20 - Jantar - Parte II

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- Desculpa por ter invadido o quarto de vocês, eu só queria o blazer.

- Vamos esquecer o que aconteceu - diz enrubescendo - pra sempre!

- Obrigada.

- Pelo o quê, o jantar?

- Não, por ter escolhido minha mãe. Por não ter ouvido eles - e indico meus avós com o queixo - e pelas minhas irmãs! - respondo e tomo mais um gole. Thomas olha para mim abismado, me puxa e me dá um beijo na têmpora direita – tá bom, não vai me ficar meloso que eu retiro o que disse e vou ficar com o cubo de gelo Britânico! - Sorri e me empurra.

Voltamos para a sala e fico pensando como foi sua vida naquela casa gigante com duas pessoas emocionalmente distantes, meus pensamentos são interrompidos por meu estômago que começa a roncar. 

Tô com fome, mas minha avó insiste em mais uma música, está ensinando ao namorado da Aretha a dançar, nesses momentos até parece uma pessoa legal. Aika pede uma dança ao pai que aceita e pede perdão por não ter oferecido imediatamente, Thomas o gentleman.

Na hora do jantar escolho a cabeceira esquecido de que hoje sou um par, mas Aika senta-se ao meu lado direito e tomo sua mão, fuck I need sex (1). Devia ter aproveitado o momento que ela tava encantada com minhas facetas e perguntado se não queria terminar a noite me cavalgando, porra, como eu preciso de sexo. Preciso tirar a Olívia da cabeça. 

Thomas ajuda minha mãe a trazer a comida para a mesa e percebo que minha garota não tira os olhos dos dois.

Fernando puxa conversa com Aretha e sua mão procura a do namorado, deveria ter me sentado ao seu lado, ela fica nervosa com nossos avós por perto. Aretha usa no afro um lenço de cor laranja, presente meu, acho que dei nos seus 15 anos, custou uns trocados na Liberdade, mas adorou e cuida com muito carinho.

Aretha é magra, seios grandes, os olhos de mel, boca fina, nariz pequeno, uns dreds espalhados pelo cabelo, mistura de senhora perfeição com garota descolada, não sei se fica excelente, mas se tem alguém capaz de ficar incrível de qualquer jeito é minha mana. Há quanto tempo tá com esse cara, meses? Preciso trocar uma ideia com o jão e me certificar que as intenções são boas.

- You are offly quiet tonight, dear, is there something on your mind (2)? - a vó pergunta olhando para mim.

- Not enough sex, I'm guessing (3)! - minha mãe diz de boca cheia e sorrio. Mum you are right, as always (4). A sogra faz cara de escandalizada e meu avô esconde a boca no guardanapo porque está sorrindo.

- Your accent is still bad, I see (5)! - a velha alfineta.

- Actualy my accent is fine, fuck you - meu pai engasga - I mean thank you (6)! - Ati corrige desafiadora e bebe da taça de vinho.

Minha avó e mãe trocam olhar digno das conferências climáticas. Vi toma a direção da conversa, como para aliviar a tensão, explica que sabemos fazer algum sotaque inglês com excelência, fato, fiz questão de aprender a reproduzir o sotaque jamaicano, fiz de zoeira, claro, mas levo jeito para imitar. A comida é boa e enquanto todos comem educadamente a mamãe come quase tudo com os dedos e eu como um descamisado.

Aika come devagar, meu pai conversa, mastiga, bebe, entretêm os convidados como excelente anfitrião que é. Como pode? tem no bolso a calcinha de renda da esposa, os dois trocam olhares e sorrisos, mas em nada a cena que presenciei no quarto transparece.

 Ati recebeu convidados, conversou, dançou, ataca um bifão na frente da sogra e tudo sem roupa debaixo, mas agem normalmente quando eu nem consigo mentir, porque sou transparente e dou chilique no flat alheio.

As palavras ecoam na minha cabeça, os trejeitos, a voz rouca e sexy, em nada aquele homem é igual ao maluco que me deu uma sova no tatame, que passa café amargo e me serve dando um beijo na minha têmpora.

