É dia de escola.É dia de escola.
Tiro as cobertas de cima de mim, desço da cama e já começo a rotina que minha mãe gosta. Tira o pijama, joga do cesto de roupas sujas. Dente, tenho que escovar os dentes. Corro até o banheiro e puxo meu banquinho para ficar na altura da pia.
Me olho no espelho enquanto escovo meus dentes, vou tentando arrumar o cabelo. Cuspo a pasta, lavo a boca, sorrio para o espelho.
Dentes limpos.
Volto para o quarto, tento arrumar a cama, mas minha mãe faz isso muito melhor que eu. Coloco a roupa que eu já tinha separado na noite anterior.
Eu gostava de dizer que era precaução. Nunca se sabe quando um monstro vai entrar na sua casa e você tem que sair correndo. Eu não ia sair correndo de pijama, não.
Quando eu estava devidamente pronto, corro até o quarto da minha mãe. Respiro fundo, eu adorava o cheiro dela. Subo na cama com certa dificuldade. A princesa ficava no alto da masmorra, afinal. Deito ao lado dela, vejo que ela já estava sorrindo de olhos fechados.
— Ah, mãe... você finge muito mal.
— Emir Can... você é muito ansioso filho. Hoje é domingo, não é dia de escola.
— Que...
De repente os braços dela me capturam como um monstro marinho e eu sofro o ataque inevitável de cócegas e beijos.
— Para, mãe! Hoje é segunda feira sim!
— Que droga! Meu homenzinho vai passar o dia fora.
Quando eu enfim consigo abrir meus olhos, parece que minha cabeça pesa toneladas. Eu sinto uma dor na clavícula que eu nem sabia ser possível. Minhas costas doem, acho que de ficar na mesma posição. Eu identifico o lugar rapidamente, era um leito de hospital. Os aparelhos apitam ao meu redor de forma irritante.
— Senhora Nero? Consegue me ouvir? — escuto uma voz feminina e olho na direção dela.
Uma mulher, uma médica, me observa com atenção.
— Sou doutora Anna, estou cuidando da senhora nesses dias.
— Dias? — minha voz sai arranhando.
— A senhora nos deu um grande susto demorando para acordar desse jeito. A enfermagem já está vindo para tirar seus sinais.
— Desculpa, mas... o que aconteceu?
— Não se lembra de nada? O que a senhora recorda?
Olho para o teto e vou repassando o que me lembro. Me lembro de estarmos no carro, escutávamos Zeynep Bastik, Nero batucava o volante animado. Me lembro de ruínas antigas que paramos para ver na estrada. Me lembro do teste de gravidez em cima da pia do banheiro do quarto de hóspedes, meu último feito antes de sairmos para viajar.
Minha mão voa para minha barriga.
— O bebê está bem, não se preocupe. Devia chamá-lo de milagre, foi um acidente feio para além dos tiros.
— Tiros? Doutora Anna, onde está meu marido, por favor.
— Senhor Nero está estável na UTI, não se preocupe, a outra equipe já está cuidando dele com toda atenção.
— UTI?
Eu tento me levantar, ao menos na minha mente parecia mais fácil, mas meus músculos não obedeciam a comandos. Uma enfermeira aparece na porta do leito, chama a médica e ela se afasta de mim, me deixando confusa, perdida. Antes que eu pudesse chamar alguém de novo, Omar aparece na porta. Eu sinto um enorme alívio.
