(41) - Aqueles Que Foram Esquecidos

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"Eram tempos quase imemoriais, quando perfurávamos ossos de animais para que servissem para criar música com o sopro; quando instrumentos de cordas eram sofisticados demais; quando a estrutura tribal se consolidava entre chefes guerreiros e suas caçadoras, e os xamãs com suas adoradoras.

No prelúdio, anterior à Primeira Era, havia uma besta negra que nos caçava na penumbra, nos predando como crias indefesas. A impiedosa Endamyan ergueu-se contra o massacre causado pela fera, e com sua bravura nos ensinou o valor da coragem. Ela abateu o algoz, libertando do ventre da besta a personificação carnal de Nhãmrú. Essa por sua vez negou o título de Nhãmrú, alegando ser nada mais do que o caminho para a Aura. Essa criatura misteriosa trouxe Nyranuai de Yangá'ráv, o plano espiritual e dimensão dos mortos, que havia sido morta pela besta negra. A personificação recebera muitos nomes e quando ela aprendeu nossa língua, escolheu um deles entre vários. Assim essa figura mítica, uma lunno pura, ficou conhecida entre os awbhem como Sý'Einna.

Sý'Einna tomou Endamyan como sua primeira Discípula e Nyranuai como a segunda. Após isso, peregrinou com elas por toda Gállen primitiva, forjando alianças com as seis tribos maiores, escolhendo uma nova seguidora para cada localidade. Existem contos épicos, misticismo e erudição em torno da origem e escolha de cada uma, mas não os abordarei nesse pergaminho por se tratar de um tema muito extenso. É importante observar que as seis discípulas então formaram um elo poderosíssimo entre os povos e Sý'Einna, tornou-a a Matriarca.

Compreendas, leitor, o limiar das lendas épicas e dos fatos históricos se entrelaçam aqui. Tanto a Matriarca quanto as Discípulas aceitam as lendas como verídicas, o que pode ser verdade por mais incrível que elas se apresentem. A besta negra derrotada por Endamyan é tanto uma metáfora quanto uma fera literal (...) Em meus estudos, após ouvir várias vezes os relatos delas próprias, cheguei à conclusão de que tal criatura era uma divindade selvagem das Eras Esquecidas, pertencente aos primeiros seres vivos com elos intrínsecos com a Aura. Entretanto, o surgimento de Sý'Einna do ventre da besta morta é bem mais difícil de entender.

Louvada seja a Mãe Não Nascida."

- Relatos históricos, por Idásios, Arquimago enakân e Segundo Prelado


HORAS DEPOIS, quando Wym'rú começava a queimar em tonalidade avermelhada, indicando que não tardaria para se ocultar no horizonte, a armada estacionou no coração do arquipélago, onde havia três ilhas principais, sendo as das bordas alongadas fazendo grandes baías e a interna de praias mais convidativas. Quando a nau capitânia desembarcou suas tropas na ilha destinada, viram que poderia tomar um bom tempo para vasculharem toda ela, sendo a mata depois do golfo densa e alta.

Botas afundavam centímetros na areia branca macia, perturbando os minúsculos animais marinhos que ali sempre viveram, que cavaram buracos novos e desaparecendo. A unidade de guerreiros formada da guarda pessoal dos capitães era poderosa, capaz de tomar até um povoado murada e guarnecido, se bem coordenado, o que a almirante sem dúvidas conseguiria se planejasse. Era a primeira vez que o grupo vira Ákera atuando em campo como uma mandante de infantaria.

A armadura de Wanäe era incrivelmente diferente das demais. As placas e malhas dela eram feitas para cobrir cada trecho de seu corpo, tanto nas laterais quanto na retaguarda. As manoplas eram grossas como a bota, sendo capazes de amassar uma barra de metal com um soco. Uma guardiã não era feita para atuar como um soldado de fileira, mas como uma campeã, que agia sozinha por meio das legiões, cobrindo trechos específicos e avançando sozinha. Diferente da proteção dos guerreiros da armada, que deixava uma parte considerável das coxas e braços desprotegidos — apesar dos saiotes e braçadeiras —, pois dependiam de uma formação em grupo para ganharem defesa de seus parceiros.

Quinta Lua (Ýku'ráv)Onde histórias criam vida. Descubra agora