14 - Jantar

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Davi

Eu só consegui voltar a respirar quando demos alguns passos para longe daqueles policiais.

Ainda não estava acreditando que meu irmão Cadu acabara de sofrer racismo bem na minha frente.

Meu sentimento era de revolta e ao mesmo tempo de extrema tristeza.

E em meio a vários palavrões direcionados aquele policial racista de merda, eu só conseguia pensar no quão fútil é uma pessoa que julga outro pela cor da sua pele.

Cadu estava com tanta raiva que estava andando na frente, e nós tentávamos acompanhar seus passos, até que chegamos na pista de skate que fica de frente pro bar do Cleitin e o ele parou de andar.

Ele estava com a respiração ofegante.

Ainda não tinha dito nenhuma palavra desde que saímos de lá.

— Cadu, se quiser denunciar aquele merda, meu tio é advogado, ele pode te ajudar, como ajudou o PH daquela vez. —Vitinho disse também ofegante, porque estávamos praticamente correndo pra alcançar o Cadu.

Cadu respirou fundo umas três vezes, antes de se sentar no chão da pista.

—Eu não posso denunciar aquele cara... Não tenho provas concretas. Não tenho um vídeo que comprove o que ele fez.
Nenhum juiz vai acreditar em mim. Vai ser a minha palavra contra a dele —Cadu finalmente disse.

Ficamos em silêncio.

Talvez ele tivesse razão.

O que a palavra de vários adolescentes valeria pra essa nossa "justiça"?

Sentamos todos ao lado dele.

—É a primeira vez que um policial faz isso com você? —perguntei.

Cadu deu uma risada sem humor.

—Já aconteceu algumas vezes, mas antes eles sabiam disfarçar o racismo melhor. Esse cara só faltou dizer que eu roubei o IPhone. Ele sequer revistou vocês que são brancos. Davizinho, você também tem iPhone, por que será que só eu tenho que andar com a nota fiscal pra comprovar que eu comprei?

—Isso é um absurdo mesmo, cara. —eu disse.

Além de ter sido revistado, foi pedido a nota fiscal do celular dele... Sendo que no meu cotidiano, é inimaginável andar com uma nota fiscal no bolso, mas pro Cadu.. parecia rotina ter que provar que é honesto.

—Eu ainda acho que a gente tem que denunciar esse merda. —João disse.

—Meu pai sempre me disse que por mais que o preço do meu tênis pague o salário de um desses policiais racistas, eu não deveria responder a altura, porque a minha vida vale mais que isso... Mas eu tô cansando da minha cor ser considerada suspeita.
Cansado de ter medo toda vez que eu esquecer minha identidade quando saio, e cansado de mais uma vez não poder fazer nada.

—Você tem certeza que não quer denunciar esse cara, mano? —Vitor perguntou.

—Vitinho, o cara é policial provavelmente há muito tempo, os colegas que estavam com ele provavelmente são racistas que nem ele, porque me olharam como se eu fosse um bandido.
Eu não tenho vídeo, nem áudio, e nem nenhuma outra prova que incrimine ele, e por mais que vocês estejam ao meu favor... Foi implícito. Ele somente insinuou, não disse em palavras que sou ladrão. E o máximo que eu conseguiria é uma "bronca" da justiça por ele ter se referindo a mim como "neguinho".
Eu agradeço, de coração, que vocês queiram me ajudar, mas agora não há o que fazer, não se preocupem que essa guerra está longe de terminar.
Eu vou pra casa, falo com vocês mais tarde. —Cadu se levantou e saiu.

INSANOS - Sequência Imperdível de Maria MachoOnde histórias criam vida. Descubra agora