Capítulo 47

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Demorei a dormir naquela noite. Meus pensamentos estavam a mil, e aquele beijo não saía da minha cabeça. Na manhã seguinte, acordei transtornada.

O momento do café foi extremamente tenso. Ter que conversar com May e Peter como se nada tivesse acontecido não era nada fácil.

— Vocês estão quietos. – Disse May – Aconteceu alguma coisa?

— Não, May. Acho que só estamos cansados. – Respondeu Peter, lançando-me um olhar duro. Eu não disse uma palavra sequer.

— A rua estava uma loucura ontem à noite! Fiquei morrendo de medo de voltar pra casa. – Contou May.

Fechei meus olhos. Merda! O dia não estava sendo fácil mesmo.

— Ontem à noite? O que aconteceu? – Indagou Peter.

— Uma quadrilha estava abordando várias pessoas. Não vi se roubaram algo, mas destruíram toda a venda da Sra. Turner.

Peter instintivamente lançou-me um olhar preocupado, como quem entendeu a possibilidade de ter sido a perigosa quadrilha que vinha aterrorizando Nova York. Como se lembrasse de ontem, ele desviou o olhar de volta para sua tia, perguntando:

— Você tá bem? Eles te machucaram?

— Estou bem, querido. Eu estava um pouco longe quando aconteceu, e o Homem de Ferro apareceu e literalmente me escoltou até a porta.

Suspirei, aliviada. Tony havia lido minha mensagem. Eu jamais me perdoaria se algo acontecesse com May naquela noite.

— Vocês não viram nada no noticiário? – Perguntou ela.

Sem olhar um para o outro, apenas fizemos que não com a cabeça. May deu de ombros e não contestou.

Durante a tarde, a campainha tocou. Enquanto Peter foi atender, fui até a cozinha beber um copo de suco. Estava fechando a geladeira, quando ouvi uma voz próxima a mim dizer:

— Oi, May.

 Virei-me rapidamente, não reconhecendo a voz. Era o tal Ned, amigo de Peter que, ao ver que eu não era May, começou a gritar. Assustada, acabei gritando também.

— AAAAAAAAAAAAAAH!

— AAAAAAAAAAAAAAH!

Peter correu até a cozinha e perguntou, assustado:

— O que tá acontecendo aqui???

— Peter, tem uma estranha na sua cozinha! Chama a polícia! – Exclamou o garoto.

Olhei para ele e franzi o cenho, sem entender nada.

— Ned, calma. Essa é a Helena. – Explicou Peter, acalmando o amigo, e disse sem me olhar nos olhos – Esse é o Ned.

— Espera... Essa é a Helena? – Perguntou Ned, dando ênfase na palavra "essa".

Peter fez que sim com a cabeça.

— Ela é diferente de perto. Acho que agora entendi porque você fala tanto dela. – Disse o garoto, arqueando as sobrancelhas.

Olhei para Peter, que lançou um olhar cortante para o amigo. Numa falha tentativa de ser mais discreto, Ned "sussurrou", como se eu não pudesse ouvir:

— Você deveria "laçar ela" com a sua teia. Entendeu? Teia... Laçar...

— Ned! – Peter exclamou, sem graça.

Tive que conter o riso ao ouvir aquilo. Sabendo que Ned conhecia o segredo de Peter e tentando quebrar o clima tenso que havia entre Peter e eu naquele momento, falei:

— Então quer dizer que o garoto aranha sai falando de mim por aí?

Ned olhou surpreso para mim e depois para Peter, perguntando incrédulo:

— Você contou pra ela?

— SHHH! May tá em casa! – Sussurrou Peter.

— Você contou pra ela? – Ned repetiu, sussurrando desta vez – Eu não acredito que contou pra ela! Achei que só eu sabia do seu segredo! Que traição!

Cruzei meus braços enquanto assistia em silêncio o drama.

— Ned... – Peter chamou, mas foi interrompido.

— Achei que eu fosse o único a saber porque sou seu melhor amigo!

— Ned...

— Não acredito que você contou pra ela só porque ela é bonita e...

— Ned! Me ouve! A Helena trabalha comigo! Ela sabe de tudo porque trabalha comigo!

Ned calou-se e olhou para mim, que ainda mantinha os braços cruzados e um sorriso debochado no rosto. Peter cobriu o rosto com as mãos, vermelho. Apesar do climão, aquilo estava sendo divertido.

— Vamos logo terminar aquele trabalho. – Disse Peter, já impaciente, levando Ned até seu quarto.

Agora que estava sozinha na cozinha, finalmente consegui beber meu suco. Que doideira. Peguei meu livro e fui até o quarto na esperança de conseguir ler um pouco, mas não obtive sucesso. O maldito beijo não saía da minha mente por nada, e eu já estava a ponto de enlouquecer.

Deitei-me na cama e fechei os olhos, dando um longo suspiro. Por que as coisas tinham de ser tão difíceis?

— Ah, mãezinha... Se a senhora estivesse aqui, com certeza me ajudaria a resolver esse problemão em que eu me meti. – Sussurrei, como se ela pudesse me ouvir.

Fiquei pensando em minha mãe e lembrando de seu jeito, sua voz, seu perfume, até que acabei pegando no sono. Acordei após algum tempo, com barulho de panelas e das portas do armário abrindo e fechando. May provavelmente estava guardando a louça.

Saí do quarto, ainda um pouco sonolenta, e resolvi tomar um banho para despertar. No caminho para o banheiro, ouvi as vozes de Peter e Ned conversando no quarto. Mesmo sabendo que era errado ouvir a conversa alheia, minha curiosidade falou mais alto. Sutilmente, aproximei-me da porta do quarto e pude ouvir o que parecia uma discussão:

"Você tem que falar com ela. Não pode continuar com isso."

"Sei disso. Mas eu não sei o que fazer. Não sei nem por onde começar."

"Por que não abre o jogo?"

"Não dá. Não agora."

"Por quê?"

"Porque a reação dela não vai ser nada boa, tenho certeza."

I (don't) Need a Hero!Onde histórias criam vida. Descubra agora