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Ruggero

— Me recuso a conversar com você nesse estado — digo, me
levanto e vou em direção à escada.
Ela se levanta desesperada e começa a golpear minhas costas,
gritando sem parar:
— Solte meu filho. Você acabou com minha vida, e eu não vou
deixar…
— karol ! — Viro e dou um grito de advertência. Bernardo está
chorando muito. — Cale-se, vamos encarar isso como adultos. —
Entrego Beni para ela e digo: — Acalme ele e tente se acalmar
também. Depois eu vou conversar com você e explicar tudo.
Não espero resposta e saio da casa rumo à área da piscina.
Não sei quanto tempo nadei. Só sei que foi quase à exaustão.
Nem me importei com um possível enfarte, sei que comigo é quase
impossível, afinal sou quase um atleta. Mas me esforçar tanto por
puro estresse pode resultar em algo grave.
Saio da piscina e me deito na espreguiçadeira para descansar.
Karol  está arredia e muito furiosa. Vai ser difícil amansá-la, se
é que eu vou conseguir isso.
Foi errado eu ter mentido, foi ruim eu ter feito os truques dos
contratos e vai ser difícil ela engolir tudo isso, mas vai acabar
aceitando. Se ela se deixar entender, vai saber que eu fiz pelo meu
filho e que nada vai mudar entre a gente.
Lembra quando eu prometi a mim mesmo que jamais usaria o
contrato contra ela? Menti. Pois é, me desculpem, sou humano, e ser
humano tem essa capacidade. Se ela surtar de algum modo, terei que
ser um babaca e calar a boca dela com o contrato. Essa é minha
carta na manga.
Me levanto depois de bastante sol na cara, visto a bermuda e 
vou ao encontro da fera.
Como já passou bastante tempo, uma hora mais ou menos, eu
sei que karol  já deve ter tempo para pensar sobre o assunto. E,
quando entro na casa, minha suspeita é confirmada. Ela está na sala,
sentada de cabeça baixa e com os dedos enfiados nos cabelos.
Escolho uma das poltronas e me sento. Imediatamente, karol
levanta a cabeça e me fita. O ódio expresso nos olhos é medonho.
Ela limpa as lágrimas e rosna:
— Me diz que é uma brincadeira.
Fico calado. Ela também não fala nada, continua com os olhos
fixos em mim sem piscar. O silêncio continua por minutos a fio, até eu
ter as palavras certas para começar.
— Eu descobri por acaso que carolina  teve um bebê — começo a
falar, e karol  desaba em um pranto doloroso, pois esse início foi a
comprovação de que não é uma brincadeira.
Finjo não me importar e continuo. Agora tenho que ir até o fim.
— Eu não sabia o que fazer de imediato, apenas queria ver meu
filho. Porra, eu descobri de uma hora para outra que era pai e tive
vontade de conhecer ele, pelo menos. — Suspiro e mais palavras
vêm à minha boca. — Mas você já deve saber que sua irmã é
maléfica. Ela arquitetou tudo muito bem e recusou-se a contar mais
detalhes. Eu nem sabia se era menino ou menina. Só sabia que ele
tinha sido adotado, e eu jamais vou perdoá-la por ter se desfeito tão
rápido do meu filho, como se ele fosse um nada. Desprezou
totalmente nossos laços consanguíneos — paro de falar e espero a
reação dela. Karol  limpa as muitas lágrimas e levanta o rosto para
me encarar. Sua expressão carregada chega a ser incomoda.
— Então decidiu ir enganar a irmãzinha burra? — Ironiza, se  autodepreciando. Ela deve estar com muita raiva dela mesma, pois
apesar de todos os esforços, não pode se manter longe do pai do
bebê.
— Não. Eu não sabia com quem estava o bebê. Eu nem sabia
como agir, eu só queria beber e chorar. Então, meu irmão teve uma
ideia. Nós invadimos o apartamento de Carolina , plantamos uma
escuta e mandamos um advogado pressioná-la. A ideia era que, se
ela conhecesse a família que adotou meu filho, ela ligaria para eles
assim que o advogado saísse. Dito e feito. Ela ligou para você, e foi aí
que coloquei todo o plano em ação.
Karol  solta um exalar e, decidida, fala:
— Quero o divórcio. — Ela se levanta, cruza os braços e me
encara ameaçadoramente.
— karol !
