- Desculpe-me - ele murmurou -, eu não queria assustá-la.
- Eu... eu... A quanto tempo você está aí? - A verdade era que eu tinha estado tão imersa que não tinha visto ele chegar mesmo estando poucos metros à minha frente.
- O bastante. - Era difícil ver sua expressão na penumbra, então eu não tinha certeza se ele estava irritado.
- Desculpa. Eu não queria acordar você.
- Não se preocupe, não acordou. Você toca lindamente.
Ele falou de um jeito sincero, parecia realmente admirado. Senti meu rosto esquentar - fiquei feliz que ele não pudesse ver meu rosto também.
- Insônia outra vez? - Perguntei, em vez de agradecer o elogio.
- Sim. - Ele encolheu os ombros.
Um momento de silêncio se instalou. Não chegava a ser opressivo, mas eu nunca fui adepta de silêncios. E, embora ele não tivesse dito nada a respeito, alguma coisa me dizia que eu devia me desculpar por isso também, então falei:
- Desculpa por invadir a sala e sair usando seu piano. Eu não devia ter feito isso. - E claro que disparei a falar, como sempre. - É só que eu costumo tocar piano quando estou triste e eu estava com saudades de casa e... eu não sei porque estou falando isso.
- Não tem problema. Ninguém utiliza o instrumento há muito tempo. Assim como a biblioteca, é um desperdício que fique sem função aqui. Assim como a biblioteca, pode ficar à vontade sempre que estiver com tempo livre. Porém quanto às saudades que sente de sua família, talvez você devesse voltar para a sua casa.
Fiz uma careta no escuro, que, claro, ele não podia ver. De fato, eu estava com saudades, mas ainda não era o bastante para me convencer a casar com um cara qualquer. Mas a minha cabeça balançando freneticamente em um gesto negativo ele deve ter visto, já que soltou um suspiro resignado.
- Você toca? - Foi o que eu perguntei, em vez de responder sua sugestão. Talvez ele estivesse tentando me expulsar com sutileza.
Em silêncio, ele finalmente desencostou do batente da porta e entrou na sala - eu nunca ia cansar de invejar a forma elegante com que ele se movia. Ele deu a entender que ia se acomodar em um dos sofás, mas inconscientemente me vi abrindo espaço no banco do piano onde eu estava.
Ele hesitou, mas acabou cedendo. Tenso, ele sentou-se ao meu lado, deixando o máximo de espaço que o pequeno banco permitia.
- Não - ele respondeu. - Na verdade, eu sei tocar apenas Cai, Cai, Balão. - Ele fez uma pequena demonstração e eu não pude evitar rir. Ele concluiu: - O piano era da minha mãe. Ela era musicista antes de casar-se com meu pai. Ela tocava em orquestras.
- Uau, que maneiro! - Talvez eu tenha me entusiasmado demais. Agora que ele estava perto, eu podia ver seu rosto, e pude ver um sorrisinho quase imperceptível aparecer nos lábios dele. - Você nunca se interessou em aprender a tocar?
O sorriso que já era quase nada, desapareceu totalmente e seu olhar se desviou do meu, parando em um ponto vazio. O que eu tinha dito de errado? Tipo, eu tinha feito uma pergunta bem inocente, não? Eu não conseguia entender qual era o problema dele. Por que de repente ele olhava para a parede como se eu tivesse lhe contado que o Jack morre no final de Titanic?
Eu estava prestes a tentar consertar a minha pergunta - mesmo sem saber exatamente o que deveria consertar -, mas ele respondeu, ainda sem me encarar:
- Há dez anos, minha mãe havia iniciado as minhas aulas de música. Alguns meses antes que... ela viesse a falecer. - Ele titubeou um instante antes de concluir: - Após sua morte, eu jamais me interessei em aproximar-me do piano novamente.
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Real
Teen FictionSarah achava que já tinha problemas demais para lidar entre a escola, as cobranças da família, o seu namorado secreto e o fato de ser uma princesa em um país prestes a entrar em guerra com seu vizinho. Mas percebe que as coisas podem ficar ainda mai...