50

27 0 0
                                    




Anna.

Eu gosto particularmente do ar frio de Seattle. Eu me lembro de adorar a Califórnia nas viagens de família quando eu era criança, mas com o tempo, o frio e a chuva se moldaram ao meu humor, e em ocasiões como as de hoje, o orvalho que se aloja nas folhas verdes vivas é quase como as lágrimas finas que percorrem o meu rosto.

O carro desliza tranquilamente pela pista escura que fica cada vez mais preta conforme a chuva cai. A proximidade do hotel no qual a minha mãe está alojada do meu apartamento é assustadora, são apenas 10 minutos de carro a 40km/h e pela primeira vez, eu andei a 20km/h. Talvez porque eu me achasse muito sábia quando sai de casa e em minutos eu sabia que estava errada e que não teria a menor ideia de como dizer o que deveria dizer. Não sabia o que esperar, seu olhar de raiva, conformidade ou até... perdão? Tendo a minha mãe como o ser mais evoluído que eu já conheci, não me admira em absolutamente nada a possibilidade de ela estar conformada e já haver perdoado ele. Mesmo que eu não queira isso.

Meus sentimentos e emoções estão a cada segundo mais fluídos, eu não sei o que pensar, jé que sinto que posso odiá-lo na mesma velocidade que sinto pena, repulsa, seguida pelo ódio. Frustração, por me sentir tão pequena diante de uma situação tão grande e até conformidade em saber que no fundo eu sou assim mesmo, muito frágil diante dele. Ainda que mantenha o orgulho firme, sei como sou vulnerável, suscetível. Quem dera eu não fosse.

Entro com calma em um estacionamento vizinho e respiro fundo alguns segundos ainda dento do veículo parado enquanto um rapaz moreno de cabeça raspada está claramente incomodado já que... eu estou claramente alugando seu tempo e paciência e está muito frio lá fora. Visto a o sobretudo de Joseph que estava largado no banco do passageiro e sinto o aroma dele, isso me acalma. Saio do carro, sentindo a torrente de vento batendo no nariz e me aninho mais fundo dentro do agasalho, sorrindo e dando 10 dólares ao paciente instrutor.

Caminho com as chaves do carro fazendo algum barulho frio no bolso do casaco e a cada passo eu sinto toneladas sobre os ombros, meu pescoço fica tenso e os cabelos caindo e voando sobre o rosto não são de grande ajuda. Caminho sem olhar para os lados e prestar atenção em nada quando sinto o impacto de colidir com... alguém? Levanto os olhos e lá está Hardin Scott, com uma jaqueta preta e um olhar de preocupação, esperando em frente a farmácia.

- Olha por onde anda, caralh... Anna? - ele fala, surpreso ao me ver.

Vejo de relance meu reflexo no vidro espelhado da farmácia e... estou deplorável.

- Ah, Scott - digo, sem animação na voz - oi, desculpa bater em você. - termino a frase com menos animação e mais vergonha do que comecei.

Seu rosto está fixo em mim, ele analisa minhas feições e torce o nariz.

- Ei, o que aconteceu? - ele pergunta, me segurando pelos cotovelos.

O choque de suas mãos geladas em meus cotovelos me faz ficar tonta.

Hardin.

Ela está pálida, cara de choro, seu nariz está vermelho vivo, seu típico rosto de choro. Os cabelos loiros brigando com o vento em choque no seu rosto e os dedos finos tremendo. Não se parece em nada com a beleza confiante que mostrara da última vez que eu a vi.

Dou uma última checada pra ver se Tessa respondeu a mensagem com o nome do seu anticoncepcional que vim comprar e guardo o aparelho no bolso.

- O que tá rolando, Anna? - pergunto, com a boca seca.

Ela olha pra baixo e desvia o olhar, desviando também a mente da pergunta.

- Nada especial. - ela diz, seu tom de voz é seco.

After AnnaOnde histórias criam vida. Descubra agora