assim que retornamos a grande estrada de terra que dava acesso ao templo, abri um túnel e mergulhamos no subterrâneo.
- Que incrível. - disse Lindsey, observando a estrutura do túnel.
- A Tory consegue fazer vários desses.É assim que viajamos. - anunciou Peter, ligando sua lanterna.
- Eles são mágicos. Podemos andar o mundo todo em poucas horas e em segurança. - completei.
- Lindsey, você pode me dizer exatamente como é o túnel? - perguntou Arys.

Sorri, vendo a tentativa dele de fazer a garota se sentir mais a vontade conosco. Lindsey começou a olhar em volta e a dizer:
- É bem grande e parece não ter fim. É tão alto que precisaríamos de uma escada enorme para tocar o teto. A terra das paredes é úmida e avermelhada. Segure um pedaço dela. - falou a garota, tirando um pedaço de barro da parede e entregando a Arys.

Arys passou os dedos devagar no pedaço, sentindo a textura. Eu o guiava devagar, para que aproveitasse aquele momento.
- É um pouco gelada. Fresca. - concluiu ele.
- E aqui tem um jeito bom de terra molhada. - acrescentou Leon, respirando fundo.

Vi Gê parar ao lado de Arys e sorri.
- Podemos continuar a história agora. - confirmou ele.
- Isso! Por que você quase matou o George, Tory? - perguntou Esther.
- Ele disse que eu estava treinando por que não tinha inteligência suficiente para estar junto com ele nas Grande sala de estudos. Como eu não sabia controlar a raiva e nem minha força, joguei ele do outro lado do refeitório e segurei firme em seu pescoço, falando para ele pedir desculpas. Como podem notar, não deu muito certo. Nunca havia visto os guardas agirem tão rápido. - contei.
- E tinha tantos. Acho que você assustou os doutores. - comentou o Gê, rindo.
- Também acho. Eles conseguiram nos separar e me deixaram em uma sala reforçada. Foi a primeira vez que fiquei sem jantar. Só me deram algo pra comer depois que o sol nasceu. É claro que pedi desculpas para o Gê e a partir daquele dia, incluíram meditação na minha lista de atividades. Em poucos dias, dois monges estavam me visitam uma vez por semana. Com o passar do tempo, algumas horas de meditação e muitos exercícios, aprendi a controlar minha raiva e, principalmente, minha força.- afirmei.
- Desde então, a Tory não tentou estrangular ninguém. - confessou Gê.
- Eu pagaria para ver essa cena. - falou Peter, brincando.
- Isso porque não foi seu pescoço que ficou em jogo. - retrucou George.

Todos nós rimos e continuamos a andar. Seria uma longa viagem de volta ao Ocidente e por mais que tínhamos viajado demais, essa nova caminhada tinha um gosto diferente. Afinal, estávamos indo atrás do décimo segundo e último signo. Logo, todos nós estaríamos em segurança.

Os Doze Dons Do SolOnde histórias criam vida. Descubra agora