Don se afastou para sair da tenda, forçando-se a empurrar qualquer resquício de medo de perdê-la para o fundo do peito. Caminhou em direção ao rio, buscando algum alívio na água fria.
Os flocos de neve dançavam na luz das fogueiras antes de se acomodarem no chão. Os homens ao redor ajustavam suas vestimentas, enrolando-se mais firmemente em seus mantos contra o frio. Don afundou levemente os joelhos na lama à margem do rio, onde a água, gélida e cristalina, refletia o céu noturno pontilhado de estrelas.
Ele utilizou a água congelante para lavar o sangue e a sujeira que cobriam suas mãos e rosto. Passou os dedos pelos cabelos escuros, úmidos e desgrenhados, que caíam sobre os olhos, esfregando com vigor na tentativa de remover não apenas a sujeira física, mas também o peso das memórias recentes. A neve se acumulava rapidamente em seus ombros e no chão ao redor, criando um manto branco.
Porra, como ele estava cansado.
Enquanto continuava sua tarefa, perdido em seus pensamentos, passos cautelosos se aproximaram. Ele levantou o olhar para ver Edric Blackthorne caminhando em sua direção. Edric era um bom soldado, mas, naquele momento, seus olhos castanhos estavam cheios de preocupação e medo. Vestido com um manto pesado, ele se aproximou, suas botas afundaram levemente na neve fresca.
— Comandante — sua voz foi baixa e gentil, e sua mão subiu em uma saudação militar. Don se levantou e o encarou frente a frente.
— Os guardas, resignados em proteger a tenda, foram pegos em uma emboscada — Edric sustentou o olhar de Don, mas sua garganta subiu e desceu, traindo seu nervosismo.
— E como isso pôde acontecer? — a voz de Don era controlada, mas seus olhos não esconderam a raiva.
— Houve um erro de cálculo. Não previmos a movimentação inimiga naquele flanco.
— Erro de cálculo? — uma sobrancelha se ergueu, e ele deu um passo à frente, invadindo o espaço pessoal do soldado. — Esse "erro de cálculo" quase custou a vida dela!
— Eu sei, Comandante. Mas os homens fizeram o que puderam com as informações que tinham.
— Isso não foi suficiente! — a frustração de Don era evidente em seu rosto, Edric recuou um passo, sua confiança se esvaindo. — Você tinha a responsabilidade de garantir a segurança da sacerdotisa. Se algo mais grave tivesse acontecido a Loren, você acha que eu poderia encarar o rei?
A responsabilidade de manter a garota protegida era de Don, mas, dane-se, ele descontaria a raiva em Edric, que, convenhamos, também tinha sua parcela de culpa.
— Eu... Eu aceito as consequências. Farei o possível para corrigir isso.
— Corrigir? — a voz de Don se tornou um sussurro feroz enquanto se aproximava ainda mais. — Nada pode corrigir o que aconteceu. Você sabe o que significa a vida de Loren para o reino? Para mim? — ele se arrependeu imediatamente das últimas palavras.
— Sim, Comandante. Sei o que ela significa. Não há desculpa para o meu erro. Farei o que for necessário para reconquistar sua confiança.
— Reconquistar minha confiança não é fácil. Você será rebaixado e colocado em patrulhas nas áreas mais perigosas. E saiba que estou de olho em cada movimento seu. Uma falha a mais, e você não terá uma segunda chance.
Ele assentiu, a determinação misturada com o medo em seu rosto.
— Entendido.
— Assim espero — disse Don, dando um passo para trás, mas ainda o encarando. — Agora, vá. E que isso seja uma lição para todos nós.
Edric se afastou com a cabeça baixa e os ombros pesados. Don se virou, respirando fundo, tentando controlar a raiva que queimava dentro dele. Como sempre. A segurança de Loren não era negociável, e qualquer falha, por menor que fosse, seria tratada com rigor absoluto.
Ao voltar para a tenda, ele entrou com passos leves, mas sentiu o cansaço impregnado em cada movimento. O cheiro metálico de sangue dominava o ar. Ele olhou para Loren e viu sua pele pálida contrastando com as manchas de sangue seco; ela dormia serenamente. Suas feições, apesar da dor visível, ainda conservavam uma sutileza. Suas sobrancelhas delicadas estavam ligeiramente franzidas, talvez em um sonho perturbado pelo sofrimento.
Aproximando-se devagar, com os olhos fixos nela, lutando contra o desejo de tocá-la, ele sentia como se estivesse sendo torturado, maldição, a visão dos curativos, trocados mais cedo e agora novamente ensopados de sangue, o magoava profundamente. Ela não deveria estar ali, ferida por sua causa.
Com um suspiro resignado, ele pegou um cobertor e o estendeu no chão ao lado da maca. Tentou se deitar com cuidado para não a acordar; a proximidade dela lhe oferecia uma sensação de paz que não sentia há dias. Enquanto a observava, seus olhos pesaram, implorando por descanso, e ele se rendeu. Ao dormir ao lado dela, Don sentiu que estava cumprindo uma promessa de proteção.
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A Torre Invertida - Volume I
Fantasy🪙 ROMANTASIA ✶ DARKFANTASY ✶ WEBNOVEL +18 ✶ Em uma terra onde a magia é tanto um presente quanto uma maldição, Loren, uma sacerdotisa com poderes de cura, vive sob um decreto real que a torna intocável. Ironicamente, o príncipe designado como seu p...