33 - a mídia assusta

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6 de dezembro; 2024
AMÉLIA MARTINEZ

Gabi me olhou, seu semblante se tornando mais sério. Eu sabia que o que estava prestes a contar não seria fácil, mas era necessário. A conexão que estávamos formando merecia essa honestidade.

— Qual foi a primeira coisa que você leu sobre mim na internet? — perguntei, a voz um pouco trêmula.

— Foi sobre a agressão que você sofreu do assistente de mídia — Gabi respondeu, a expressão dela revelando um misto de empatia e preocupação.

Senti um frio na barriga ao ouvir aquelas palavras. A lembrança daquela noite voltou como um vendaval, e o peso daquilo me fez hesitar.

— A verdade é que a situação foi ainda mais complicada do que as pessoas imaginam — comecei, a voz quase falhando. — Era um dia normal de treino. Estava focada, concentrada... Mas havia uma tensão no ar, um clima pesado que eu não consegui ignorar.

Gabi me observava, a intensidade do seu olhar me encorajando a prosseguir.

— O assistente de mídia começou com comentários inapropriados. No início, tentei ignorá-lo, mas ele insistiu, cada palavra uma provocação. Um jogo de poder sutil, mas insuportável. Quando finalmente decidi confrontá-lo, não esperava a reação que teria.

Fiz uma pausa, a lembrança da agressão ainda fresca em minha mente.

— Ele ficou furioso. Em um instante, ele estava em cima de mim, me empurrando com tanta força que quase perdi o equilíbrio. Em um momento de desespero, eu... eu reagi. O empurrei de volta. E então, tudo se transformou em um caos. O que era apenas uma discussão se tornou uma cena de horror.

Gabi estava tão próxima que podia sentir a energia dela, como se cada palavra minha criasse uma ponte entre nós.

— A mídia pegou aquilo e distorceu. Fui chamada de agressora, a vilã da história. O que deveria ser uma simples defesa pessoal virou um espetáculo grotesco. E a sensação de ser desumanizada foi devastadora. Eu não era mais apenas uma atleta, mas um símbolo do que estava errado no esporte.

Gabi apertou minhas mãos, e eu pude ver a indignação em seus olhos.

— E a coletiva? — ela perguntou, sua voz carregada de emoção. — O que você sentiu?

— Fui forçada a encarar os jornalistas, a explicar o inexplicável. Eles não queriam ouvir a verdade, apenas buscavam uma história para vender. O foco não estava em mim, mas em como eu deveria me comportar, como se isso fosse mais importante do que o que realmente havia acontecido. Eu era uma máquina, não uma pessoa.

O desespero e a frustração transpareciam em cada palavra, e eu continuei, a urgência me empurrando.

— Depois disso, tudo ficou mais difícil. Cada treino, cada jogo, sentia o peso dos olhares. Ninguém mais via a jogadora; viam a "garota que brigou". E eu... eu me afastei. Isolar-me parecia a única opção. Mesmo quando voltei a jogar, era como se uma sombra estivesse sempre à espreita, lembrando-me de que eu não era mais apenas Amélia. Eu era a vítima da violência e da crueldade da mídia.

As lágrimas começaram a se acumular em meus olhos, e a emoção tomou conta de mim. O que eu mais temia era a vulnerabilidade, mas a presença de Gabi me fazia sentir que era seguro abrir meu coração.

— Eu me sentia tão sozinha, Gabi. Como se ninguém realmente se importasse com a Amélia. Apenas com o que eu representava em quadra.

Gabi me olhou com atenção, a expressão dela se tornando mais grave. Eu sabia que estava prestes a abrir mais uma ferida, mas a conexão que estávamos formando me dava coragem. Então respirei fundo

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