Capítulo 25 - Nocivo

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Quando deitei para dormir, eu estava pensando em Henri, e quando acordei também. E é possível que eu tenha sonhado com ele.

Não é como se eu tivesse obcecado ou apaixonado por ele, isso nem me passa pela cabeça. Também não é como se eu quisesse me aproximar dele, ele apenas entrou na minha cabeça e se recusa a sair.
Antes eu nunca tinha me importado de verdade, mas agora, de repente, sinto vontade de descobrir sobre ele, sei lá, pode ser que tenha um motivo bem específico para o seu comportamento desnecessáriamente agressivo. Existe uma história por trás de tudo.

Entro no consultório médico sozinho, minha mãe não conseguiu vir por causa do seu trabalho abusivo que supostamente a ajudou a superar a morte do meu pai. Disse que já sou adulto o suficiente para me consultar sozinho, dei de ombros e fui para o carro. Também terei que deixar a Lili no colégio, ela me espera na recepção.
Eu nunca mais tive taquicardia ou falta de ar em excesso por conta dos meus pulmões fracos, não vejo motivos para minha mãe pagar esse exame de rotina, ela pode ter ficado um pouco paranóica com essa história de perdas de parentes. Porém, qualquer coisa que me faça chegar um pouco mais tarde no colégio está valendo.

A recepcionista me encaminha até a sala, pois nunca estive nesse consultório antes. O doutor que eu costumava ir entregou o diagnóstico errado para uma paciente uma vez, e a paranóia da minha mãe a fez me mudar de lugar. Eu gostaria de mudar de cidade também, mas acho que isso não seria possível.
A porta da sala é aberta pela recepcionista.

-Olá, Kody. Como está se sentindo?-Diz o doutor, sem ao menos levantar de sua poltrona giratória e sair de trás de sua mesa. Não deixo de reparar o luxo no consultório. Pelo visto minha mãe está investindo uma boa grana em mim, acho que eu deveria começar a me sentir mais importante. Sento-me em uma das cadeiras na frente da sua mesa. Meu olhar rápido corre imediatamente até o seu crachá. Doutor Sean West. Espera... Esse sobrenome pertence a alguém que também tem um pai médico e supostamente rico. Rezo para que seja coincidência dando um sorriso falso como resposta a sua pergunta.-A sua mãe me passou todos os seus exames antigos, não precisa se preocupar. É um prazer atendê-lo.

Estende a mão para que eu a aperte enquanto ri tentando ser carismático. Eu sei bem que não é realmente um prazer, ele só quer ganhar dinheiro. Aperto a sua mão com meus movimentos estritamente limitados. Ainda estou com sono.

-Obrigado.

-Não vamos demorar com a consulta, suponho que deveria estar no colégio, certo?-Pergunta, tirando seus óculos pendurado na gola do jaleco para colocar na cara e conseguir ler os papéis na sua mesa. Assinto como resposta. Eu posso até aturar o doutor interesseiro para não ter que chegar no colégio agora.-Imaginei, onde você estuda?

Não entendo porque jogar tanto assunto fora, mas decido responder para prolongar a entrevista.

-BlakeVille.

-Bom colégio. Eu tenho um filho da sua idade que também estuda lá.-Não tira os olhos, que através das lentes chatas e quadradas do óculos lê o que está escrito na minha ficha enquanto continua falando sobre o colégio, é bom que não possa ver a minha cara de surpreso. Só pode ser o Henri, por mais que não tenha nenhuma semelhança física aparente. Mas ainda assim não entendo porque ser tão revoltado, o pai parece ser uma boa pessoa.

Começo a me questionar as razões que pensei antes para Henri ser do jeito que é. Não deve haver nenhuma, sua rebeldia pode ser totalmente sem causa e só para chamar atenção.

*

-O médico novo é o pai do Henri? Quanta coincidência!-Prometi para mim mesmo que não comentaria mais nada com Callie, mas acabei lembrando do que ela me disse no seu quarto naquele dia. Eles são vizinhos há um bom tempo, e ela nem sempre está chapada.-Aposto que vocês o detonaram.

-O que?-Questiono, incrédulo.-Não, nós nem falamos sobre ele. O meu propósito lá era outro. Eu não quero confundir as coisas.

-É... melhor não.

Relaxo no banco do pátio, antes um pouco tenso. Tinha medo de Callie comentar muito alto sobre isso. Não quero nem que passe pela cabeça de Henri que estou falando sobre ele para alguém. Não tem muitas pessoas por perto, então não corro muito risco.

-Eu só não entendo porque ele é... sei lá, tão puto da vida. O Dr. West parece ser tão correto.-Finalmente digo o pensamento que tem martelado a minha mente desde cedo.-Ele não tem motivos para se revoltar.

Callie ri, mas um riso lamentoso.

-O problema é que o Dr. pode ser correto até de mais. Ele não suporta erros, e se o Henri fazia algo de errado, era punido.-Respira fundo para dar um ar dramático para a história.-Lembro bem do Henrizinho tentando esconder os hematomas na quarta série.

Eu não posso comentar. Não estava presente na época e não me lembro de qualquer sinal de agressão nele desde que o conheço. Não tem muito tempo que mudei para esse colégio, e antes de começar a me importunar, eu nem reparava nele, para mim, todos os garotos do time eram iguais. Agora somente um parece ser diferente.

-Pesado...-Tento não parecer interessado no resto da história, mas ainda assim comovido.

-Ele também não saía muito para brincar depois que a mãe os abandonou.-Leva a mão até o queixo para pensar.-Deveria ter motivos.-Ri.

Penso. Sei que agredir as pessoas no colégio para se entreter não tem justificativa, mas acho que finalmente cheguei ao motivo pelo qual o Henri é tão agressivo. E eu nunca ia imaginar que o Dr. West seria capaz disso.

-Exato.-Assinto devagar, perdido nos meus pensamentos.

-Eu mal conseguia dormir com aquelas malditas brigas.-Revira os olhos.-Hoje não é muito diferente... Ele só deve ter parado de apanhar tanto porque tá enorme.

Uma parte minúscula de mim acha que Henri precisaria de ajuda, a outra acha que não tem justificativa alguma para o que ele faz. E a primeira parte é ainda maior. Mesmo com toda a sua agressividade eventualmente voltada para mim, não consigo achar justo tudo o que passou, mesmo se ainda estivesse acontecendo.
Tem alguma coisa de errado comigo, e com ele também, porém de formas diferentes. O meu erro é maior, pois quero determinadamente descobrir um pouco mais que seja sobre ele, a sua intensidade me deixa curioso e atraído.
E estou ciente que isso pode ser nocivo para mim.

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