(60) - Saqueadores

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"Ingrata, tal a renegada da tribo. Amante sedutora. Generosa e vingativa como uma Mãe. Essa é Endra, o leito tempestuoso, refúgio de muitos.


A Éloin é fronteira.

A Gállen'thir é caminho.

A nós, é dádiva."

Ákera, a Libertadora


A RODA de piratas se fechava. No meio, dois mercenários do mar trocavam socos e joelhadas sem efeito. O homem era forte e tinha um porte grande, e o outro era uma sh'hila, delgada, porém ágil.

A capitã corsária urrou em empolgação, junto da tripulação, ao ver o punho pesado acertar o ventre da fêmea que perdia velocidade ante o cansaço. Ela cambaleou, aturdida, sem cair. Contando com a vitória que viria em seguida, o humano levantou os braços e soltou brados de empolgação virando-se para os companheiros da roda.

Sobre a tampa do barril ao lado do mastro, moedas dividiam-se em dois grupo, e o monte de lascas do humano era o maior. Então, um saco de peças foi jogado no montante da sh'hila, virando a balança. No silêncio após o som das moedas se chocando, todos viraram-se ao barril.

— Aposto quarenta lascas na sh'hila — com bom tom, a capitã pronunciou, adentrando na aposta no final da luta.

— Sua fé nela é alta. Aceito o desafio. — Um mercenário sorriu para ela sarcástico, apostando mais lascas. Em seguida, outros fizeram o mesmo, até moedas transbordarem de um lado da tampa.

A atenção retornou aos dois do centro. Socos foram desviados e um golpe de joelho fortíssimo a acertou na lateral, quase a derrubando. Ela se afastou. Não desistiu.

Gargalhadas. Apostar era a maior distração dos piratas. Meses de poucas paradas em terra tornava qualquer disputa incrivelmente interessante.

Cansado de prolongar a contenda, o lutador lançou o punho com toda força na intenção de derrubá-la. Com as forças revigoradas ao enfim ver tantas moedas ao seu favor, a sh'hila segurou com técnica o pulso do oponente e em seguida chutou sua virilha. Ela levou o braço sem ser impedida até a nuca do homem e o atirou velozmente à madeira do piso, esfacelando o nariz da criatura que ficou desacordada.

O duelo acabou inesperadamente com uma inequívoca vencedora.

Ela caminhou demonstrando pouca dor até o barril e retirou do montante o que lhe era por direito.

— Ele está sujando o convés de sangue — disse ela. — Não é meu trabalho cuidador do perdedor, pelo que sei. — Virou-se deixando outra boa quantia à capitã, retirando-se em seguida.

Sem muita indignação, os piratas reconheceram a boa luta aos poucos.

A roda já se dispersava quando um sujeito de vestes mais cuidadosas do que a maioria dos subordinados chegou à capitã com um rosto de assombro e perturbação.

— Não estamos na rota certa. — Ele engoliu todo receio para conseguir falar e temia a reação de sua mandante.

— O quê?? — A capitã guardava seu gordo saco de moedas no traje e se conteve para não transbordar em fúria. Levou o sujeito até um canto isolado entre caixas, buscando privacidade. — Estamos a um dia de entrar em batalha e só resta nos agrupar com Surkhedon. A horas atrás estávamos na rota e agora não mais? Que tipo de navegador você pensa que é?

Quinta Lua (Ýku'ráv)Onde histórias criam vida. Descubra agora