Capítulo 4 - Surpresa

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Eu ainda sentia o efeito do soco que Henri me deu mesmo dois dias depois do acontecido. Tem um hematoma pequeno no lugar.
Desco as escadas, como sempre preferindo estar na cama e permanecer lá durante todo o dia.

-Bom dia!-Diz a minha mãe, com um entusiasmo que não combina nem um pouco com o meu. Ela só está fazendo o café da manhã porque é sabado, se não já teria saído para o trabalho. Desde que o meu pai morreu, no ano passado, ela tem tentado se ocupar como for possível. Como cada um tem uma forma de superar as decepções, a minha é me isolar como se não tivesse mais obrigações, a da Lilian, minha irmã mais nova, é ficar quieta, mas isso se deve ao fato de que ela não pode falar e nem ouvir. E entrando no assunto, foram vários anos de cuidados e atenções direcionadas para Lilian desde que ela nasceu, e isso significa que nos últimos oito anos eu tenho sido deixado de lado em diversas situações. Não é algo que eu me importe, afinal, eu nunca gostei muito de atenção mesmo.

-Bom...-Abro a geladeira e pego uma lata de refrigerante. Eu sei que isso me proporcionará uns dez anos de vida a menos, mas quem se importa, não é mesmo?

Minha mãe me observa como quem não pode evitar uma tragédia mas gostaria. Ela não questiona... Não mais.
Passo por Lilian no corredor e ela faz os sinais em libra dizendo que tem alguém jogando pedrinhas na janela do meu quarto. Corro até lá imediatamente. Não pode ser Henri querendo me sacanear numa manhã de sabado, e também ele jogaria um meteorito ao invés de pedrinhas. E eu estava certo. Vejo de cima o cabelo verde vibrante e bagunçado de Callie enquanto ela acena para mim. Corro para a porta antes que a minha mãe pense que é algum tipo de delivery de maconha.

-Não está muito cedo pra tocar o terror?-Pergunto, antes mesmo de abrir a porta por completo. Eu admito que tenho um pouco de medo de saber o porquê de ela estar aqui. Se eu tivesse pegando fogo, Callie me avisaria como quem avisa que estou respirando.-Não me diga que foi expulsa de casa.

-Nós vamos para uma festa.-Diz, mudando sua expressão de "nada" para entusiasmada em segundos. O que tá acontecendo com todo mundo hoje?. Cruzo os braços como quem está sendo insultado. Eu detesto festas, e se for de alguém que frequente aquele colégio, detesto dez vezes mais. A minha cara deve dizer tudo.-Vamos lá! O Seth pode ir com a gente, e eu não vou me importar se vocês transarem.

-Ei!

A indiscrição de Callie me faz olhar para trás imediatamente. Se minha mãe ouvisse, iria começar a achar que estou me tornando um tarado no auge da adolescência.

-Kody... me desculpa, eu achei que a única criança dessa casa não podia ouvir.-Diz, rindo de como fiquei vermelho. Volto-me para a frente aliviado quando percebo que não tinha ninguém mesmo na sala atrás de mim.-Combinado?

-Não.-Respondo, um pouco menos rude do que deveria.

-Ótimo. Passo aqui as oito.

*

A insistência da minha única companhia ocasional e não tão desejada é tão grande que estou pronto as oito.

Seth disse que tinha um jantar com os seus pais, e mesmo que ele não tivesse, e estivesse totalmente livre, eu não o convidaria para uma festa com pessoas do meu convívio. Ele voltaria de lá mais perturbado do que eu.
Eu não pedi para sair. Minha mãe vive me pedindo para fazer mais amigos e me divertir mais, acredito que ela gostará de saber quando sair do seu quarto, largar o álbum de fotos e notar a minha ausência em casa.
Aviso para a Lili, eu tive até que aprender como diz "estou saindo e volto mais tarde" em linguagem de sinais e nem tenho certeza de que está certo. Ela não pode me culpar, eu nem uso essas palavras. Lilian larga suas bonecas para me corrigir, eu sabia que estava errado.

-Cala a boca.-Respondo baixo do suficiente para ela não ouvir com o aparelho que possibilita a sua audição em parte. Saio pela porta dando de cara com o carro do pai de Callie com a própria no volante. Pelo que eu sei, ela tem mais multas do que tempo dirigindo.

-Tá esperando o quê? Só vou abrir a porta para você se me pagar.-Diz, pelo que posso ver começou a beber mais cedo do que deveria, está até com o óculos escuro sem nenhum sol.

-Tô com medo de morrer. Deve ser foda.-Respondo, já abrindo a porta do carro, pois sei que os meus medos não significam muita coisa. Não mais.-Pode me dizer pelo menos para onde estamos indo?

Quando Callie acelera, começo a perceber o quão em jogo a minha vida está. Sigo tocendo para sermos os únicos no trânsito e para não haver pessoas por perto, assim só teremos chances de bater em árvores ou em uma casa.

-Mm...Tem certeza de que não te falei?-Questiona, como se não tivesse ignorado todas as mensagens em que eu perguntei sobre isso.-É... eu acho que era para ser surpresa.-Ela ri, e eu tenho medo.-A festa tá rolando na casa do Henri West.

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