Capítulo 3 - Assuntos

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-E aí? Como tem sido no colégio?-Quando ouço a pergunta de Seth, desejo ter ido embora quando tive a primeira chance. Eu não quero falar sobre a escola, não tem sido nem um pouco interessante.-Você quase não fala sobre...

Tomo mais um gole de café frutado que pedi, e que também proporcionará mais algumas horas acordado. É uma droga. Literalmente.

-Não é interessante.-Respondo, tentando não parecer seco de mais.
Continua me fitando com seus olhos escuros, deve imaginar que logo terei que inventar uma desculpa melhor.-É sempre igual... Todos os dias.

Não é como se eu me sentisse fracassado de ouvir todos os dias que Seth tem um milhão de amigos, é um dos melhores alunos de sua escola e também é atleta. Eu me sinto fracassado por não poder lhe contar como foi o meu dia por completo sem que tenha um babaca de penetra me irritando no meio da história.

-Você... É muito bonito.-Diz ele, como sempre de uma forma totalmente aleatória. Eu sorrio, tímido e então abaixo o olhar tentando de alguma forma não destruir o momento. Eu gostaria de cavar um buraco no chão e me enterrar.-É sério.-Volta a dizer, alcançando a minha mão parada na mesa, ele a segura.

Eu pensava no que dizer quando ouço três batidas no vidro ao nosso lado. Callie, e eu não sei como ela advinhou que eu estaria aqui. Pelo visto o horário de aula está mais próximo do que eu imaginei e acabei me distraindo um pouco por de mais.
Minha mão escapa da de Seth e só então percebi que nem me esforcei para não parecer rude, posso ter me assustado com a presença inesperada de Callie. A despedida durou um pouco menos do que eu imaginei e deixo o lugar sem muita demonstração de afeto, afinal, pode ter um Henri me observando escondido para depois espalhar para todos que eu estava quase transando com um cara numa cafeteria.

Encontro Callie já do lado de fora, através do vidro ainda posso ver Seth um pouco antes de sairmos dali, ele acena e eu sorrio, e eu só queria ter mais uma hora em paz com ele.

-Ele é bonito.-Diz, sendo aleatória como sempre é.-É latino ou algo assim?

-Tem certeza que deveria estar aqui?-Pergunto, com um tom meio sarcástico.

-Não, mas eu tenho que evitar que você seja morto.

-O que?!

-Qual foi, Kody, eu sou vizinha do valentão, esqueceu?! ele não estava muito feliz hoje de manhã.-Olha para mim enquanto andamos, Callie quer ver a minha expressão de medo mas eu não tenho. Pelo menos não na minha cara.-Você fica tão fofo quando está com medo.

-Vai se ferrar.-Sorrio, mas sinto que não deveria tão cedo.

*

O meu dia se resumiu em me esconder e correr quando avistava mesmo que de longe aquela silhueta robusta e musculosa de cabelos castanhos claros. Era meio dia e meio, então eu vagava sozinho pelos corredores parcialmente vazios em busca do meu armário para guardar os meus livros.
A mão que me agarra pela gola do suéter é tão forte que a princípio achei que seria um soco. Ele segura firme e então me empurra contra a parede com armários, chamando a atenção de algumas pessoas por perto.

-Eu vou te matar!-Ele diz, me encara furioso com seu rosto a poucos centímetros do meu. Eu posso até sentir como ele está furioso.-Sua bicha do caralho!

-Cara isso tá muito errado. Ninguém mais zoa os gays...-Um dos seus amigos murmura, mas este não parece se importar muito com o que está acontecendo.

-Sai daqui!-Exclama, o outro sai ainda questionando as atitudes do seu amigo, que de tão furioso não desvia o seu olhar de mim. Eu não posso negar nem por um segundo que estou com medo, com medo pra caralho.-Você e aquela puta maconheira... eu vou matar os dois!

-Você não vai fazer isso.-Ainda tento falar mesmo estando sendo sufocado por ele que quase me tira do chão. Isso o faz me empurrar novamente contra a mesma parede.-Você foi suspenso do time... Não vai querer ser expulso de vez...

No momento em que não parecia ser eficiente, penso que ele finalmente vai me largar, e ele o faz, só que de outro jeito. Me empurra para a outra direção, e dessa vez não me segura pelo suéter... E também não tem parede atrás de mim. Encontro o chão e isso não é uma novidade para mim. Henri ainda está com um excesso de raiva a qual poderia criar energia para destruir um planeta.

-Na próxima merda que você fizer... Eu te mato!-Exclama, enquanto tento levantar. Isso não me afeta, ele só quer que eu fique com medo, acredito que não pretenda me matar de verdade.-E se eu não te matar, vou te deixar machucado... Pra caralho.

Ele finalmente vai embora. "Não foi tão ruim quanto eu imaginei que seria" penso, ainda ofegante pelo medo de ser quebrado ao meio.

*

-Se quiser, te empresto o meu canivete da próxima vez.-Diz Callie enquanto caminhamos para ir embora. Recuso com a cabeça. A minha intenção não é e nunca vai ser machucá-lo, eu só quero ser respeitado. Já estou até um pouco arrependido do que fiz ontem. A empatia ainda vai ferrar com a minha vida.-Ou você poderia mandar o Seth dar uma surra nele.

Eu rio, pois Seth é a pessoa mais calma que conheço. Ele com certeza faria Henri mudar de país somente com um diálogo.

-Sei lá... Ele pode ter aprendido karatê antes de te conhecer.-Ela volta a dizer, e eu não paro de rir do que ela fala séria. O senso de humor de Callie é tão esquisito quanto ela.

De repente, eu sinto que não deveria estar rindo ainda. Estava até demorando.
Henri, e ele está vindo na direção oposta da gente, deve estar indo implorar ao treinador para voltar ao time. Me acerta com um soco na barriga.

-Se não tiver rindo da merda que fez, deveria parar com as drogas.-Diz, enquanto continua andando.

-Cara, qual é o seu problema?-Pergunta Callie, mas é ignorada. Continuamos andando, e eu continuo fingindo que aquilo não foi nada.

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