Capítulo 32 - Segredo

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Quando cheguei em casa depois da consulta e de buscar a Lilian no colégio, fui para o meu quarto e liguei o Notebook.

Pesquisei sobre o transtorno de borderline durante horas, e estas passaram tão rápido que nem percebi.
Pelo que li, também é conhecido como transtorno de personalidade limítrofe. Os sintomas incluem instabilidade emocional, sensação de inutilidade, insegurança, impulsividade e relações sociais prejudicadas. A pessoa que sofre de tal transtorno, pode apresentar comportamento agressivo, antissocial, autodestrutivo, compulsivo, impulsividade, irritabilidade, comportamento de risco e até falta de moderação. Quando li que podia causar mudança de humor repentina e raiva, percebi que já tinha um diagnostico. 

O Dr. West me contou a condição do seu filho e me pediu desculpas por qualquer atitude negativa que Henri possa ter tido contra mim. Como se tivesse adivinhado tudo, ele nem faz idéia.

Não entrou em detalhes, só definiu o transtorno como "difícil de lidar" e eu concordo plenamente, mesmo não conhecendo do assunto. O Dr. não me pediu para deixar de falar com Henri, ou para cortar os laços inexistentes, mas foi o que deu a entender. Estava preocupado comigo, imaginando que somos amigos, afinal, eu estava lá na sua casa naquele dia, o que mais poderia pensar?

Foi tudo o que pensei no caminho para casa. Mesmo não tendo muitas expectativas para nós, eu me senti meio abatido. Tinha esperanças de... sei lá, talvez que Henri mudasse um pouco. Será que é isso o que quero mesmo?

Se ele me abordar mais uma vez hoje, não falarei sobre esse assunto. E espero que ele não faça isso. Agora, mais do que nunca, não faço ideia de como lidar com ele. Por mais que seja um pouco difícil, a distância total será melhor para todos nós.

-Então ele é louco?-Me arrependo de ter contado para Callie no momento em que ela exclama sem o menor pudor no meio da sala de aula. É sorte que ele não está nessa aula.-Eu já esperava isso...

-Não! Ele não é.-Tento falar baixo.-É só um transtorno mental.

-E porque o Dr. West decidiu falar sobre o filho para você?-Questiona, meio curiosa e desconfiada. Essa é a famigerada hora que eu desejo matar Callie. Minha atenção sai do seu penteado esquisito com presilhas coloridas e volta a tentar procurar uma resposta mentirosa.

-Primeiro, ele estava me dando um exemplo. Eu perguntei! Perguntei se ele conhecia alguém com esse transtorno.

-Você não deveria perguntar isso para o seu psicólogo?

-Isso não te interessa muito...

Minha resposta cretina não a afeta, só a faz ficar mais curiosa.

-Tá bom. Mas porque você perguntou?

A minha sorte é que a professora pede para fazer silêncio na sala. O olhar curioso e malicioso de Callie continua em mim, eu arrasto o meu olhar dela, indo para a professora na frente da sala, claramente indicando que não podemos mais ficar de conversinha, se não vamos nos ferrar. Callie estreita os seus olhos. Já deve imaginar que estou tentando mentir. Merda! Será que não sou bom nem no que sou melhor?

Respiro fundo, aliviado pelo fato da professora não tão querida ter me dado pelo menos alguns minutos para pensar.

*

As minhas tentativas de fugir de Henri estão indo bem. Não tivemos nenhuma aula juntos hoje, acho que o universo está ao meu favor. Cruzei com ele no corredor algumas vezes, mas não me viu. Estava ocupado de mais no meio dos seus amigos, para a minha sorte.

Nunca estive tão feliz por ser sexta-feira e por estar na hora de ir para casa. Quero fugir o quanto antes para não correr nenhum risco.

Ainda me pego pensando no que aconteceu ontem. A intimidade desnecessária que tivemos só me deixou mais confuso. Toda vez que lembro do seu corpo contra o meu sinto um calor imediato. É ridículo mas não há nada que eu possa fazer. Me arrependo, porém nem tanto quanto nas primeiras vezes em que estivemos juntos dessa forma. E isso sim e perigoso.

