45 - o bendito joelho

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18 de novembro; 2024
AMÉLIA MARTINEZ

A manhã começou com um frio insistente que parecia atravessar o tecido do meu agasalho e me fazer questionar as escolhas de vida que me trouxeram aqui, ao campo de treinamento, com o joelho pulsando levemente desde o último treino.

Fazia três dias que voltamos do chalé, e a sensação de paz que eu tinha sentido naquele lugar parecia quase um sonho distante agora. Ali, Gabi e eu conseguimos escapar um pouco da pressão de jogos e treinos, do mundo agitado, como se tivéssemos criado uma bolha só nossa. Foi bom, mais do que bom, foi necessário.

Eu não disse nada para ninguém sobre o joelho. A dor não era aguda, só uma pontada leve, o tipo de coisa que eu podia ignorar. E ignorei. Havia um jogo importante amanhã, e eu sabia que precisavam de mim inteira, sem distrações ou desculpas. Afinal, era meu papel ser a base, dar segurança à equipe.

Só que, durante o treino de hoje, eu senti de novo. Um desconforto que parecia me puxar de volta à realidade, me lembrando de que o corpo também tem seus limites. Não era como se eu nunca tivesse sentido dor antes, e parte de mim estava confiante de que ia passar. Mas, no fundo, uma voz silenciosa começou a me questionar: até quando eu conseguiria ignorar?

Estava no meio do treino, tentando me concentrar nas repetições, quando senti a dor insistente no joelho se intensificar. Era como uma agulhada inesperada, daquelas que me faziam perder o ritmo por um segundo. Respirei fundo e continuei, disfarçando qualquer sinal de desconforto. No fundo, eu sabia que se o Santarelli percebesse algo, ia me tirar do treino na hora. E isso não era uma opção para mim. Não antes de um jogo importante.

— Amélia, posição! — A voz de Santarelli soou firme do outro lado da quadra.

O olhar dele encontrou o meu, com aquele tipo de intensidade que só ele tinha. Eu sabia que ele era observador, exigente, mas também justo. Bastava uma vez que eu errasse o tempo, ou demonstrasse um vacilo, que ele perceberia.

Fiz o movimento, colocando todo o peso no joelho machucado, tentando ignorar a pontada que subiu pela perna. Cada parte do meu corpo estava em alerta, focada em seguir em frente, em passar despercebida. Estávamos no meio de um exercício de defesa intensa, cada uma de nós tentando bloquear e se reposicionar o mais rápido possível. Senti o suor escorrer pelo rosto, o pulso acelerar, e aquela pontada voltar toda vez que eu me movimentava para o lado direito.

Depois de um rali mais longo, Santarelli se aproximou, cruzando os braços e parando bem na minha frente. — Você está um pouco fora do ritmo hoje. Tudo bem por aí? — A pergunta parecia inocente, mas eu sabia que ele esperava uma resposta séria.

Forcei um sorriso, respirando fundo. —Tudo certo, coach. Só tentando me ajustar ao treino de hoje.

Eu sabia que ele esperava o melhor de mim, e, apesar de todo o desconforto, não queria decepcioná-lo. Santarelli era do tipo que valorizava o esforço, mas também não tolerava omissão quando o assunto era saúde física. E eu não estava disposta a entrar nessa conversa agora.

Ele estreitou os olhos, avaliando cada palavra minha, mas então deu um leve aceno com a cabeça e se afastou, permitindo que o treino continuasse. Senti uma mistura de alívio e de frustração ao mesmo tempo. Queria dar o meu melhor, ser a jogadora de confiança que ele esperava, mas, ao mesmo tempo, me perguntava se estava sendo imprudente ao forçar tanto assim.

Quando o treino terminou, senti o joelho latejando de verdade. Parecia um peso extra em cada passo que eu dava. As meninas foram para o vestiário, conversando sobre o jogo de amanhã, e eu fiquei para trás, só observando, me dando alguns segundos para lidar com a dor sem ninguém ver.

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