(67) - Batalha de Akanea

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"Pensadores questionam há Eras a totalidade que nos cerca. Cálculos nos dão visão das engrenagens de nosso mundo, trazendo eventuais respostas, porém mais perguntas.

Os magos enakâns persistiam em uma postura mística rigorosa para muitos assuntos, não que sua filosofia conservadora atrapalhasse na cooperação com os demais estudiosos. De todos os mistérios que me deparei, um em especial me atormenta. É uma questão que os enakâns costumavam usar de argumento para mostrar como nada sabíamos e como o mundo continuaria a ser um mistério, mesmo após o dia em que cada grau de areia tenha sido documentado e estudado.

Sabemos que Zyshuth cunhou o Calendário sob os ciclos dos vivos. Ciclos esses que são regidos essencialmente pelos astros. Podemos prever eclipses entre luas e entre o sol; a conjunção de fases; a luminosidade lunar de cada noite que virá durante o milênio; mas o mar e a imensidão oceânica jamais respeitaram tais regras, ao menos com nenhuma exatidão conhecida.

Os mesmos precisos cálculos nos dizem que as luas deveriam exercer uma força descomunal sobre o véu aquoso do mundo, com ondas colossais e mares oscilando bruscamente, tornando a vida nas praias insustentáveis, em que portos seriam impossíveis e a navegação inviável. Deveríamos estar presos em planícies elevadas e temendo a fúria do mar.

Porém, vos escrevo da proa de uma nau ancorada nas praias de Éloin, onde as ondas são mansas e agradáveis, e os animais se juntam às praias para seus ritos de acasalamento.

Esse mundo fez-se estável de um jeito ou de outro, e os únicos que concebem a dimensão dessa anomalia e continuam sem se inquietarem são justamente os enakâns. Estes movem o solo, as águas e os ventos com a mente, então percebem o poder que as luas teriam sobre o mundo, pois eles as sentem cada qual como uma própria Força.

Estes são os sábios mesmo sem conhecimento, os eruditos que explicam sem entender. Eles não necessitam de nossos cálculos, mas necessitamos do conforto que só as palavras encantadas deles oferece.

A calmaria do inexplicável é tão assustadora quanto o caos desvelado."

- Rimanesh


MUITOS OLHOS voltavam-se à cidade que caía, então o vulto esgueirou-se pela praia da montanha e circundou a ilha oculto sob o véu do mar. Os ecos da guerra se distanciavam na água mansa. A urgência lhe trazia pressa e movia-se o mais célere que podia sem perder a discrição. Ankrat contornou Akanea tendo certeza de que não fora notado.

A face não povoada da ilha era íngreme e se revestia de vegetação verde de tons azulados vivos que se alongava até o cume. Aos pés das costas do monte solitário não havia praia, somente uma baía murada por rochas lisas que fora encoberta por uma densa névoa.

A montaria marinha obedeceu ao seu dono e emergiu das águas e Ankrat trouxe o torso para a superfície. Nem onda ou vento, só a brancura intransponível.

O anvu a qual montava lhe levou ao interior da baía desolada. A sensação era de entrar em uma zona morta na aura, totalmente esquecida e desértica, ao menos era o que seu instinto lhe contava. Ante seus olhos, a silhueta de madeira se fazia visível quando já estava a dois metros e continuou o percurso. Outras estruturas surgiram conforme avançava até que ao meio do cenário que tinha em mente localizou o que buscava e escalou.

Seus passos na proa fora o som mais alto gerado na costa da montanha nas últimas horas. Ele ignorou a perturbação sonora que sua presença causara e cruzou a gigantesca nau até encontrar um dos oficiais. Ankrat saudou o sothe que estivera de pé em seu posto há horas dizendo trazer uma mensagem de extrema urgência. O comodoro assentiu e o conduziu até a cabine. Durante o trajeto, vira sacerdotisas da casta templária espalhadas pelo navio em estase meditativa e sabia que o mesmo ocorria nos demais barcos da Armada das Luas.

Quinta Lua (Ýku'ráv)Onde histórias criam vida. Descubra agora