Bullying

Capítulo 29 - Ressaca

Ainda estava amanhecendo quando os meus olhos abriram de forma espontânea. Correram pelo quarto pouco iluminado de Henri, só então cheguei a acreditar que estava realmente lá. Seu braço ainda em volta do meu corpo e a sua respiração de quem dorme na minha nuca provavam isso.

Droga. O meu impulso sempre tem que falar mais alto?

E depois de minutos de relutância, decidi que precisava levantar sem pensar muito, posso digerir tudo isso mais tarde no meu quarto, sem correr riscos de Henri acordar e eu ter que lidar com ele. Eu realmente não sei o que aconteceria se ele acordasse.
Não foi difícil fugir do seu braço forte, o levantei e escapei pela borda da cama. Já de pé, ao lado de sua cama, e lhe olhando dormir, senti a derrota em mim. A derrota de ter perdido para o meu impulso e dormido com Henri. Por mais que não tenha acontecido nada (nada mesmo) entre nós durante essa noite, ainda assim o deixei achar que estou interessado no seu joguinho idiota. Eu estou casando de passar por tudo aquilo no colégio, e ele deveria saber disso.

O encarei por alguns minutos enquanto dormia, inofensivo. De fato está sem camisa e vestido apenas um shorts de esportes, como eu acreditava ter visto na pouca luz que estava. A cena agrada os meus olhos de uma forma que me faz odiar a mim mesmo por ser um perdedor.
Me arrependo de todos os jeitos, mas arrependimento não é suficiente para voltar no tempo.

Em um único momento, lembro de todas as vezes que Seth disse me amar. Eu nunca sequer dormi com ele, e éramos namorados. Eu o amava. E nem superei o luto ainda. Como me tornei tão desprezível?

Dei a meia volta para sair antes da lágrima que há no meu olho cair. Corri enquanto desci os degraus da escada, o quanto mais rápido deixasse aquele lugar, mais tempo teria para digerir tudo isso. Dói por dentro. Não pelo que fiz, mas por com quem fiz.

Finalmente chego a porta de saída. Respiro fundo e alcanço a maçaneta.
Eu poderia não ter pensado tanto antes de levantar, ou talvez, não deveria ter passado tanto tempo encarando-o dormir, sei lá, qualquer coisa séria eficiênciente para evitar que eu encontrasse com o Dr. West.
Dou de cara com o pai de Henri assim que abro a porta, sua expressão muda para surpreso quando me vê. Deveria estar trabalhando, devido ao seu traje e cara de cansado. Assinto, abaixando a cabeça e escapando o quanto antes.

-Kody?

Aproveito que diz em voz baixa e ignoro, seguindo até a casa de Callie. Eu não saberia o que dizer para explicar o motivo de estar aqui, se eu parasse para falar.
Sua cara de surpreso deve significar algo.
Mais um motivo para eu me arrepender, droga. Com que cara eu vou na minha próxima consulta?

A bagunça no jardim de Callie é gritante. Evito pisar nas latas amassadas na grama, chegando até a porta, que não está nem trancada. Imagino a zona que está do lado de dentro, e o que imaginei está certo. Uma bagunça sem fim, de bebidas e comidas espalhadas pelo chão, a uma mancha enorme no sofá. Se fosse na minha casa, minha mãe provavelmente choraria quando visse. Bom, pelo menos não tem ninguém perdido dormindo por aqui.
Reparo com cara de nojo a camisinha aberta no chão, espero com toda fé que não tenha sido usada no sentido literal. Quando avisto a poça de vômito em baixo das escadas minha disposição a ser amigo e ajudar a limpar a bagunça corre para longe. Ainda com medo do que posso encontrar, começo a subir as escadas.

Entre meus passos curtos, encontro ainda mais bagunça no andar de cima. Evito tropeçar num abajur deitado no chão (que obviamente deveria estar em algum quarto). Acho que não perdi nada de interessante dessa festa.
Começo a empurrar a porta do quarto de Callie quando já posso ouvir:

-Não estou com saudades dela.-Dou de cara com Callie, sentada na sua cama, em meio ao que parece ter passado um tornado. Seu cabelo cor de grama neon também é está uma bagunça e veste só uma camiseta grande que não deve ser sua. Parece meio melancólica. Bem, pelo menos não está mais em tempo de algo ser flagrado por mim.

-Saudades? De quem?

-Da minha virgindade.-Sorri. Não devo parecer surpreso, eu já sabia disso.

-Me poupe dos detalhes.-Pego a minha mochila que deixei em um canto e aparentemente está intacta.-Por favor.

-Eu transei com o goleiro do time! Ele é popular e gostoso! Isso é um avanço, não é?

Tento lembrar desde quando Callie se importa com popularidade. Eu sei que ela sempre falou em perder a famigerada virgindade antes de terminar o ano, mas nunca ressaltou que tinha que ser com um atleta do colégio bêbado.

-Serio?-Tento parecer surpreso e razoávelmente interessado. Não quero que pergunte para onde fui quando sumi e apareci de manhã cedo. Assente com um meio sorriso orgulhoso.-Eu nunca iria imaginar.

-E você? Te procuramos a noite toda.

"Dormi com o atacante do time" penso.

Eu temia essa pergunta. Tive alguns minutos para elaborar uma reposta decente, mas não consigo. Callie já está desconfiada, ela sabe que nunca tento parecer interessado em seus assuntos pessoais. Eu tô ferrado.

-Eu?-A pressão do momento me faz começar a caminhar pelo quarto, de um lado para o outro. Como posso justificar um sumisso de horas?-Bem...

Callie espera a minha resposta, atenciosamente. Eu sinceramente preferia ouvir sobre como foi as duas duas horas de amor com o tal do goleiro, gastaria menos da minha saúde mental, mesmo que o dano fosse grande.

-Não me diga que bebeu e acabou apagando em algum lugar...-Ri da situação que criou na sua cabeça.

-Sim! Foi isso!-Coloco a minha mochila nas costas e volto a porta para ir embora. Por hoje, de desculpas, já deu.-Nossa, eu tô com uma ressaca...-Levo a mão até a minha testa, fingindo estar sentindo dor de cabeça.-A gente se vê.

Vou embora, esperando poder digerir toda essa história e tentar esquecer o mais rápido possível. Está sendo um inferno lembrar a cada segundo que dormi com Henri... e que ele me puxava para perto dele.
Nunca imaginei que isso aconteceria, agora não paro de imaginar como aconteceu.