Capítulo 27

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Peter parecia não entender. Era difícil de acreditar no quão cínico ele podia ser. Quem via aquela carinha jamais imaginaria.

— Se preferir, eu volto outra hora. – Disse ele, receoso.

— Tanto faz. – Falei, olhando para a tela do computador.

Ele olhou para mim, aparentando estar magoado, e saiu em silêncio. Não era nada fácil para mim tratá-lo dessa maneira, mas eu sabia que se não fosse dura, iria me machucar mais.

Suspirei, num misto de raiva, mágoa e tristeza. Passei o resto do dia me esforçando para focar no trabalho, afinal, como dizia minha avó, quando era viva: "mente vazia é oficina do diabo".

Ao final do dia, fui para casa e segurei o choro o quanto pude. Não admitia que ninguém me fizesse chorar, principalmente um idiota como Peter. Falou tanto de Luke, mas era igual. Todos eram. Era por isso que eu queria distância de relacionamentos, porque eles serviam para iludir e machucar pessoas.

Os dias se passaram sem grandes novidades. Eu continuava evitando Peter, o laboratório continuava suas análises sobre a arma usada nos ataques, a escola continuava cheia de pessoas irritantes... Tudo exatamente igual.

No domingo, tudo continuava igual, e eu pensava ser apenas mais um dia comum. Pensei errado.

Estava em minha casa, ajudando minha mãe com a louça do almoço, quando ela apoiou-se na pia, parecendo fraca.

— Mãe? – Assustei-me, indo rapidamente até ela.

Ela respirava fundo, com os olhos fechados e as mãos trêmulas. Estava pálida e mal conseguia se manter em pé.

Entrei em pânico. Levei-a com dificuldade até uma cadeira e liguei para o Doutor Scott.

— Alô?

— Doutor Scott me ajuda por favor! – Quase gritei, já em prantos.

— Helena?

— Sou eu! Minha mãe tá mal! Por favor, vem pra cá agora!

— Estou indo! Não demoro.

Desliguei o telefone e o coloquei sobre a mesa. Pousei a mão sobre o ombro de minha mãe e tentei falar com ela:

— Mãe?

Ela olhou para mim. Estava quase inconsciente. Parecia estar com dor.

Apoiei seu corpo sobre meu ombro e a levei até o sofá. Ela se sentou e encostou a cabeça para o lado, ofegante, com uma expressão de sofrimento e dor.

Sentei ao seu lado e a abracei, dizendo repetidas vezes que iria ficar tudo bem. Eu tentava convencer mais a mim mesma do que a ela.

Após o que pareceu ser uma eternidade, ouvi a sirene da ambulância, e logo a campainha tocou. Levantei rapidamente e fui abrir a porta para o Doutor Scott.

— Com licença. – Disse ele, entrando e indo rapidamente até minha mãe.

Ele a examinou, vendo seus batimentos cardíacos.

— A maca! Rápido! – Gritou ele, e logo entraram mais três homens com uma maca.

Levaram minha mãe até a ambulância e injetaram algo em seu braço. Provavelmente algum sedativo. Eu estava desesperada.

— Vamos ter que interná-la. Tem alguém com quem ficar essa noite? –Perguntou Scott.

— Eu me viro. Só cuida dela, por favor!

— Farei tudo o que puder. – Disse ele, com um olhar preocupado.

Aquele olhar me gelou. Os problemas no tratamento de minha mãe vinham ocorrendo com uma frequência cada vez maior, e eu tinha muito medo do que isso poderia acarretar. Eu não podia perdê-la. Ela era a única pessoa que eu tinha. Não havia avós, tios ou parentes próximos.

Fiz menção de ir atrás de Scott e entrar na ambulância, mas ele me deteve.

— Sinto muito, Helena. Não posso deixar que você nos acompanhe dessa vez.

— O quê? Não, por favor...

— Eu sinto muito mesmo.

Olhei para ele e soltei um gemido, quase que implorando para que me deixasse ir. Ele se desculpou com um olhar triste e entrou no veículo, fechando as portas.

A ambulância saiu às pressas, chamando atenção dos vizinhos curiosos com sua sirene barulhenta pela rua. Ainda tentando processar tudo em minha mente, fechei a porta e sentei-me no sofá, repassando dolorosamente cada momento em minha cabeça.

A casa vazia exalava um silêncio horrendo, que me causava arrepios. Ainda sem saber como reagir, escondi o rosto entre as mãos e chorei até perder o fôlego. A dor e o medo que sentia eram imensos. Tudo parecia um longo e terrível pesadelo, do qual eu não conseguia acordar.

Após um longo tempo imersa no agoniante som de meus próprios soluços, respirei fundo, na tentativa de me acalmar, e disse para mim mesma, em voz alta:

— Calma, Helena. Vai ficar tudo bem. Sua mãe vai ficar bem.

Era no que eu queria acreditar. No que precisava acreditar. Não podia cogitar a ideia de perder minha mãe. Ela era tudo o que eu tinha.

I (don't) Need a Hero!Onde histórias criam vida. Descubra agora