XXXI

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Josy, te amo, essa é pra vc ❤️

Ele está bebado e com febre. Eu não sei como consigo tirar a roupa molhada do corpo dele, mas quando Alexandre sente a água morna do chuveiro, seu corpo inteiro começa a tremer. Sento ao lado dele no banho, pouco me importando se estou me olhando também. Eu o abraço do jeito que o corpo grande me permite, acaricio seu cabelo enquanto sua cabeça se apoia em meu peito.

Eu rezo o que me lembro do alcorão, uma tentativa desesperada de curá-lo. 

— Preciso falar com a minha mãe.

A voz dele é rouca e eu quase não o entendo.

— Não agora, não desse jeito. Você precisa se cuidar ou vai parar no hospital.

— Hospital não...

— Pois é, então me ajude a cuidar de você.

Eu sinto que o corpo dele vai relaxando aos poucos. Deixo Alexandre no que parece ser um cochilo e me levanto do chuveiro. Eu troco de roupa e coloco uma toalha no meu cabelo. Vou até o armário dele e pego uma roupa leve. Quando volto para o banheiro, vejo como ele está escorado na privada.

Não demora para todo aquele conteúdo tóxico sair de dentro dele. Deixo o seu tempo, espero. Quando ele acaba, me aproximo com uma toalha úmida para limpar sua boca. Eu ajudo ele se levantar, ele me ajuda a se secar. Colocamos a roupa e eu o guio até a cama, onde ele cai pesado.

— Desculpe... não queria que me visse assim.

— Melhor assim do que em um hospital. — respiro fundo para me acalmar. — Eu estava preocupada, que bom que voltou para casa. Vou pegar um remédio para febre. Você quer um chá?

— Se eu colocar qualquer coisa na boca, vomito de novo.

Eu concordo e o acomodo melhor na cama. Quando preparo para me afastar, Alexandre segura meu punho com leveza, diria até que com certa fraqueza. O olho e sorrio levemente.

— O que foi?

— Deita aqui comigo, por favor.

A essa altura do campeonato, com a chuva batendo forte contra a janela do quarto, eu não vejo alternativas para recusar. Concordo, digo para ele esperar um pouco. Vou até meu quarto, seco meu cabelo de qualquer jeito, desço para apagar as luzes da casa e falar com os seguranças explicando que está tudo bem. Quando volto para o quarto, ele já está apagado.

Deito ao seu lado devagar, mas logo sinto seus braços me envolverem, me apertarem como se tivessem medo que eu fugisse.

— Você é a única certeza que eu tenho nessa vida, Giovanna... — sinto ele sussurrar contra minha pele e concordo, tocando seu braço que me envolve.

— Sempre, Nero. Sempre.



Eu já estou acostumado com a dor de cabeça que me acomete assim que acordo. É a dor de um porre bem tomado. Como todas as vezes, eu lembro de todas as causas. Lembro de tudo que acontece antes de apagar.

Sempre, Nero.

O corpo dela é quente contra o meu, e sinto vontade de ficar aqui para sempre. Não quero encarar as verdades que me assombram. Não quero lembrar do que meu pai me disse, minha mente de criança já tinha esquecido. A dele nunca esqueceu, com ou sem demência.

— Se vai tratar o menino com desdém, por que concordou em registra-lo como seu?

— Porque me apaixonei por uma vagabunda.

— Se maltratar o meu filho, eu vou embora dessa casa para sempre. Se não aceitar o Nero como seu, eu nunca vou voltar a ser sua nessa vida.

Eu me lembro de escutar esse diálogo quando era pequeno. Foi uma das últimas vezes que vi meus pais brigando. Eu já era grande para entender o que significava, e para ignorar tudo aquilo a partir do momento que o comportamento de meu pai mudou da água para o vinho.

Eu aceitei e ignorei.

Ele engoliu seco. E como última cartada me deixou com a podridão dos negócios como se fosse a única coisa que pudesse me valer digno para ele.

— Filho da... — eu resmungo irritado já, tentando me afastar do corpo de Giovanna.

Ela, porém, aperta o braço ao redor de minha cintura.

— Está cedo para você estar xingando, Alexandre.

Eu paro, olho para ela e a vejo de olhos abertos.  Aos poucos ela vai levantando o corpo. Seu cabelo está todo amassado, só acontece quando ela seca de qualquer jeito. Meus dedos se aventuram por entre os fios macios.

— Você está se sentindo melhor? — ela pergunta, e só então percebi que parecia que um caminhão tinha passado em cima de mim.

— Um pouco de dor no corpo.

— Se juntar com a febre de ontem você deve estar com uma gripe forte.

Eu concordo, sem tirar os olhos dela. Giovanna deita a cabeça no meu ombro, sinto o corpo dela relaxar contra o meu.

— Eu tentei, tentei mesmo... mas não dá. Os dias em que você não estava aqui, eu contava a hora pra voltar. Tentar apagar esse sentimento não vai dar certo. O que você tanto fazia nessas viagens?

A voz dela parecia confusa.

— Estava desfazendo os negócios do meu pai.

Seu olhar encontra o meu novamente, rapidamente.

— É sério?

— Acabou, Giovanna. Eu não quero mais me envolver com essas coisas, a vida toda eu só quis me provar digno de um homem que nunca esqueceu que eu era só um...

— O que?

— Um bastardo.

— Nero...

Olho para o teto novamente.

A verdade recai em mim novamente.

— Não sou filho dele. Não sei de quem sou, na verdade. E minha mãe eu mal sei quem é

Ela toca meu rosto, me faz olhar para ela.

— Bom, eu sei quem você é. É meu marido, e daqui por diante nada vai mudar isso.

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