44 - Doutores, Teimosias e Frascos

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O que o Christopher podia querer? Na sexta-feira, quando nos falamos pela última vez, ele parecia estar muito bem comigo, mas eu não conseguia pensar em um motivo bom para ele estar me convocando agora. Com a sorte que eu tinha, provavelmente, ele tinha descoberto algo a meu respeito durante e viagem - como aquela vez que eu vomitei nos sapatos do presidente da Costa Rica durante um passeio de barco em que minha família o recepcionava no nosso país. Mas O Christopher não tinha como ter sabido disso, não é?

Subi as escadas, cada vez mais nervosa e bati na porta escura do quarto dele, que foi atendida pela Cecília tão rápido que ela só poderia já estar do outro lado. Assim que entrei a Cecília se afastou da porta, indo se postar ao lado do criado-mudo. Dentro do quarto, dessa vez a janela e a cortina pesada estavam abertas deixando o sol iluminar o quarto. Imediatamente, localizei o Christopher sentado no colchão com as pernas cruzadas tipo indiozinho e as costas apoiadas na cabeceira da cama. O fitei e nossos olhos se encontraram. Ele não parecia estar aborrecido comigo e até parecia um pouco melhor. A muito custo, desviei o olhar do dele e notei o homem parado do outro lado da cama. Ele era extremamente alto e tinha cabelos escuros onde se destacavam várias mechas grisalhas, usava um terno cinza-claro bem-apessoado, óculos redondos e me encarou com um olhar bondoso. O estetoscópio pendurado em seu pescoço dava uma boa dica sobre quem ele devia ser.

- Boa tarde! - Ele me cumprimentou, amigavelmente, ao ver que eu continuava encarando-o.

- Entre, Sarah! - A Cecília mandou, ríspida, já que eu ainda estava parada na soleira da porta. - Sua alteza perguntou por você um milhão de vezes. Achei que você devia vir. Esse é o doutor Walter.

Vi quando o Christopher baixou os olhos, cheio de constrangimento. Entrei, me sentindo meio estranha com todos ali, me olhando e fechei a porta ao passar. Como assim, o príncipe perguntou por mim?

- Então, a senhorita é a Sarah? - O médico falou. Se ele estava surpreso por descobrir que eu era uma empregada, não deu mostras.

Me aproximei da cama sutilmente, ciente de que todos os olhos continuavam em mim. Meu olhar se fixou no rosto do Christopher, examinando-o.

- Como está se sentindo... - Lembrando que não estávamos a sós, acrescentei tardiamente: - alteza?

- Estou bem - ele rebateu automaticamente.

Claramente era uma resposta mecânica. Lancei a ele um olhar condescendente e, esquecendo momentaneamente que outras pessoas estavam presentes, insisti, soando brusca:

- Ok. Agora diga a verdade. - Repeti: - Como está se sentindo?

Com a visão periférica, vi quando o doutor Walter ergueu as sobrancelhas, surpreso com a minha atitude - e, tudo bem, não devia ser todo dia que ele via uma copeira debatendo com um príncipe. O próprio Christopher não conseguiu evitar que seus olhos se abrissem um pouco mais, pego desprevenido pela minha repentina rispidez.

- Eu estou bem - ele repetiu, mas não soou mais tão confiante ou ensaiado.

Antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, o doutor se interpôs:

- Alteza, com todo respeito - ele ajeitou os óculos sobre o nariz com um gesto ansioso: -, mas está ciente que quase teve uma crise de estresse ontem à noite. Certamente, "bem" não é melhor palavra para descrevê-lo no momento.

- Como o doutor ressaltou, isso foi ontem à noite - o Christopher murmurou, inseguro, desviando o olhar para todos os lados, menos para ele. - Já estou muito melhor.

- Mas o seu estômago ainda dói, estou enganado?

O Christopher hesitou, soltando um suspiro cansado. Talvez ele tenha cogitado mentir de novo e negar, mas por fim, meio que deixou que as palavras escapassem.

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