Capítulo XXVIII: Lar, doce (e com muitas cobras) lar!

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Quando por fim passei pelo portal, me surpreendi. Estávamos em outro floresta, completamente diferente daquela que estávamos a segundos atrás. Olhei em volta, reparando a enorme colina coberta por pouca vegetação. Havia algumas porção de arvores altas e medianas, o resto era coberto por um tipo de grama mais alta.

- Tory, por acaso, você não tem medo de cobras, não é?- perguntou Leon, tranquilamente.

Sorri.
- Poucas coisas me causam medo e cobras não é uma delas. - confessei, confiante.
- Que bom. - respondeu ele, rindo.
- Por que? - interroguei-o de volta.

Invés de me responder, Leon apenas apontou para baixo e olhei, curiosa. Confesso que me assustei e a vontade de sair correndo foi enorme, mas meus instintos de sobrevivência falava: "Sem movimentos brutos!". Aos meus pés estavam três cobras de cores diferentes. Peter colocou a mão no meu ombro e eu coloquei a mão na boca, reprimindo o grito.
- Elas não vão nos atacar. - confirmou ele, como se lê-se meus pensamentos.
- Como tem tanta certeza? - questionei, tirando meus pensamentos das cobras.
- Leon falou com elas. Digamos que as cobras protegem a ilha e elas sabem que vamos viver aqui. - contou ele.
- Elas também confirmaram que vão fazer nossa segurança. Nada de ataques. - completou Leon.
- Vamos coexistir juntos. - falou Gê.
- Que animador! - falei, sem entusiasmo. - Por que tem tantas cobras no meu pé? Não estou contente com essas boas- vindas.
- Não é só nos seus pés e sim, por todas as partes. - confirmou Gê.

Eu estava tonta de tantas perguntas. Por que estávamos ali? Será que realmente moraríamos ali? Aquele era nosso lar? Por que tantas cobras?
- Elas falaram para seguirmos para o leste. - anunciou Leon, brincando com um filhote nas mãos.
- Se as cobras falaram, quem sou eu para discordar?! - afirmei, irônica.

Muito normal seguir orientações de répteis. Do que estou falando? Nada do que vivíamos era normal. Não podia esperar uma casa iluminada pelo sol em um bairro qualquer de uma cidade animada. Balancei a cabeça. Estava julgando a ilha sem ao menos a conhecer. Isso era injusto! Respirei fundo e tentei olhar as coisas boas: o lugar tinha uma vegetação bonita (tirando as cobras). Dei um passo para frente e uma das cobras desviou do meu pé. Cobras adestradas. Interessante!

Depois de caminharmos por alguns minutos, deparei com uma placa velha, desbotada e quase ilegível presa por um prego em uma das estacas fincadas no chão. Forcei um pouco e consegui decifrar as palavras.
- Ilha...da Queimada...Grande. - li. - Ah! Ilha da Queimada Grande. O que será que significa? Colocam fogo aqui?

Gê me deu um tapa leve na cabeça.
- Larga de dizer bobeira. Conheço esse lugar. - comentou ele, voltando a andar.
- Então, diga-nos. - pedi, seguindo-o.
- Estamos em um dos lugares mais perigosos do mundo: a Ilha das Cobras. - confirmou ele.
- Não é o que diz na placa. - retruquei.
- Isso porque esse nome vem da ação dos antigos povos vierem para esse lugar, atearem fogo na tentativa de espantar as cobras e embarcar em segurança. Li que com o passar do tempo, o veneno das cobras ficaram mais forte a ponto de matar imediatamente. Calculasse mais de cinco cobras por metro quadrado. - confirmou ele.
- Não gostei dessa parte. - confessei, sentindo um frio na coluna.
- Por ter tantas cobras, o governo brasileiro protege esse lugar de visitas sem autorização. Até as águas são protegidas.
- Governo brasileiro?
- Sim. Para ser mais especifico, estamos no litoral de São Paulo. Provavelmente, a floresta que estávamos antes era a costa de Itanhaém. Apesar de ser uma ilha, não tem praias. Somente grandes paredões de rochas ingrimes. O desembarque aqui é bem complicado.
- Faz sentindo o portal, então.
- Houve um tempo, no século XX, alguns agricultores tentou estabelecer uma plantação de bananas na ilha. Atearam fogo na ilha inteira, tentando matar as cobras...
- Isso é cruel. O lugar é das cobras por direito.
-...Mas deu errado. As cobras se esconderam em fendas das rochas e cavernas. Os planos de plantação foram abandonados.
- Agricultores bobões.

Gê riu e continuou:
- Isso deu origem a uma das lendas da ilha. Dizem que três pescadores voltavam de uma pesca improdutiva e se sentiram atraídos pelas bananeiras da ilha, famintos. Assim que embarcaram na ilha, foram picados pelas cobras e saíram desesperados. Algumas semanas depois, foram encontrado apenas dois corpos. - contou ele.
- E o terceiro corpo? - perguntou Arys.
- Nunca foi encontrado. - confirmou Gê.
- Talvez tenha caído na mar. - supus.
- Tem uma história mais assustadora que essa. Na ilha tinha um farol e para fazer a manutenção dele, foi mandado um homem, sua esposa e sua filha pequena. O farol servia para alertar aos navegantes sobre os perigos da ilha e suas águas. Em uma viagem para levar mantimentos a ilha, o farol foi encontrado vazio, com a porta aberta. A equipe encontrou os corpos da família em uma trilha na encosta. Mesmo com os muros de proteção, uma única cobra conseguir entrar. Dizem que até hoje é possível se ouvir a risada da garotinha. - falou Gê.
- Se alguma das crianças não dormirem por medo, você que irá cuidar dela. - advertir ele.

Apesar da bronca, Gê sorriu. Revirei os olhos e fixei na torre a nossa esquerda. O farol. Ainda bem que não estava no nosso caminho. Talvez eu fosse conferir ele depois. Não reparei que enquanto olhava, continuava a olhar. Só parei quando Leon disse:
- Tory, pode parar. - pediu ele.

Parei e olhei pra frente, estávamos de frente a uma clareira. No meio da clareira, havia uma casa enorme. Tinha bastante janelas e uma porta enorme na entrada. Era feita de madeira e parecia ter uns três andares.O que mais me agradou foi ver que tinha poucas cobras na clareira. Eu ia ficar com agonia por alguns dias por ter visto tanto os repteis. E pelo visto, eu teria que me acostumar com elas.

- Acho que encontramos nosso lar. - afirmei, avançando em direção a casa.

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