Bilhete

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Esperei por uma resposta de Maria Clara por alguns instantes, mas não consegui que ela falasse. Dei um sorrisinho compreensivo sem mostrar os dentes, queria que ela entendesse que estava tudo bem se não quisesse responder.

- Duda, eu... - Bife foi interrompida pela porta, que se abriu de repente. Ela deu um pulo pra trás, puxando sua mão para longe da minha com força.

- Caralho! Porra! Duda, que merda! - Era a escandalosa da Rafaela. "Que merda" digo eu.

- O que foi?!

- Uma barata, mano. Enorme e voadora! - Puta que pariu, sério que ela interrompeu o momento mais esperado da história pra isso?!

- Fecha a porta, antes que ela entre! - Agora Maria Clara também estava desesperada. Rafa bateu a porta com força.

- Xiuuu... - Fiz, levando o dedo a boca. - Vocês vão acordar meus pais. - Levantei-me e fui em direção a porta. - Além do mais, é só uma baratinha, não um serial killer... - Falei enquanto abria a porta calmamente para matar essa tal barata da cozinha e... - Puta que pariu! - Voei de volta para o quarto assim que saí. - Essa merda não é de Deus. Ela tá aqui na porta.

- Não te falei? - Rafa jogou na cara. - Ela É um serial killer.

Maria Clara jogou um dos lençóis da cama em mim.

- Coloca no vão da porta, rápido. - Melióooor ideia, sério. Não dormiria com a possibilidade daquele monstro entrar.

- Hoje não deu pra você, "cucaracha". Melhor ir embora. - Depois que fechei a fresta com o pano, tirei sarro da barata mesmo. Que alívio! Juro que não costumo ser marica desse jeito, mas se vocês vissem o tamanho da barata, não me julgariam.

- Agora posso ter meu sono de beleza em paz! - Rafa entrou no banheiro do quarto rebolando e fechou a porta.

Meu olhar foi direto para Maria Clara, mas ela desviou abaixando a cabeça.

- O que ia dizer?

- Só qu-que tô muito cansada... - Opa, gaguejou aí, querida. - Podemos dormir?

Qual é? Óbvio que não era isso. Passei a mão pelos cabelos e suspirei, frustrada. Como viver com essa angústia, Senhor?

Dei um sorriso forçado e puxei um colchão de solteiro que ficava escondido embaixo da minha cama. E assim se foi minha felicidade... Eu, como sempre, dormindo ao lado de Rafa e Maria Clara no colchão.

Quando acordamos a barata serial killer já havia sumido. Maria Clara agia como se nada tivesse acontecido. Pensei que ela pelo menos fosse ficar mais tímida, desviar o olhar, evitar contato... Mas não. Ela estava perfeitamente como sempre foi, o que me deixou revoltada. Não era para fingir TÃO bem assim que não se lembrava da conversa. De qualquer forma a garota foi embora logo, afinal, dormimos até o meio da tarde.

Só fui reencontrar Bife na segunda-feira, e advinha? Ela continuava fingindo feito uma atriz. Ah, a Maju estava no mesmo esquema, parecia nem me conhecer... As duas devem ter feito algum curso de teatro juntas, certeza.

Bufei ao me sentar ao lado de Rafaela na mesa da cantina.

- Ih, tá esquentadinha, é?

- Eu tava no banheiro com a Bife agora.

- E daí? - Rafa perguntou sem dar muita atenção, odeio quando ela fala com a boca cheia assim.

- E daí que estávamos só eu e ela. Eu tava trocando a blusa da educação física e fiquei só de sutiã. SÓ DE SUTIÃ! - Meu tom era o mais indignado possível e Rafa apenas esperou que eu continuasse, com aquela mesma cara de "e daí?" de antes. - Usei a desculpa de que a alça tava muito larga pra pedir ajuda. Você acredita que ela apertou a porra da alça e simplesmente saiu?

- Oxe. Queria que ela fizesse o que? Chupasse seu peito do nada?

- Rafa, meu, leva a sério. - Pedi. - Ela só saiu, nem ficou sem graça. Não deu nem uma olhadinha, mano! - Minha melhor amiga começou a rir, ainda com a boca cheia. Ela tava querendo me irritar ainda mais, não é possível.

- Acho que pediu ajuda pra menina errada. Ela é hétero. - Revirei os olhos, ela não é hétero.

- Seu gaydar nem deve existir. - Rafa concordou com a cabeça, ela nem me dá atenção quando preciso. - Mas também deixei ela lá sozinha, só de raiva. - Muito vingativa eu, né? Quase um "V de Vingança" da vida real. - Tem noção do sutiã lindo que tô usando? - Era rendado e vermelho, fazia meus peitos ficarem juntinhos e parecerem maiores. Como Maria Clara pôde não olhar para eles?

Rafaela deu uma analisada no sutiã, a blusa era branca, então dava para ter uma ideia de como ficava.

- Da próxima vez me chama pra te ajudar. - Teve bastante malícia aí.

- Nem fodendo. A culpa de tudo isso é sua. - Acusei.

- Minha?! - Falou levando o indicador ao peito. - Só me agradece, vadia, por eu ter deixado vocês sozinhas. Você que tá apaixonadinha e fica insegura. Se tem tanta certeza que ela não é hétero, puxa e beija.

- Daqui a pouco vou beijar você, pra ver se cala a boca.

- Eca. - Rafa riu.

- Duda, - Maria Clara finalmente apareceu. - Recebi uma coisa. - Ela me passou um envelope dobrado ao meio e já aberto.

Franzi o cenho. Quem manda carta se pode mandar um Whats?

O envelope continha um pequeno bilhete.

"Reveja o vídeo prestando atenção em Santiago de La Riva."

GAROTA ENCONTRA GAROTAOnde histórias criam vida. Descubra agora