Capítulo 26 - Escondido

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Para a minha sorte, a aula de educação física foi resumida em apenas alguns exercícios físicos básicos. O treinador desistiu de me convidar para os treinos do final do dia, ainda bem que isso aconteceu. O acontecimento da última vez que estive no vestiário me causou semanas de memórias sufocantes.
Também não vi Henri desde que cheguei, ainda não tivemos nenhuma aula juntos hoje. Não tenho certeza se veio hoje, o colégio é bem grande. Eu queria não me importar com sua presença, ele vai tentar me humilhar uma hora ou outra de qualquer jeito.

Quando chega o pior horário do meu dia, corro para fugir do refeitório. 12:30, Callie desapareceu, eu não vou ficar ouvindo Cami passar todas as informações que cabem na sua mente para mim como se houvesse necessidade, é meio desesperador ficar o tempo todo ouvindo, assentindo e dizendo coisas do tipo "sério? não acredito" mesmo que com desdém.
Eu prefiro ficar sozinho por hoje, e é por isso que fugi de lá. Posso comer alguma coisa mais tarde, não me importo.

Não tenho nada para resolver no meu armário com o desenho de um pênis quase apagado na porta, a essa hora a biblioteca fica um porre e posso dar de cara com a Laurie, também decido não ir ao pátio, o grupo de amigos sem graça e que só comem salada dela podem estar lá também, e eu não sei que reação ter ao encontrá-la estando sozinho.

O banheiro masculino no primeiro andar me parece a opção mais viável, ficarei meio que livre e isolado dos outros. Passo por quase ninguém no corredor do andar de cima, empurro a porta entreaberta tendo em mãos o meu caderno de desenhos e rezando para não ter ninguém do lado de dentro.

Pelo visto não funcionou, acho que Deus não vai muito com a minha cara.
Aliás, tenho certeza quando vejo que é Henri quem está lá.

Está de costas para a porta e com o celular na orelha. A princípio eu correria daqui imediatamente, mas não pretendo mais correr dele.

-Presta atenção! Droga. Você não pode contar para o meu pai que estamos terminando.-Diz, parece um pouco impaciente. Imagino que esteja falando com a tal da Karen. Ela não deu as caras hoje e não imagino o motivo.-Porra, eu não tenho culpa!

Eu não posso mentir, gostaria muito de saber o que está rolando do outro lado da linha. Talvez andar com Callie esteja me tornando um stalker, tô até ouvindo conversas de telefone pelas costas.
Enquanto o silêncio domina, tento controlar a minha respiração para que ele não perceba a minha presença, o que acho meio difícil.

-Não! Não desliga.-Percebo como tenta ser frio. Está claramente inquieto. Henri vira-se de lado, e só então me vê através do espelho.

Ele não pensa antes de tirar o telefone da orelha, mesmo que ainda pudesse estar na linha. Vira para mim parecendo um pouco contrariado, e não é para menos.

-Desculpa... eu acabei de chegar.

-Você não deveria estar aqui.-Diz.-Não deveria estar me seguindo.

-O que?! Eu não estou!-Tento me manter calmo.-Eu não sabia que estava aqui!

Seu olhar fixado em mim me causa uma certa aflição. Eu permaneço parado onde estou, a apenas um passo da porta.

-Sai daqui.-Não fico surpreso quando ele diz. Não identifico a expressão no seu olhar, sei que tá puto, mas não comigo, pois se estivesse, já estaria me insultando, mas também sei que isso é só questão de segundos.

-Eu não vou.-Tento falar um pouco mais alto do que consigo, mas não tenho sucesso nisso. Eu sou péssimo em me impor contra alguém. Mas eu realmente estou disposto a não cumprir a sua regra. Talvez eu esteja disposto a tentar entendê-lo para eventualmente ajudá-lo, e já estou começando a achar que isso é loucura. Preciso dizer mais alguma coisa, porém tenho um pouco de receio.
Henri ri, de uma forma irônica e sem ser espontâneo. É aquilo que geralmente acontece com ele antes de um acesso de raiva. Hoje ele não me odeia, mas pode começar a odiar se eu fizer alguma coisa que ele mesmo julga errado.

-Acho que não ouvi direito...-Começa a se aproximar, eu tenho medo quando isso acontece. Posso esperar qualquer coisa. É impossível ter uma conversa com Henri.-Precisa que eu te faça sair?

-Você não vai fazer isso.-Volto a dizer, sem ter a mínima certeza, pode ser que ele leve a sério e encare como uma provocação. Quando finalmente chega à minha frente, meu olhar se recusa a estar direcionado para ele. Por que isso sempre acontece?

É só estar a menos de um metro dele que o meu olhar parece preferir o chão espontâneamente . O meu plano de me impor foi por água a baixo graças a essa merda de insegurança que tenho perto dele.
Seguro o caderno de desenhos com as duas mãos a minha frente enquanto encaro seus punhos cerrados.

-Por que caralho você faz isso?-Questiona, sem estresse algum. Eu já esperava levar um soco na cara. Penso um pouco, mas acredito que não tenho muito tempo.-Acho que quer testar a minha paciência. Está passando dos limites.

-O... que?-Pergunto, num sussurro completamente confuso. Eu realmente quero saber.

Sigo a sua mão com o meu olhar, a princípio espero o pior, mas felizmente não é o que acontece. A sua mão, com ferimentos devido a aqueles socos que deu para me livrar de uma tragédia alcança o meu queixo, me faz levantar a cabeça, e então volta imediatamente para onde estava.

-Sabe do que estou falando.-Mas é claro, lembro que Henri detesta quando não estou olhando para ele enquanto fala comigo. Acho que isso tem a ver com o seu ego e liderança, possivelmente nunca saberei. Encontro aquele pequeno curativo no seu supercílio que faz as memórias do domingo voltarem todas de uma vez só. Eu queria perguntar o porquê de ele me ajudar, mas não sei se é o momento certo.-Para de tentar me tirar do sério. Não quero que me siga de novo ou que fique testando a minha paciência. Está ouvindo? Eu falei que te mataria uma vez...

Interrompe sua fala, por meio de controle de emoções e dentes cerrados.
Assinto, e droga, esqueço mais uma vez e acabo abaixando a cabeça de novo. Maldito instinto automotivo.

-Tudo bem...-Digo sem nenhuma emoção na voz. Nunca tive nenhuma fé nele, mesmo. Viro-me para sair antes que ele possa me culpar por mais alguma coisa que não faço idéia de que estou sendo culpado.

-Estou avisando pela última vez.

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