Pousada Ponte Quebrada.

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Pouco antes de o navio aportar, quando já se viam os muros e construções altíssimas, nos foram passadas as últimas orientações. Todos se juntaram, eu me sentia esquisita, um tanto fraca, cansada. Emilian apareceu me desejando bom dia, sorri um sorriso fraco. O comandante, Gumercindo e Barto nos encararam, começaram a falar do que nos esperava, do teste e da importância dele. Iriamos nos apresentar no mesmo dia, estávamos atrasados, a ideia era chegar pelo menos um dia antes, mas ainda teríamos um tempo para descansar da viagem, seriamos livres pra caminhar pela cidade, mas quando o sino da catedral badalasse dez vezes todos deveriam estar no grande pátio de treino.

Eles não conseguiram passar mais nenhuma ordem, todos estavam animados e se apoiavam nas beiras do navio para ver mais de perto a maravilhosa Alba. As pessoas conversavam, algumas nervosas, outras sonhadoras, os meninos ficaram ao meu lado, Gil, Barto, Fid, Emilian, Davel e por fim Dora. Todos fazendo especulações e comentários, menos Eldorada, que me encarava, olhos suplicantes, tristes, parecia querer conversar. Mas o navio atracou, e todos começaram a sair, Emilian levava nossas coisas, um malão maior do que ele, mas fazia questão. Dora me seguiu e eu mergulhei na multidão, um empurra-empurra, Emilian conseguiu, se esquivando, descer primeiro, ficou me esperando e sorriu quando eu segurei sua mãozinha.

– Terra firme. – Disse ele feliz da vida.

Gil logo desembarcou com Blasco e Fid, vi que Davel estava mais atrás, com Dora, ela sussurrava algo em seu ouvido e ele imediatamente me olhou, senti uma enorme vergonha imaginando que ela pudesse estar revelando sobre noite passada.

– Vamos. – Eu Disse. – Vamos dar uma olhada na cidade.

Todos concordaram, o porto estava uma confusão, os campeões, trabalhadores passando com caixas, tentávamos desviar das pessoas, mas Fid acabou se chocando com um sujeito enorme que levava uma caixa nas costas quase a deixando cair.

– Olha por onde anda nanico maluco.

Olhei pra Fid e vi que ele tinha os olhos arregalados, a boquinha tremendo, e pensei que ele se magoara com o que o sujeito disse. Virei-me pra confronta-lo quando congelei, não acreditei no que via, me olhando espantado, careca e com a cicatriz no rosto.

– Chamusca. – Gritei.

– Caolha! Porra, você mudou.

Foi algo incrível, a sensação, a saudade, Fid o abraçou e Chamusca por um momento correspondeu o abraço, mas logo o afastou xingando, nos cumprimentamos. Os meninos não entendiam nada quando expliquei que esse era Chamusca, o da ponte. Eles ficaram felizes em conhecê-lo. Chamusca contou que estava vivendo em Alba, trabalhando numa pousada restauradora, vinha ao porto pegar mantimentos e outras coisas.

– Mas e vocês se perderam por acaso?

Eu sorri e Fid também, os dois orgulhos.

– Teste pro esquadrão. – Eu disse.

Chamusca nos olhou orgulhoso.

– Mostraram pra eles não é Nanico?

– Sim sinhô.

– Rápido eu quero mostrar uma coisa pra vocês.

Os meninos concordaram em seguir Chamusca. As pessoas o cumprimentavam quando ele passava, chamusca parecia gozar de algum prestigio ali.

– Mande lembranças pra Doutora.

– Manda você mesmo, não sou garoto de recados nem um pássaro.

As pessoas riam do jeito de Chamusca e nós sorriamos. Notei que Davel e Dora ficaram pra trás e Gil contou que eles pretendiam ver um lugar especifico da cidade e que ficaram de nos encontrar no teste. Eu me senti estranha, não queria que Dora ficasse triste, mas não sabia como confronta-la, na verdade sabia, era simples, só me faltava coragem. Os meninos foram falando com Chamusca pelo caminho e tanto Blasco como Gil pareciam se dar bem com ele. Ele levava o caixote como se não fosse nada, passamos por casas encostadas uma nas outras, uma pequena feira, mercado e restaurantes, Alba era linda, não fedia a merda como as outras cidades, ali existia um sistema de esgotos que levava os dejetos para o mar. O céu estava claro e azul, uma brisa leve mexia nos meus cabelos curtos e tocava meu rosto marcado.

Escama NegraOnde histórias criam vida. Descubra agora