Refizemos nosso caminho procurando por Grandão. Ele não estava em lugar algum. Lembrei daqueles garotos atirando pedras na gente, se algo acontecesse com Grandão...
— Plim! — Gritou Blasco. — Aqui! Achei ele.
Gil e eu corremos. Blasco estava perto de um enorme portão de ferro, um lugar ermo da cidade, que ninguém tinha coragem de passar. Não consegui evitar e olhei para a floresta através do portão, as folhas das árvores balançando, sem pássaros, sem luz, e não sei como expressar, um tanto... Morto. Meu corpo gelou. Desviei o olhar e vi Grandão encolhido num canto. Fiquei espantada por ver alguém tão grande parecer muito pequeno e indefeso, ele segurava as próprias pernas e choramingava baixinho.
— Eu ouvi o choro dele. — Explicou Blasco.
Nos aproximamos de Grandão e fui o acalmando. Ele parou de chorar e olhou pra mim.
— Me perder, Plim sumiu.
— Eu sei Grandão, por favor, me desculpe.
O meio gigante limpou os olhos e sorriu.
— Plim desculpada.
— Vamos sair daqui Grandão. — Disse, dando uma última olhada pra floresta.
Caminhamos pelas ruas, debatendo sobre o que poderia ter para o jantar, o céu ganhava um tom alaranjado e as barracas do mercado iam sendo desmontadas. Eu viajava montada no ombro do Grandão, ouvia as vozes dos meninos e as vezes uma risadinha rouca do gigante, mas não prestava atenção na conversa. Eu pensava na floresta atrás daquele enorme portão.
Quando eu era criança andava saltitando ao lado da irmã Treysa. Carregávamos verduras frescas e aventurei um caminho novo, demos de cara com a floresta, a irmã Treysa nunca gritava comigo, mas quando tentei espiar pelas grades ela berrou, disse que o lugar era amaldiçoado e muitas pessoas morreram só de olhar a floresta. Nunca acreditei nessas coisas, nosso mundo é cheio de mistérios e magia, isso é verdade, mas nunca acreditei que alguém poderia morrer só de olhar pra uma floresta, isso até o momento que a vi. Alguém chamou meu nome.
— Plim! — Era Blasco.
— Que foi ovelha?
— Não gosto que você me chame assim.
— Mas todos te chamam assim.
— Você não chamava.
Dei de ombros.
— Tudo bem. O que você quer Lorde Blasco, o grande, excelentíssimo.
Grandão e Gil riram. Blasco emburrou de vez e deu alguns passos à frente.
— Nada. — Disse ele. — Não quero nada.
— Ah, ficou tristinho.
— Cala a boca, magricela.
Me segurei pra não arrebentar a cara dele, odiava quando me chamavam assim. Desde a vez que quando pequenina um casal veio me ver pra adotar, eu conversei com eles e nos divertimos, no fundo eu tinha gostado deles, mas ouvi quando a mulher conversava com Treysa dizendo que não ficariam comigo porque eu era muito magricela. E Blasco deveria saber disso.
— Desgraçado. — Eu disse, cerrando os punhos e quase pulando dos ombros do Grandão pra achatar a cabeça de ovelha dele.
— Você começou. — Disse Gil sorrindo. — Agora aguenta.
Se tinha outra coisa que me dava muita raiva era quando Gil tinha razão e eu não. Fomos o resto do caminho os quatro calados.
O jantar ia ser do bom. As irmãs trabalhavam com afinco, ia ter pato assado, carne, peixe, purê de batatas, e até sobremesa. Fiquei olhando quando a Madre Superiora esculachava Blasco e Gil, ela agitava uma enorme colher de pau enquanto dizia como eles eram vagabundos e que deixavam todo o trabalho para Plim, euzinha. E mesmo ela sendo muito velha eles se encolhiam assustados, no fim ela pediu para que estendessem as mãos, cara! Eu tive que me segurar pra não rir do olhar de medo deles, e zás, tomaram três pauladas cada um. É, foi um dia muito especial na cozinha.
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Escama Negra
FantasyPlim é uma órfã de dezesseis anos que odeia seu nome e detesta crianças. Depois de perder um de seus olhos num ataque com bandidos ela decide participar de uma competição especial, conseguir um dos cobiçados itens mágicos e se tornar uma cavaleira a...