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Ela me contava oque aconteceu enquanto eu fazia cafuné em sua cabeça. A criança estava magoada, isso era nítido, e eu nem sabia oque fazer pra ajudar pô.

- tu vai voltar pra lá?- pergunto curioso

- eu não queria, estou cansada de ser presa sabe- ela se vira me olhando.

- mora comigo - falei de vez sem pensar

Seus olhos me olhava sem acreditar no que falei.

- não posso, isso geraria mais confusão pra mim, as pessoas iriam pensar coisas de mim- ela se deita denovo no meu peito.

- tô te falando pô, não importo oque o Zé povinho acha não, mas a proposta tá aí! Só basta tu querer- digo me levantando.

Não gosto desses papos da Ana não, tudo é "o povo vai pensar" deixa que pense pô.

- vai fazer isso?- ela se levanta de braços cruzados me olhando e eu me viro passando a mão no rosto.

- isso oque pô?

- toda vez que não gosta de algo, vai embora? Sempre vai ser assim?- encaro ela sem saber oque fazer.

- tô com a cabeça cheia Ana - digo me sentando - não gosto quando tu pensa no que o povo vai falar, bagulho chato.

- Gabriel, eu também estou com cabeça cheia, nem por isso tô descontando minha raiva em você - olho pra ela .

- mas descontou- digo e ela se lembra

- esqueci, mas mesmo assim, sei que você tá dane-se pro mundo e pra geral, mas eu não sou igual você! Imagina eu sou de igreja e tudo, aí do nada tô morando na casa do dono da favela! Já pensou nisso?

Ela nao me falou isso não né?

- a já entendi qual a tua- me levanto bolado- o bagulho é por causa que eu sou traficante né? Tu tá certa Ana, gente certinha igual você não deve se juntar com Bandido não - vou em direção a porta mas ela me segue.

- não foi isso quis dizer

- mas foi oque disse, fica Mec aí, por consideração a tu eu arrumo uma casinha pra tu ficar, ou se preferir volta pra casa da tua mãe e segue tua vida de crente e cada um pro seu lado- saio do quarto indo na varanda fumar.

A menina vem se desfazer do cara só porque sou traficante? Qual da fita porra.

- Gabriel!- nem me viro e continuo fumando meu Beck.- não foi isso que eu quis dizer cara.

...

então prova- Ana diz olhando nos fundos dos meus olhos

-como vou provar que gosto de tu?- franzo o rosto

- me mostra que tu gosta de mim, se eu ver que é de verdade a gente fica juntos - ela dá de ombros e se deita no meu peitoral.

- beleza então.

Eu não fazia ideia do que iria fazer pra provar meu amor pela Ana, eu não podia fazer muita coisa, mas podia ser fiel a ela só.

- amanhã tem baile né?- ela pergunta e eu afirmo com a cabeça- dessa vez eu vou.

-tu nem gosta dessas paradas - digo estranhando ela que dá risada.

- tenho que viver Gabriel - ela diz e se vira pra mim me dando um selinho - e tenho que tirar minhas dúvidas.

- entendi - única palavra que consegui falar quando ela se aproximou de mim.

Minha respiração já estava desregulada e meu coração acelerado, e ela ainda duvidava que eu gostava dela. Porém não podia chegar e atacar ela e beijar e fazer tudo que eu queria, até porque a Ana ainda era virgem.

- não provoca- digo baixo quando a Ana senta no meu colo e continua com o nariz encostado no meu.

Tento sair e tira ela mas ela me empurra fazendo eu cair deitado de costas no sofá e ela ainda sentada encima de mim.

- Ana....

- shiu- ela diz tapando minha boca - faz tudo oque você quer fazer a tempo.

...

Paro na frente da casa da Ana, ela desce da moto abaixando a saia e eu fico logo olhando essa saia dela.

- vou taca fogo nessa saia - digo descendo da moto também.

-tenta a sorte - Ana diz dando de ombros e indo em direção a porta pra abrir.- vai entrar?

- vou não - ela se vira arqueando a sombrancelha pra mim- tenho que trabalhar pô.

Chego perto da criança e tiro o cabelo dela do rosto, deixo um selinho na sua boca.

- volta pra jantar comigo - ela diz fazendo bico.

- pode deixar - dou abraço nela cheirando seu pescoço, deixo um beijo na sua testa e me distancio subindo na moto.
...

Dois anos depois

-ele acordou!- uma voz delicada grita fazendo doer minha audição.

- senhora podemos fazer a reportagem? Não é normal ficar em coma por dois anos e voltar a viver - umas vozes surgem e uma mulher falava não e não.

- vamos tira a entubação!- uma voz próxima diz, e eu sinto a mão quente me tocar e meu corpo levar um choque.

Eu tentava abrir os olhos mas não conseguia, eu escutava apenas por um ouvido, parecia que o outro não funciona, e doía, era uma dor fraca mas incomodava.

- Gabriel? Tá me escutando?- a voz se aproxima e eu não consigo reagir.

A mão quente toca na minha mão gelada, e a única coisa que consigo fazer é fecha minha mão na dela pra mostrar que estou vivo.

Minha garganta doía, um encômodo enorme, bagulho de nem entender oque tava acontecendo.

Eu não morri?

VIVAZOnde histórias criam vida. Descubra agora