XLVIII

299 33 21
                                    


Eu acordo no conforto dos braços dele. Nossos corpos tão colados que parecem um só, sua mão acariciando meu cabelo devagar, suavemente como o barulho do lado de fora do hotel. Parecia um sonho estar aqui, parecia um sonho ter me rendido as minhas vontades mais sufocadas dos últimos anos.

Eu deveria ter esquecido.

Mas não esqueci, e a prova era essa aqui.

Deixo minha mão percorrer por seu braço, e aos poucos ele vai me apertando mais contra seu corpo.

— Bom dia...

Acordar com a voz rouca dele era uma das minhas maiores saudades. Levanto a cabeça o suficiente para olhá-lo.

— Bom dia.

— Arrependimentos?

— Adiantaria falar que sim?

— Mentir é feio, você sabe.

Balanço a cabeça em negação, escondo o sorriso. As vezes acredito que a aparição de Nero em minha vida era para me tirar as certezas.

— E agora, Alexandre?

Minha pergunta chega aos nossos ouvidos sem acusação nenhuma. Era a mais genuína dúvida. O que faríamos agora? Negar o óbvio? Agir como se nada tivesse acontecido? Éramos adultos, tínhamos um filho, e nosso casamento não acabou por falta de amor, e sim por algo maior que nós dois. Não passei a odiar Alexandre da noite para o dia, eu preferia alimentar aquele sentimento. Era uma escolha, amá-lo, porém, era inconsciente.

— Honestamente? Não sei, meu bem. — Ele acaricia meu rosto e eu fecho meus olhos, apreciando o carinho.

— Senti falta de ser chamada assim. — confesso.

Ele sorriu, contemplando meu rosto. Nossos olhares não se desgrudaram, era como se tentassem recuperar o tempo perdido.

— Eu nunca te perguntei o que aconteceu depois que eu fui embora... Quero dizer, as meninas me falaram sobre o processo.

— Depois que eu saí do hospital eu fui direto para a delegacia. Obviamente fui preso pelos erros do meu pai que acabei compactuando. E entreguei tudo o esquema do Hakam.

— Realmente fez isso então.

— Eu poderia resolver com minhas próprias mãos, mas me resultaria anos demais na prisão. Decidi confiar na justiça.

— E deu certo?

— Claro que não. Enquanto eu paguei tudo que devia, Hakam segue em liberdade aguardando o andar do processo dele. É claro que seus meios para se esquivar de tudo são ilegais.

— Então ele continua a solta. — ele deve ter sentido o medo em minha voz, pois me apertou um pouco mais.

— Longe de mim, mas sim.

É claro que nós dois sabíamos o que aquilo significava. A ameaça ainda poderia voltar a nos assombrar.

— Giovanna, o que eu sinto por você é maior do que qualquer medo em minha mente. Você e Emir me fazem acreditar que sou digno de misericórdia. Allah não me daria tudo isso de volta se eu não merecesse.

— E Hakam?

— A justiça vai cuidar dele, e se não cuidar... eu mesmo dou um jeito.

— Fico preocupada com Emir.

— Não vou deixar nada de ruim acontecer com nosso menino. Confia em mim.

Deito a cabeça em seu peito, fecho meus olhos com força e tento voltar para o conforto que senti pela manhã, mas não posso evitar o gelado do medo tomar conta do meu coração.


lado a lado Onde histórias criam vida. Descubra agora