Capítulo Três.

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   Miguel é a única pessoa que sabe das paixonites que eu tive por meninas ao longo da vida. Mas uma em específico me marcou. Eu estava no quarto ano, não me lembro o nome dela, e infelizmente Miguel também não. A única coisa que me recordo é que ela fez par comigo na apresentação da festa junina. Na época não tinha meninos o suficiente para fazer par com todas as meninas, então a professora disse que algumas das garotas não iriam poder dançar(eu estava entre elas) então a Manuela, ou pelo menos esse é o nome que eu criei para ela; me puxou pela mão e protestou para a professora com toda a autoridade que uma garotinha de dez anos tinha: "E por que as meninas não podem fazer par com outras meninas?" "eu danço com a Agatha".  Na hora a professora discordou e disse que a quadrilha é feita em 'casais' de meninas e meninos, mas Manuela não desistiu e insistiu na sua ideia. Até que, convencida pelo cansaço, a professora permitiu que dançássemos com outras garotas. Manuela foi meu par, e no dia da festa ela elogiou meu vestido, devolvi elogiando suas lindas botas de montaria. Foi à primeira menina que gostei, passei o ano todo apaixonada por ela, e a única pessoa que sabia disso era Miguel, que nunca me julgou ou disse que era errado. Apenas ficava me provocando com piadinhas e sempre que tinha a oportunidade cantava "é o amor" quando eu estava perto da Manuela. Não sei o que aconteceu com ela, talvez tenha mudado de escola ou de cidade. Não tem como saber.

                           ☆☆☆ 

   — Cheguei! — Gritei ao entrar em casa.
Isadora está sentada no sofá assistindo algum desenho que eu não consigo identificar.
— Oi Agatha — diz ela, — quer assistir The Owl House comigo? 
— É sobre o que? — pergunto.
— Uma garota que vai parar em um mundo encantado e passa a viver com uma bruxa, aprendendo magia e vivendo aventuras! — diz Isa empolgada. 
Me sento no sofá junto com ela e vejo seja lá qual episódio é esse. Depois de alguns minutos ouço minha mãe gritar da cozinha. 
— Agatha! Me ajuda aqui, por favor. — Grita ela.
    Levanto e vou até ela, deixando Isadora sozinha assistindo sua bruxinha bissexual que tem uma namorada emo ( não me pergunte como descobri tudo isso em apenas um episódio).
— A senhora precisa da minha ajuda? — pergunto, me escorando na parede.
— Tenho que consertar essa torneira, mas estou com um arroz no fogo, você pode ficar de olho pra mim? 
Faço que sim com a cabeça e vou em direção ao fogo. Quinze minutos depois o arroz fica pronto e minha mãe chama Isadora para almoçar. 
   Almoçamos em silêncio, nunca tive o hábito de contar como foi meu dia para minha mãe, na verdade eu nunca conto nada para minha mãe. Na maior parte do tempo eu a vejo como uma estranha. Minha mãe é uma moça gentil(ou pelo menos tenta), mas tem pensamentos contrários aos meus então não conseguimos manter uma conversa sem começar uma discussão. Além do fato de não sermos nada próximas. Subo para meu quarto a fim de tirar um cochilo, fui dormir muito tarde e acordei muito cedo, ou seja, estou morta! 
    Deito na cama e reflito sobre meu dia, penso na menina dos cabelos rosa que encontrei no mercado e em como seus olhos eram profundos… mas logo sou tirada dos meus pensamentos quando escuto alguém chamar na porta
Céus! Todos os meus pensamentos serão interrompidos hoje?! 
   Espero deitada para ver se alguém vai atender, ninguém vai. Então aos resmungos, me levanto. Desço as escadas e olho para a sala onde encontro minha mãe cochilando no sofá, passo por ela e abro a porta. Uma menina ruiva de cabelos trançados está lá. 
— Posso ajudar? — Pergunto. 
— Eu vim entregar os livros…— A garota se silencia, limpa a garganta e parece rebobinar. —  Sim, é, a professora pediu que eu entregasse. — Disse a garota, parecia ter dificuldade para formar frases.
Mas antes que eu possa dizer algo, Isadora passa por baixo do meu braço e arranca os livros da mão da menina
— Obrigado pelos livros Ana, muita gentileza sua. Uma pena não poder te chamar pra entrar agora, muito trabalho. Sabe como é, né? Até amanhã! — Então fecha a porta com força.
   Me viro para Isadora, completamente confusa.
— Isso é jeito de tratar a menina? — repreendi. — Que diabos deu em você?!
Isadora fica vermelha, e então sobe apressada para seu quarto, me deixando sozinha antes que eu consiga questionar mais. Reviro os olhos e subo de volta para o meu próprio quarto, decidindo ignorar as loucuras de Isa, não tenho cabeça para isso agora.

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