Caminho para a liberdade no corredor. Aceitei dar uma carona para Callie, já que o seu Fusca de cor verde abacate está na oficina há mais ou menos dois meses. Foi o único jeito de fazê-la prometer que ia parar de me fazer perguntas idiotas.

-Te contei? O namorado novo da Karen veio buscar ela ontem.-Assinto, com cara de surpreso forçada enquanto ando. Espero que não pergunte aonde eu estava ontem, na hora da saída, após a aula de biologia.-Aliás... porque demorou tanto ontem?

Tento não sair do sério para não gerar mais desconfianças, não que eu deva alguma coisa para ela. Só quero minha paz e privacidade intactas.

-Bem... eu estava...-Interrompo a minha mentira quando sou surpreendido por um puxão na alça da minha mochila, nas costas. Me fez parar de andar, e por sorte não tropecei e caí de bunda no chão. Só tem alguém que seria capaz de fazer isso em um corredor cheio de gente. Viro-me para dar de cara com Henri. Era o que eu mais temia. Decido não questionar de primeira.

-Na moral, eu pensei que isso já tinha caído da moda.-Callie, minha advogada, questiona por mim, também dando a meia volta e posicionando-se ao meu lado, com as mãos na cintura.-O que vem agora? Um soco na cara? Seja mais original.

-Sai daqui.-Henri ordena para alguém que detesta ordens. Porém, sem tirar os olhos de mim.

Callie ri com uma certa ironia, eu até imagino o discurso sobre os anos de opressão contra mulheres que vem em seguida. Ela não perde uma oportunidade.

-Esqueceu que eu posso explodir o seu quarto sem ao menos sair do meu, espertão?

-Eu já estou indo. Pode ir.-Peço para que Callie vá, se Henri tem algo para dizer, por mais hostil que seja, não preciso que ela ouça. Eu também não quero que a trate mal.

Para a minha sorte, minha advogada fiel deixa o lugar sem mais questionamentos. Volto a virar para Henri, mas não o encaro. Não sei se sou capaz. Prefiro olhar para o chão.

-Por que está me evitando?-Não hesita antes de perguntar.

-Eu não estou.-Também não hesito antes de responder.

-Você sabe que não gosto quando mente para mim.-Para a minha surpresa, permanece calmo. Nada de levantar a voz para mim ou algo do tipo. Respiro fundo sem ao menos tentar fingir que não estou cansado dessa conversa que acabou de começar.-E também... que não vou te machucar. Ou pelo menos vou tentar não fazer isso...

Assinto, com um pouco de pressa para escapar dessa situação.

Quando sua mão, agora erguida aproxima-se do meu rosto, meu instinto de quem já apanhou o bastante me faz querer correr, mas não faço isso. Só estremeço um pouco, tentando ser discreto. Não quero que perceba que me sinto intimidado, isso o fará pensar que tem algum poder sobre mim.

Como eu não esperava, sua mão alcança o meu queixo, me forçando a levantar a cabeça e lhe dar a atenção que acha que merece. Eu olho bem nos seus olhos, sem medo. Enquanto isso, o seu polegar desliza pelo meu lábio inferior. Ele não resistiu, sinto que não deveria fazer isso, mas fez.

Só deixo de me sentir, de certa forma, ameaçado, quando ele retira a sua mão. Eu posso sem dúvidas esperar qualquer coisa dele, não tenho receio em admitir para mim mesmo que eu estava com um pouquinho de medo.

-Vá até a minha casa amanhã.-Como sempre cheio de surpresas, deixa escapar mais essa. Já não me encara mais, seu olhar está meio perdido, para a minha sorte a nossa conexão momentânea foi cortada pelo convite sem noção que acaba de fazer.

-O que?-Pergunto, com uma certa indignação.

-O professor de física pediu para estudarmos juntos no final de semana. Não pense que isso é um convite.-Sem mais palavras e olhares que fazem minha alma estremecer, dá meia volta e continua caminhando corredor a dentro. Imagino que tenha treino.
Sua convicção e autoconfiança as vezes me fazem sentir inveja. Nem me consultou e achou que tudo estava resolvido?

Imagino se essas coisas fazem parte do convívio com Henri. Devo estar certo.

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