Prólogo.

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      Era uma daquelas noites frias e chuvosas. Aquele tipo de noite em que tudo parece mais escuro e o ar se torna húmido. Não gostava dessas noites, os barulhos da chuva batendo contra o vidro me assustava, eu tinha medo das paredes da casa desabarem ou de algo surgir dos cantos escuros.
    Mamãe, papai, e eu sempre fomos uma família feliz, todo domingo íamos ao parque para fazer piqueniques e caminhadas. Papai me contava histórias de guerreiras corajosas e dragões assustadores. Ele me dizia para ser gentil e não ter medo, dessa maneira eu poderia ser o que quisesse. 
   A noite estava calma e um pouco fria, mamãe estava lendo uma história para mim, na esperança de que eu dormisse mais rápido.
— Então a princesa sacou sua espada e com apenas um golpe arrancou a cabeça do grande verme! --- Ela diz com empolgação, mas era claro a sonolência em sua voz.
— Conta mais! --- Esperneei com uma birra. 
— Já está tarde querida, você tem que dormir. 
— Mas mãe! Eu preciso saber o final.--- eu digo cruzando os braços.
— Pode saber o final amanhã, agora sem mais, nem menos, hora de dormir.
  Mamãe me deu um beijo de boa noite e caminhou até a porta. Ela parecia cansada, mas não só do tipo com sono, mas esgotada. As últimas semanas foram um pouco intensas, eu sabia que eles faziam o possível para esconder as brigas, mas mesmo com a cautela, eu conseguia escutar algumas delas de madrugada, ou até mesmo pegar no ar as ofensas veladas que eles jogavam um no outro durante o jantar. 
— Mãe, — falei, o mais doce que consegui para não a estressar mais. — onde está o papai?
— Ele precisou dar uma pequena saída, não se preocupe, ele voltará logo. 
  Esperei alguns minutos para ter certeza que minha mãe não voltaria para checar se eu estava dormindo, quando tive certeza, pulei da cama e fui até a cômoda, pegando com cuidado o pequeno livro verde que estava lá. Não me aguentava de tanta curiosidade e sabia que não conseguiria dormir até saber o final. Li algumas páginas, quando já estava imersa na história, ouvi uma voz, um sussurro que oscilava. De primeira, corri de volta para a cama, para não tomar uma bronca por ainda estar acordada, mas ninguém entrou no quarto. Tentei ouvir com mais atenção, era uma voz feminina. Juntei a coragem que tinha e decidi ir atrás. 
  Caminhei nas pontas dos pés por todo o extenso e escuro corredor de casa que levava para a sala. Fui agachada até a parte de trás do sofá, me sentei e fiquei em silêncio para ouvir a conversa.
— Como isso aconteceu? — Agora era possível identificar, era a voz da minha mãe.— Bêbado?! Isso é impossível! Ele não bebe há mais de cinco anos! — Sua voz era embargada, quase como um soluço. A voz de minha mãe costumava me acalmar, mas naquele momento, fazia cada centímetro do meu corpo estremecer.
  Me encolhi ainda mais com o som do celular sendo jogado na parede com um último grito, estridente e desesperado. Não conseguia identificar mais se era meu ou dela.

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