— Quero o divórcio, porra! — Berra exaltada — Seu desgraçado
imbecil! Acha mesmo que eu quero passar mais um segundo ao seu
lado? Eu não te conheço, eu não sei quem você é.
Ignoro os gritos dela e continuo manso, ou melhor, tentando me
controlar e ser manso. Agora, eu preciso ser o Ruggero  consultor
financeiro. Vou encarar tudo como negócios, para ter mais eficiência.
— Eu não podia ir atrás de você com processos e advogados.
Assim como a safada da sua irmã garantiu a lei a favor dela, eu
também me garanti. — Me levanto, pego a bolsa do notebook e tiro
de dentro um envelope. — Bernardo é meu filho agora. Eu não vim
como um amador jogando de olhos fechados, eu trabalhei duro para
conseguir o menino para mim. — Abro o envelope, tiro um papel, olho
e entrego para ela. — Fiz um teste de DNA e, com a procuração que
você assinou, eu assumi a paternidade dele. Aí está a nova certidão.
Ele, agora, tem um pai legítimo em todos os âmbitos legais. E, como
pode ver, tenho direitos sobre ele de agora em diante.
— Tinha! — ela grita e, furiosa, rasga o papel em vários
pedacinhos.
— Isso é uma cópia, lógico — eu aviso, tentando não ser cínico.
— Não importa o que você planejou. Karol  tinha toda a razão.
Você é inescrupuloso, calhorda, um playboy mimado que sempre teve
tudo aos seus pés — karol  insulta aos gritos totalmente
descontrolada, dou um desconto, afinal ela está em estresse
profundo. — Pois fique sabendo que eu não me curvarei a quem quer
que você seja.
Meus punhos cerram de raiva.
— Você é apenas tia dele — perdendo minha paciência, eu grito
quando ela vira as costas e vai correndo para a escada. Sei que foi
maldoso, mas necessário. Karol para e me olha espantada. — Isso
mesmo, legalmente é mãe, mas ele tem o meu sangue, saiu de mim e
você não decide nada.
— Decido. Eu não ficarei nem mais um dia ao seu lado —
Karol  retruca a plenos pulmões e uma enxurrada de lágrimas
recomeça. — Você me fez te amar, acabou com meus sonhos, com
minha vida. Eu amei um covarde, um maldito egoísta.
— Egoísta é quem quer manter um filho longe do pai. Você iria
criar meu filho com aquele merda do Renato educando-o. Um dia
você daria um padrasto a ele, e Deus sabe o que iria acontecer. Eu
fiz, não me arrependi e faria tudo de novo.
— Sim, eu não duvido que faria. Vindo de gente do seu tipo…
Antes de ela terminar, eu a alcanço e seguro forte no braço dela.
Com olhos queimando de rancor, eu sopro uma indagação feroz:
— Que tipo, karol ? Um homem que se importa com o filho?
Eu cresci em um lar onde meu pai me amou, minha mãe quis os
filhos, não saiu por aí dando bebê pra qualquer um. Eu fui educado
para dar valor aos laços familiares e achava que você também era
assim.
— Você não me conhece, eu não te conheço. — Puxa o braço
da minha mão. — Vamos acabar com essa palhaçada. Quero o
divórcio.
— Então deixou de me amar de uma hora para outra?
— O cara que eu amei nunca me apunhalaria dessa forma,
nunca faria isso comigo.
— Eu sou o mesmo, karol . Eu provei a você o tanto que eu te
quis e ainda quero. — Em um tom mais calmo, porém ainda sério, eu
falo: — Por favor, me perdoe. Eu sei que eu errei, mas…
— Perdoar? Tem noção da merda que você fez? Tem noção de
como você agiu criminosamente, falsificando documentos, enganando
a todos e a mim por causa de um…
— Não ouse falar em capricho — eu grito, apontando um dedo
ameaçador para ela. — Isso tem a ver com o que sua irmã roubou de
mim, é uma vida, uma pequena vida da qual não vou abrir mão, você
querendo ou não.
— É o que veremos.
Ela fala e sobe as escadas correndo. Eu vou atrás e, chegando
lá, ela está pegando as malas e jogando roupas dentro sem nem
dobrar ou ajeitar. Karol  está transtornada, como se estivesse
possuída.
— Meu irmão está chegando. Você e Bernardo vão embora com
ele. Eu irei no meu carro — apenas aviso e saio.

Minha perdição   (Terminada )Onde histórias criam vida. Descubra agora