Em nada esse é o pai que trança, com carinho, os cabelos das filhas ou que fica envergonhado de ir à sorveteria sem camiseta. Como alguém pode ser assim, vários em um só? Ele é um homem diferente em cada situação e eu o mesmo idiota transparente 100% do tempo. Não é justo! Não é justo que ele tenha me dado a aparência, mas não a habilidade de ser vários.

O jantar acabou, as visitas foram embora e punheta nenhuma me fez relaxar. Visto o calção e vou para o estúdio, coloco Pearl Jam porque o mood (7) tá pedindo, nada melhor que grunge em momento de confusão. Coloco as luvas, desde que cheguei a Brasília até meu equipamento de treino parece intocado, começo com alguns jabs para aquecer, bato no saco me questionando se é bom ou ruim ter pais tão perfeitos.

Os dois se adoram, sempre sabem o que dizer, pensam antes de falar, enquanto eu falo pelos cotovelos e meto o pé na merda. 

Seguros, tranquilos, sabem de onde vieram, onde estão e para aonde vão, aposto que sempre foram assim, mais do que isso, sou filho da Ati Furquim, a universitária fodona que peitou PM na rampa do congresso, que aos 17 anos preparou os pais para serem cremados, enquanto eu sequer consigo gritar com uma mina no telefone sem antes encher a cara e passar vergonha.

Esmurro o saco sem saber como a música muda, Rage Against The Machine toca e não lembro de ter colocado os caras na playlist. Tento algumas joelhadas e voadoras, bater é bom, chutar, esmurrar, sentir as forças do corpo canalizadas para alguém ou alguma coisa.

Porque ela não me ligou? Porque saiu com o palmeirense desgraçado como se eu não significasse nada? Quem faz isso? Ando ao redor do saco imaginando a cara do palmeirense. Será que transou com ele? Ela não faria isso, faria? Quando imagino suas mãos porcas na pele macia e rosada da italiana meu sangue ferve.

The best fucking head I ever got it, fuck the girl is hot. She should be my girl. I should pack my shit, catch a plain, take her to our place and make love to her, sweet love on repeat. Wait... what? Make love? What has she done to me? I mean fuck, I should fuck her brains out!

I should have tasted her, I bet she is salt and slightly sweet, the way her skin is, she has such a tender neck, silky lips, I should go and fuck her until she apologizes for leaving me for that fucking peace of shit, an asshole, really. It is my fault, I should had just rough off the bastard and scared him way from her. Twisted his neck until de sound of death comes. I hate him, I hate her, I hate her. Every moment, every single moment I am thinking about her, day dreaming like some loser (8).

- Esmurrar saco de pancada tá no sangue, mas falar sozinho é novidade.

1350 palavras

* O mágico de Oz.

Tradução:

(1) Porra, eu preciso de sexo!

(2) Querido, você está estranhamente quieto, alguma coisa te incomodando?

(3) Falta de sexo, eu acho!

(4) Mãe você está certa, como sempre.

(5) Seu sotaque continua ruim, eu percebo.

(6) Na verdade meu sotaque é ótimo, vá ser foder, quer dizer, obrigada. (a piada é porque em inglês o som das afirmações soa parecido: fuck you, thank you).

(7) Clima.

(8) O melhor sexo oral que já recebi, porra como é gostosa. Ela deveria ser minha garota. Eu deveria fazer minha mochila, pegar um avião e levá-la para o nosso apê e fazer amor, doce e carinhoso, várias vezes. Espera... o quê? Fazer amor? O que ela fez comigo? Quero dizer foder, eu deveria foder a garota. Eu deveria prová-la, aposto que é salgada e delicadamente doce, como sua pele, tem o pescoço tão macio, os lábios sedosos, eu deveria ir e foder até que me pedisse desculpas por me trocado por aquele merda, um idiota. Isso é minha culpa, eu deveria ter dado uns tapas no filho da mãe e assustado ele para longe. Ter torcido seu pescoço até que morresse. Odeio ele, odeio ela, odeio ela. Toda hora tô pensando nela, sonhando acordado como um idiota.


FredOnde histórias criam vida. Descubra agora