capítulo-24

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Ana:

         — você sabe, se eu me irritar, seu irmãozinho não recebe mais nenhum tratamento. - Jason me ameaça apontando pro quarto de Coby.
        — Sei disso. Acho mais fácil acabar com você sabe quem se tiver alguém vigiando de perto. Posso ser o sentinela. - Falo enchendo um pouco o copinho com café puro.
        —  É bom que não esteja tentando me enganar Ana. Ver o processo de degeneração se acelerar por sua culpa...que tipo se irmã você seria. - Jason fala ironicamente.
        — Eu faria qualquer coisa por ele. Agora vai embora, já disse o que tinha pra dizer. - entro fechando a porta do quarto.



       Desde que cheguei do acampamento da turma, Jason me atormenta em relação a isso. Se não fosse por Coby, já teria o mandado pro inferno, e além disso os meus amigos também estão envolvidos nessa merda toda. O pior, não posso fazer nada se não alguém vai se dar muito mal por minha culpa.  Meu único consolo é saber que agora está tudo bem entre mim e Ted. Se eu soubesse que isso aconteceria, já teria dito à ele muito antes os meus verdadeiros sentimentos, mas por enquanto tudo que posso fazer é te-lo ao meu lado como sempre foi.
    

          Eu sei, sei mesmo o que ele sente em relação à mim, desde a sexta série sempre soube dos sentimentos dele, mas demorei muito tempo pra perceber os meus e já era tarde pra concertar.  Eu sou idiota, muito idiota por que sempre, sempre, sempre consigo deixar ele triste. O dia em que Jason me fez humilhar ele na frente de todos foi a pior coisa que me aconteceu, e nunca vou me perdoar. Sempre admirei ele por ser a pessoa com o melhor coração do mundo, por cuidar da família dele, por ser bonzinho com quem não merece, por ser inteligente e bom em tudo o que ele faz.
   

      

        Mas agora, a única coisa pra que eu sirvo, e quero continuar servindo é o meu irmãozinho, a pessoa que eu mais amo, e que aos poucos vai se tornar algo muito perto de uma planta. Por enquanto está tudo bem, ele ainda é um garoto normal aparentemente. O que mais dói é quando ele pergunta quando poderemos voltar pra casa, e eu não posso dizer a verdade: você não pode voltar.  Minha vida tem se tornado um tormento, Jason me ameaçando, a doença do meu irmão, e o único amor que eu tenho está à galáxias de distância de mim com tudo isso.

     Deixei Coby almoçando e caminhei por entre os corredores pra poder ver como estava indo o processo de manifestação da doença. Quem sabe o doutor possa ter conseguido diminuir o ritmo do problema. Antes mesmo de chegar na sala dele, o vi saindo do quarto de um paciente, e assim que ele me notou abriu o sorriso de médico simpático de sempre.

       — Oi doutor!   - aceno com a mão caminhando em sua direção.
       — Olá Ana! Quando voltou?! - Ele me abraça simpático.
       — Faz pouco tempo. Vim o mais rápido que pude.
       — Se divertiu? - Caminhamos pelo corredor enquanto conversamos.
       — Sim, foi bem legal. Fizemos muitas coisas legais e tudo mais.
       — Deve ter sido bem legal mesmo. Seu semblante me parece mais alegre. - O doutor afaga minha cabeça.
       — Sim. Mas... Quero saber o de sempre. Como ele está? Fiquei preocupada em ter algum problema durante esses dias que estive fora.
       — Sobre isso ... - o doutor muda seu rosto sorridente para uma expressão que pra mim era desagradável.
       — O que? Por favor me diga! - minha voz fica trêmula.
       — Não sei por que, mas mesmo tomando os remédios, fazendo a fisioterapia e as coisas em geral, ele tem apresentado disfunções motoras cada vez piores... Acho qie o ritmo da degeneração aumentou.
      — O que... - Sinto um nó me sufocar a garganta - Dê um jeito nisso, tente outros remédios. FAÇA ALGUMA COISA!
     — Ana, não existem outros meios de ajudar. Tentamos, mas...
     — VOCÊ É MÉDICO! DÊ UM JEITO, VOCÊ ESTA AQUI PRA SALVAR VIDAS, SALVE A DO MEU IRMÃO!
     — Fique calma, se alterar não ajudará em nada - ele fala com uma voz calma pra mim - Você, tem que ser forte agora. Estar com ele ... Fazer ele se divertir, por que logo, ele não poderá fazer mas nada por si.
     —  Ficar calma?! - choro revoltada - O corpo do meu irmãozinho está morrendo e quer que eu fique calma? Ele é uma criança, que deveria ser saudável e viver normalmente, e com ele prestes a parar de se mover quer que eu fique calma?! Eu sei que depois disso, meu irmão vai está à um passo de morrer, pessoas sem movimentação não vivem muito tempo!

     — Eu, vou... Morrer?

     Meu coração gela quando vejo Coby sair de trás da parede e perceber que ele havia escutado toda a minha discussão com o doutor. Eu queria poupar ele de saber o seu triste futuro, mas infelizmente por um descuido, meus esforços de livrar ele  de saber daquela triste realidade acabaram ali.

      — É ... Por isso que não posso ir pra casa? - os ombros de Coby estão abaixados, ele está em um pijama azul de toy story e segurando seu ursinho pela pata - Por que eu vou morrer...

     Coby começa a chorar e sai correndo pelo hospital. Corro atrás dele e o doutor também, mas infelizmente ele entra no quarto e tranca a porta antes que possamos entrar. As pessoas no corredor ficam assustadas com os meus gritos pra que ele possa abrir a porta,  as enfermeiras preferidas dele também tentam fazer com que ele saia mas é uma falha. Os amiguinhos tentam mas de nada ajuda. Não o culpo, além do mais, que criança aceitaria numa boa saber que será criança pra sempre pois irá morrer?

      Mesmo que ele viva mais algum tempo paralisado, aos poucos as funções do corpo vão parando e então a pessoa morre. É uma morte a longo prazo, e ela vai matar ele dia após dia um pouco de cada vez, tornando seu sofrimento ainda maior. Ninguém pode fazer nada, eu não posso salvar a pessoa que mais amo.  O processo de separação dos meus pais foi muito doloroso pra mim, Coby era pequeno demais pra entender então não sentiu a dor como eu. Mas o único que podia me fazer sair daquele poço de tristeza era ele, meu irmão me salvou, e eu nunca pude fazer nada por ele. Não conseguiria viver em um mundo onde ele não existe,  e sua existência está prestes a desaparecer.
   

      Mais tarde, depois de me desesperar Coby abriu a porta, e seu rosto estava vermelho e molhado por ter chorado tanto. Peguei meu irmão no colo e me sentei na cama, ouvindo ele fungar bastante deitado no meu ombro e me abraçando segurando seu ursinho, sem dizer nada, e chorando apenas o fiz dormir e fiquei ali abraçando o pequeno corpo do meu irmãozinho.   Eu não sei até quando poderei continuar fazendo isso, pois sempre cuidei dele, sempre coloquei ele pra dormir, dei banho, comida e o levava pra escola todos os dias. Mas parece que uma sobra negra aos poucos está barrando todas as minhas memórias mais felizes.


  "  Era uma vez...um pica pau que bicava as árvores da floresta destruindo ela. Um dia, o grande espírito se irritou e lançou um feitiço no pica pau deixando seu bico envenenado. Comida, água, tudo era envenenado. Toque nos seus amigos e eles cairão mortos aos seus pés. Pobre pica pau, suas lágrimas brilham tristemente..."
   
  

   

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