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Al elmaya taş atan çok olur

Não ter inimigos significa que você está sem sorte.



Sentia o ar quente contra meu rosto enquanto observava o estreito de Bósforo. O outro lado começava a se iluminar a medida que a noite chegava, e eu ouvia os burburinhos do lado de dentro da Universidade de Belas Artes, indicando que logo a cerimônia de formatura começaria. Acendo o cigarro, me aproximo da borda que dava para o mar. Existiam algumas pessoas ao meu redor, mas não poderia me importar menos. Apoio meu pé em um dos bancos, solto a fumaça do cigarro, respiro fundo enquanto sinto o vício acalmar.

Odiava esse tipo de cerimônia, mas sendo quem eu era, certas coisas eram difíceis de escapar.

Meus pensamentos foram interrompidos quando percebo uma presença do meu lado. Percebo pelo cheiro, que é uma delícia, é um frescor na noite de verão turca, e é quase um pecado o meu cigarro estar se misturando a isso. Olho para o lado e vejo a mulher que parou ali, ela mexia no celular ansiosa, digitava loucamente sem errar uma letra.

Ela usava a beca, o chapéu de formatura estava debaixo do braço, enquanto o mundo todo se movia ao seu redor, a jovem parecia completamente alheia. Parecia brava, parecia irritada, e em determinado momento parou de digitar, bloqueou o celular e levantou o olhar.

Fui rápido e voltar minha atenção para o mar. Ouvi um fungar, como um choro abafado, e olhei para o lado rapidamente. Ela secava a lágrima rapidamente, como se o simples pingar daquilo no chão pudesse ser devastador para ela.

Quando percebi, meu cigarro tinha acabado. Soltei a última fumaça pela boca, bem devagar, aproveitando o último gosto. Olhei para o lado de novo, ela olhava o celular como se esperasse uma notificação diferente, mas a essa altura já parecia resignada.

— Formaturas, sempre cheias de emoção, não é? — perguntei, tentando quebrar o clima já que ela estava do meu lado e não parecia afim de sair.

A mulher finalmente me olhou, e para além do cheiro maravilhoso, era maravilhosa. Seus olhos escuros eram expressivos, a maquiagem deixando ainda mais marcante. Ainda que a expressão fosse fechada, era linda, isso sem dúvidas.

— Devia parar de fumar. — ela falou com um tom frio, olhando para minhas mãos agora vazias.

Sorri com a afronta da jovem, coloquei as mãos no bolso.

— Por que eu deveria parar?

— Porque mata.

— Amor também mata, e as pessoas não deixam de amar.

— Deveriam, assim como você deveria realmente parar de fumar. Isso fede. — ela falou antes de se afastar de mim, voltando a olhar para o celular.

Fiquei um tempo ainda olhando para o estreito, fiquei distraído até sentir um toque em meu ombro. Olhei para meu amigo, sorri. Omar era um braço direito, amigo, segurança, parceiro. Com ele eu nunca tinha dúvidas de nada. Pensávamos igual por tanto tempo de convivência, confiaria nele para cuidar de mim se fosse um cego em tiroteio.

— Vamos, Nero? — ele me chamou. — A cerimônia já vai começar e querem te apresentar como patrocinador da turma.

Entramos juntos e fui até o banheiro. Enquanto lavava as mãos, me olhei no espelho, avaliando o cabelo e a barba. Eu precisava fazer, mas a displicência estava me vencendo nesses tempos em que fiquei em Bodrum.

Sequei as mãos, e quando fui arrumar alguns fios rebeldes, entendi o que aquela jovem me falou.

Cigarro fede, de fato.

Balancei a cabeça, nunca me importei com isso, não seria agora que uma recém formada preocupada demais com seu celular iria me afetar com comentários infundados e moralismo.

Omar me esperava para entrarmos no auditório juntos, o lugar estava cheio de familiares orgulhosos e ansiosos, e me perguntei quem deveriam ser os parentes daquela formanda. Cumprimentei o reitor da faculdade, sua esposa, os outros professores, e me sentei ao lado deles, abrindo o botão do terno. Na primeira fileira do auditório estavam os alunos, se cumprimentavam, felizes com a conquista. Eu não a vi.

Foi só quando tudo começou, foi que a observei se sentar em um dos bancos, atrasada, e com a mesma feição fechada de mais cedo.

Não consegui tirar meus olhos dela em momento algum daquela cerimônia, e me surpreendi ao ter meu nome chamado para entregar os diplomas e dar algumas palavras. Me aproximei do microfone, sorri de canto, cumprimentei a todos. Óbvio que me conheciam, mas ainda assim não faziam ideia de quem eu era.

— É uma honra estar aqui na universidade em que minha amada mãe se formou. É uma honra fazer parte da história de vocês, recém formados, e no novo ciclo que se inicia. — olhei para a jovem, ela me olhava de volta, mas eu tinha certeza que via além de mim.

Não tinha foco nenhum em seu olhar, estava perdida em um mar de pensamentos mais profundo que o Bósforo lá fora.

— Hoje é para ser um dia feliz, é uma grande conquista. Que Deus abençoe vocês.

O reitor começou a chamar os formandos em ordem alfabética. Eu lhes entregava o diploma, sorria, tirava uma foto com eles e depois eles tiravam uma foto sozinhos, as famílias comemoravam para todos, mas sempre que chegava o seu pupilo, era a maior festa individual.

Giovanna Antonelli.

A jovem triste saiu de sua cadeira, forçando um sorriso, cumprimentando o reitor com um aperto de mão. As pessoas bateram palmas, mas nenhuma festa individual foi ouvida. Olhei para a plateia rapidamente, e de fato não tinha nenhum familiar em pé.

Aquilo me comoveu, e eu fui até capaz de esquecer o comentário sobre o meu cigarro.

Quando ela se aproximou de mim, estendeu a mão para um aperto. A apertei de volta e entreguei o diploma. Procurava em seu olhar qualquer resquício de felicidade que fosse, mas encontrava apenas melancolia digna dos melhores poetas de nossa nação.

Demorei para soltar a mão dela para nossa foto, e ela me olhava se entender.

— Fique feliz, Giovanna. Hoje é um dia feliz para você, começa uma nova fase. — falei baixo, tentando fazer com que ela acreditasse em minhas palavras.

Quando a vi tirando a foto com seu diploma, um sorriso mínimo, soube que ela não colocou fé em nada do que falei.

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